Sábado da décima quarta semana do tempo comum. O final de semana chegou trazendo-nos a perspectiva renovada de mais um domingo, Dia do Senhor. Ocasião em que nós cristãos fazemos memória da Ressurreição do Senhor. Deus se renovando na história humana através da ação de cada um de nós. Somos os construtores do sonho de Deus para as nossas vidas. Uma responsabilidade inadiável que temos como missão realizar como parceiros e parceiras do Deus da vida.
A vida está em Deus. A vida é Deus mesmo em nós. Estar neste mundo é ser ciente deste compromisso de lutar para que esta vida aconteça em todas as suas dimensões possíveis e imagináveis. Quando a vida é ameaçada, seja ela de qualquer um dos seres que habitam a Casa Comum, é o Projeto de Deus mesmo que está sendo violado em sua essência. O princípio fundamental de Deus é este: “Eu vim para que todos tenham vida, e vida plenamente”. (Jo 10,10) Como os povos originários, estamos também em busca da “Terra Sem Males”. Uma peregrinação de encontro ao “Bem Viver”.
Rezei nesta manhã distante de casa. Ainda às margens do Araguaia rio abaixo. Estou na cidade de Luciara, onde vim dar a minha pequena contribuição aos alunos da UNEMAT, falando sobre “Etnociência e práticas pedagógicas”. A experiência destes longos anos com os povos indígenas, contribuindo de alguma maneira para o saber destes acadêmicos. Pulei da cama bem cedo e rezei com a passarada, prenunciando o novo dia, na companhia do Sol, que veio descortinando a escuridão da madrugada. Mais uma vez, ele veio trazendo o dia de mãos dadas, como assim concebe os povos indígenas: “o dia só vem até nós porque o sol se encarrega de ir busca-lo”. Ver o dia nascer nesta perspectiva é sentir a natureza emoldurando-se em espetáculo de rara beleza. O coração sensível se abre em festa, enaltecendo o Criador de tudo isso. Deus é maravilha em suas maravilhas!
Deparei-me com o texto assustador que a liturgia deste sábado nos propõe refletir: “Não tenhais medo daqueles que matam o corpo, mas não podem matar a alma!” (MT 10,28). Jesus sendo real e encorajando aos seus para a missão de dar continuidade à ação messiânica libertadora que Ele veio trazer à humanidade. Ele não engana os seus seguidores. Andar com Jesus é estar preparado para viver perigosamente. Se estes permanecerem fiéis à missão, inevitavelmente serão perseguidos, rejeitados e até mortos pelos artífices da morte. Estas serão as consequências para aqueles que fizerem a sua adesão a Jesus. Um pacto pela vida, enfrentando as forças da morte que insistem em prevalecer como força maior.
O discipulado terá o mesmo destino de seu Mestre: sofrer na própria pele as consequências da missão. Tanto que Jesus os encoraja dizendo: “Não tenhais medo deles, pois nada há de encoberto que não seja revelado, e nada há de escondido que não seja conhecido”. (MT 10, 26) Desta forma, o medo jamais poderá ser o distintivo da missão daqueles que abraçam as mesmas causas de Jesus. Nestas horas, vale muito aquilo que nos dizia o nosso bispo Pedro: “o contrário da fé não é a dúvida, mas o medo. E não podemos ter medo do medo”. O medo é inibidor das nossas ações. Uma fé resistente, revolucionária e teimosa nos fazendo em sintonia com as mesmas pegadas de nosso Mestre e Senhor. Esperançando o sonho de Deus, teimosamente sonhando nas veias da história. “A verdade vos libertará”. (Jo 8,32)
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Esta é também a missão da Igreja Povo de Deus em marcha. Uma Igreja, que a exemplo da caminhada de Jesus, é convidada a “sair para fora de si” e ser presença lá onde encontram-se os destinatários do Reino. Uma “Igreja em Saída” como anseia o Papa Francisco, cuja experiência de fé se faça resistente como Povo de Deus que caminha em sintonia com o projeto de amor do Pai. Uma Igreja que não se fecha sobre si mesma ou em grupos de elite, mas que vá de encontro aos que andam perdidos, pessoas sedentas de justiça e da presença do Deus que as libertem. Igreja da subversão do Evangelho que Pedro assim definiu como passos de sua caminhada: “Me chamarão subversivo, / Eu lhes direi: eu o sou! / Para meu Povo em luta, vivo, / Com meu povo em marcha, vou / Tenho fé de guerrilheiro / E amor de revolução”. Fé resistente de um guerrilheiro do Evangelho.
Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.