Maior milagre que pode acontecer a uma pessoa: Cair em si e mudar a própria história

Reflexão Litúrgica: Quinta-feira,
17/04/2022, II Semana da Quaresma

Na Liturgia desta quinta-feira, II Semana da Quaresma, veremos, na 1a Leitura (Jr 17,5-10), que toda pessoa que confia no Senhor é abençoada e, não temendo as adversidades da vida, produz frutos abundantes. Quando Jeremias diz: “Maldito o homem que confia no homem…”, ele está criticando a aliança que Judá (seu país) realizou com as grandes potências, pois os habitantes começaram a se distanciar dos valores espirituais para assumir costumes de uma cultura de morte. Nestas palavras, Jeremias não está dizendo para não termos confiança no próximo, mas está afirmando que o amor ao reino deve ser maior que qualquer outro apego e mediação. Para ele, Só Deus é a fonte segura de felicidade e de vida plena: “Bendito o homem que confia no Senhor, cuja esperança é o Senhor”.

Enfim, quando a pessoa autossuficiente confia em sua própria força e nas riquezas acumuladas, produz injustiça e exploração: a maldição. Ao contrário, a bênção nasce da confiança que segue o projeto do Deus da vida: partilha, justiça e solidariedade.

No Evangelho (Lc 16,19-31), vemos que os bens disponibilizados pela criação de Deus precisam ser partilhados entre todos, para que não haja o abismo que separa ricos e pobres. O Evangelho será sempre a Boa Nova aos pobres e apelo de conversão para os ricos. A parábola de hoje descreve a situação eterna daquele que não pôs em prática o ensinamento da Palavra de Deus. O amor da riqueza tornou-o cego para Deus e para o necessitado. Quem está bem nutrido não se dispõe a ceder suas riquezas nem diante dos maiores sinais, como, por exemplo, a ressurreição de um morto. De fato, Cristo ressuscitou, mas muitos ainda continuam a ser cegos e não se decidem diante dessa realidade.

Questões fundamentais que temos que levar em conta:
– O pobre Lázaro tem nome, é um excluído, ferido no corpo e na dignidade. A pobreza não é querida por Deus, nem por nós. A pobreza não levou Lázaro para o céu, mas a humildade. Ele se salva porque está aberto para Deus e espera Nele a salvação;

– A filiação divina não é suficiente para obter a salvação, mas sim a prática da misericórdia: “Pai Abraão… Filho, lembra-te…”. Deus optou pelos pobres não porque são pobres, mas porque são vítimas das injustiças e têm esperanças num mundo melhor;

– O rico não tem nome, é insensível, Jesus o situa abaixo dos animais: “Vinham os cachorros lamber suas feridas”. O rico estava fisicamente próximo, mas com o coração longe. Não é condenado por ser rico, mas porque é indiferente aos apelos de Deus. Ter bens e ser honesto não é o problema. As riquezas não impedem o rico de entrar para o céu, mas seu egoísmo e a não solidariedade com os necessitados. Em sua riqueza, fechou o coração a Deus e aos pobres. Talvez os bens do rico não eram fruto da corrupção e nem fosse culpado da pobreza diretamente, mas ele viveu para si, distante de Deus, não está contra Deus nem oprime, mas está cego para as carências das pessoas que estão em extrema necessidade;

– Acreditar ou não na vida eterna gera comportamentos diferentes: “se Deus não existe, tudo é permitido”. Ou, então: “Que devo fazer para entrar na vida eterna?”

Como entrar no Reino, na vida eterna?
1º) Assumir a opção de Jesus, gerar a partilha;

2º) Perceber onde há ambição e acúmulo que geram a morte e não pactuar com isso;

3º) Ajudar os pobres e os pobres também se ajudando, de que forma?
– Organizando-se na sociedade e na comunidade;
– Denunciando e não pactuando com as injustiças;
– Rejeitando propostas, leis, pessoas e projetos políticos que privilegiam só alguns;
– Tendo discernimento na hora de escolher projetos políticos, ver se defendem a cidadania, o bem comum, os direitos básicos etc;

4º) Decidir-se já, antes que seja tarde. Ajudar os necessitados é ajudar-se a si mesmo, é salvar-se. Jesus nos alerta que a opção pelos pobres deve ser constante: “Vocês sempre terão pobres com vocês” (Jo 12, 8). Ou, ainda: “Nunca deixará de haver pobres na terra; é por isso que eu lhe dou esta ordem: abra a mão em favor do seu irmão, do seu indigente e do seu pobre na terra onde você mora” (Dt 15,11). Enfim, “é urgente encontrá-los no caminho, como irmãos, do que enfrentá-los como nossos juízes”;

5º) Superar o grande abismo que separa. Quem cavou esse abismo? Quem impossibilitou a comunhão? A resposta de Jesus/Abraão é clara: “Vocês… se não escutam…” O rico não está só, mas esses ricos são tão miseráveis que só possuem dinheiro. Podemos eliminar esse abismo com nossas opções de compaixão. Hoje é nossa oportunidade, usar os meios corretos, pois nem toda riqueza se guarda em cofres. O inferno será consequência das más opções tomadas durante a vida;

6º) Escutar Moisés e os profetas, isto é, a Igreja que tem a mesma opção de Deus e que tem por missão salvar a todos, também os ricos. Faltam-nos avisos? Quem escutamos? Muitos ricos rejeitam os ensinamentos da Igreja e até pensam ser salvos por um milagre: “um morto ressuscitar”, mas Jesus diz que nem um milagre salva um rico egoísta, se ele não abrir o seu coração, a sua mente, desapegando-se de seus preconceitos, de seus privilégios e dos mecanismos de violência e morte: “Os Magos, avisados por Deus em sonho, seguiram por outro caminho e não voltaram a Herodes”.

Boa reflexão e que possamos produzir muitos frutos para o Reino de Deus.


Padre Leomar Antonio Montagna é presbítero da Arquidiocese de Maringá, Paraná. Doutorando em Teologia e mestrado em Filosofia, ambos pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR – Câmpus de Curitiba. Foi professor de Teologia na Faculdade Missioneira do Paraná – FAMIPAR – Cascavel, do Curso de Filosofia da PUCPR – Câmpus Maringá. Atualmente é Pároco da Paróquia Nossa Senhora das Graças em Sarandi PR.