O jeito feminino de cuidar

Segunda feira da Semana Santa. A semana mais importante para a tradição cristã. Nesta semana, fazemos memória do acontecimento pascal da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus, como o ponto alto da experiência de fé. Todavia, somente no ano de 325 d.C, com o Concílio de Niceia, presidido pelo Imperador Constantino e organizado pelo Papa Silvestre I, que se consolidou a doutrina da Igreja Católica, ficando ali decidido que a Semana Santa seria comemorada por uma semana, do domingo de ramos ao domingo de Páscoa. Assim, cronologicamente, estamos a seis dias antes da Páscoa, como o próprio evangelho de hoje nos situa.

Antes, porem, de adentrar a Semana Santa propriamente dita, quero falar da semana que ora inicio. Sinto-me com o coração em festa e a alma lavada. Tudo porque, com a ajuda de alguns amigos e amigas, adquirimos um notebook, que foi entregue neste sábado ao menino de outro Marcos Junior. Este jovem foi classificado na seletiva para o curso de Ciências Contábeis da Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT e estava impossibilitado de fazer o curso, dado que não possuía a ferramenta principal para acompanhar as aulas on-line, já que o curso é no formato EAD. Ver os olhos daquele menino brilhando, diante da surpresa de ganhar o seu presente, não tem preço. A solidariedade ensina para nós que: “Um mais um é sempre mais que dois”. Gratidão a todos e todas que fizeram parte deste mutirão solidário!

Mas voltando à Semana Santa, estamos dando o segundo passo para dentro dela. Depois de ser recebido e aclamado pela “ralé” em Jerusalém, Jesus vai à casa de seus amigos pobres em Betânia, uma pequena cidade localizada no Monte das Oliveiras, onde morava Lázaro, Maria e Marta. Jesus que se senta a mesa com os “desclassificados” daquela sociedade, gerando contenda com a classe dirigente dominante judaica: “Os fariseus e os doutores da Lei criticavam a Jesus, dizendo: Esse homem acolhe pecadores, e come com eles!” (Lc 15,2). Sentar-se a mesa é sinal de intimidade para aquela sociedade. É misturar-se em forma de cumplicidade. Jesus que não se deixa contaminar pelo veneno de seus opositores e segue o seu caminho, andando com gente de fama duvidosa.

Uma família de amigos de Jesus. Lázaro, que Ele havia ressuscitado dos mortos (Jo 12,1), Maria e Marta. Depois daquele sinal de vida realizado por Jesus, ressuscitando o amigo Lázaro, o pobre homem não podia mais andar livremente, pois as autoridades da morte queriam também dar um fim a sua vida: “Os sumos sacerdotes decidiram matar também Lázaro, porque por causa dele, muitos deixavam os judeus e acreditavam em Jesus”. (Jo 12,10-11) Quem é pela vida, luta pela vida, defende a vida. Quem é da morte vive nas sombras, tramando a sorte do justo, como está descrito no Livro de Provérbios: “Não tenha inveja dos maus, nem deseje viver com eles, porque o coração deles trama violência, e seus lábios só falam maldades”. (Pr 24,1-2)

Jesus que é acolhido com carinho na casa de duas de suas amigas especiais. Mulheres que trazem em si o dom do cuidado. Sabem cuidar com carinho de Jesus. As mulheres são assim, sabem cuidar como ninguém. Nelas, a arte do cuidado se faz poesia concreta de quem abre pedagogicamente o coração. Cuidar como elas somente Deus mesmo. A cena de Maria lavando os pés do amigo e Mestre com um perfume muito caro é paradigmática, expressando toda uma simbologia: “Maria, tomando quase meio litro de perfume de nardo puro e muito caro, ungiu os pés de Jesus e enxugou-os com seus cabelos. A casa inteira ficou cheia do perfume do bálsamo”. (Jo 12,3) Quem ama, cuida! Quem cuida, ama! Quem ama e cuida será cuidado. A pedagoga do cuidado feminino é diferente, sem igual. A vida sendo cuidada por quem valoriza a vida.

A casa de quem ama se enche de amor. A casa de quem se abre ao amor transborda de vida. A vida estava ali com aquelas pessoas. Jesus cheio de vida sendo prenúncio daquilo que enfrentaria dali por diante. A vida em pessoa, passando pela experiência dolorosa da morte. Alguns dias depois, aquela cena se repetiria: “Deixa-a; ela fez isto em vista do dia da minha sepultura. (Jo 12, 7) Toda a simbologia do gesto de Maria, na verdade, prepara o corpo de Jesus para a morte, isto é, o ato final com que Ele entregará sua vida em favor das pessoas. Em Jesus o amor e a fidelidade ao projeto de Deus caminham juntos. Naquele contexto histórico, as pessoas mais próximas de Jesus abrem os seus corações para acolhê-lo. Diferentemente de alguns outros que ainda não passaram pelo processo de conversão e permanecem fechados à possibilidade da vida. Com Jesus, a comunidade que vive o espírito d’Ele será eminentemente uma comunidade de pobres e sempre aberta fraternalmente para os pobres. Deus Pai, autor da vida, testemunhou seu amor, entregando seu Filho único para que as pessoas tenham a vida e a tenham abundantemente (Jo 10,10).


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.