Pedro, Paulo e a Sinodalidade

Quarta feira da décima terceira semana do tempo comum. O mês de junho chega ao seu final, nos dando a oportunidade de celebrar a Festa de São Pedro e São Paulo. Dois grandes pilares primordiais da História da Igreja. Celebrando hoje este grande festejo na Basílica Vaticana, o Papa Francisco tratou de associar estes dois ícones à Sinodalidade observando: “O Sínodo, que estamos a celebrar, chama-nos a ser uma Igreja que se ergue em pé, não dobrada sobre si mesma, capaz de olhar mais além, de sair das suas prisões para ir ao encontro do mundo.” Igreja em Saída, se colocando no meio dos que mais necessitam da presença dela na sociedade.

Pedro, Paulo e a Sinodalidade. Este é o desafio maior de ser Igreja nos tempos atuais. Igreja chamada ao compromisso de fazer história lado a lado com o “pequeno resto de Israel” (Is 10,20). Se nos primórdios do Cristianismo estes dois personagens marcaram a história nascente da Igreja, também tivemos entre nós na contemporaneidade a presença ilustre deles. Pedro, encarnado em meio aos povos empobrecidos da Amazônia Legal. Paulo inserido no contexto de um grande centro urbano, dando as coordenadas de uma complexa arquidiocese. Pedro, sendo a voz e a vez de peões, posseiros, prostitutas, ribeirinhos, indígenas. Paulo, comandando uma Igreja multifacetada pelas imensas Regiões episcopais, com cada um de seus epíscopos somando juntos na caminhada de Igreja.

Comecei a minha jornada sacerdotal com Paulo. Ainda padre jovem, dei os primeiros passos na Zona Leste de São Paulo, mais precisamente na Cidade Tiradentes, sob o comando das mãos e coração generosos de Dom Angélico Sândalo Bernardino. Éramos todos submetidos ao comando geral de Paulo, também chamado de Cardeal Arns até que, por uma imperícia do Vaticano, o Papa João Paulo II, tratou de fracionar a Arquidiocese de São Paulo em várias dioceses individualizadas. Segundo os mais críticos da época, para enfraquecer a luta de Dom Paulo Evaristo Arns, prestando assim um prestimoso serviço aos seus algozes opositores.

Das mãos de Paulo vim parar nas mãos de Pedro. Sonho ainda sonhado nos bons tempos dos estudos de teologia. Da periferia para a floresta. Do vai e vem frenético dos veículos para a calmaria do Araguaia. Das tribos e legiões urbanas, para as etnias indígenas. Do anonimato da cidade grande para o olhar fixo olho no olho dos povos originários. Da cultura transitória, para os saberes ancestrais milenares. Ainda hoje carrego em mim o que aprendi com Paulo e Pedro, grandes instrumentos de Deus: a luta intransigente contra a ditadura militar e a defesa dos direitos humanos; a teimosia, a resistência e a mística martirial das causas maiores, sobretudo a luta indígena, fazendo dela a minha causa maior.

Aproveitando do festejo do dia, rezei a liturgia de hoje na companhia de Pedro. Fiz-me presente no “campo santo”, como se diz por aqui. Se Jesus hoje fez questão de estar em meio a uma comunidade pagã de Gadara, eu me senti energizado com a força que brota do túmulo de Pedro, embaixo daquele pequizeiro florido. Uma liturgia que nos leva a refletir com o jeito próprio de Jesus realizar a sua missão. Para Ele, não existe fronteiras limítrofes. Mesmo em território pagão, Ele não deixa de realizar a sua ação libertadora, mostrando aos seus que não se serve a duas realidades distintas e opostas. Estar do lado de Jesus é estar do lado da vida e não da morte. Mesmo sendo Jesus o Projeto da Vida em Deus, há aqueles que o rejeitam e o “pedem que se retire da região”. (Mt 8,34) Lá como cá, a atitude dos que pedem que Jesus vá embora é a mesma de uma terrível sociedade que valoriza mais a posse das armas e o acúmulo de bens do que a libertação dos explorados e marginalizados. Em primeiro lugar, Deus quer que as pessoas vivam. A sociedade que põe qualquer coisa acima da vida humana é sociedade que rejeita radicalmente Jesus.

Pedro e Paulo, apóstolos da Sinodalidade. Homens identificados com a Igreja de Jesus de Nazaré. Fizeram a experiência mais profunda do seguimento fiel do Ressuscitado. Comprometeram-se com a vida e as causas dos pequenos. Amigos de longa data na caminhada de uma Igreja irmã e Sinodal latino americana, pobre com os pobres, e para os pobres. Igreja que não se escondia por detrás dos altos muros do clericalismo e do sacramentalismo doentio, mas se fazia presente nas lutas dos pequenos sendo Igreja em Saída como pensa o Papa Francisco na sua exortação apostólica “Evangelii Gaudium”, “a alegria do evangelho” (EG). Viva Pedro e Viva Paulo, profetas de nossa caminhada Sinodal! Pedro e Paulo, profetas das grandes causas. “Se não houver grandes causas, a vida não tem sentido”. (Pedro Casaldáliga)


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.