Tempo, tempo, tempo!

Quinta feira da trigésima terceira semana do Tempo Comum. Aproxima o penúltimo final de semana deste mês de novembro. Já estamos quase lá, caminhando para a conclusão de mais um ano em nossa caminhada histórica. Os desafios vão acontecendo na ordem do dia. Fugir a eles, impossível! O jeito é enfrentá-los de cabeça erguida, como cantávamos na canção de Walter Franco: “Tudo é uma questão de manter a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo”. Sem pressa de querer antecipar o ocaso, respeitando o tempo de Deus, o Kairós. O tempo e o amor como essências intrínsecas do nosso existir
Tempo, tempo, tempo! O tempo não é uma instituição hermética, estática e permanente, como alguns de nós possamos até imaginar. Nunca nos esqueçamos de que estamos entre a concepção de tempo como “Cronos” e “Kairós”. Se de um lado, o chonos trata sob a perspectiva quantitativa, expressando a ideia linear do tempo, com períodos, espaços ou intervalos que tem certa duração e que podem ser medidos, contados e estudados, o Kairós quer significar o “tempo determinado”, “tempo oportuno” ou “momento certo”, “tempo das oportunidades”. Uma palavra grega muito usada na Bíblia no Novo Testamento para se referir a um tempo definido ou momento específico da manifestação de Deus em nós e na nossa história.
O Kairós é sempre o tempo do amor. Foi assim no Velho Testamento e é assim com a chegada de Jesus entre nós: Deus se revelando plenamente na pessoa de seu Filho. “Eu e o Pai somos um”. (Jo 10,30) O Verbo de Deus se fazendo amorosidade em nossa realidade histórica. Amorosidade ternura e compaixão de um Deus que pensa o tempo todo em sua Criatura e a quer feliz. Não há outra compreensão possível de Deus fora da realidade do amor. Por esta razão, o tempo de agora é o tempo do amor. Momento de sair de cena o ódio incrustado nas entranhas de alguns dos nossos, para dar lugar ao tempo oportuno do amor que se traduz em gestos de acolhida, cuidado, solidariedade, fraternidade e muita misericórdia para com todos os sofredores necessitados.
Nosso ideal de conduta é a pessoa de Jesus de Nazaré. Nosso modelo de seguimento é o Galileu, que a liturgia desta quarta feira nos coloca no contexto em que Ele está chegando a Jerusalém. Seu Caminho está perto do grande desafio a que se submeteu. O contexto vital (Sitz im Leben – expressão alemã utilizada na exegese de textos bíblicos) é a Galileia do século primeiro, sob domínio do Império Romano. Uma cidade contraditória, pois ao mesmo tempo em que era considerada a “Cidade Santa”, era lá que também se concentrava a dominação, a exploração e a marginalização dos pobres, excluídos da participação sócio, política, econômica e religiosa. O profetismo inexistia naquele contexto. A religião como instrumento de dominação.
Diante deste contexto, o Mestre se manifesta através de seu choro: “quando Jesus se aproximou de Jerusalém e viu a cidade, começou a chorar”. (Lc 19,41) Sensibilidade a toda prova. Ele também chorava diante da injustiça. Jamais poderia ser alguém insensível diante da barbárie humana. A sua manifestação demonstra o quanto Ele estava antenado com a realidade dos pobres, não somente se colocando ao lado deles, mas sendo um com eles. Misericórdia – Sentia a realidade com o coração. Esta atitude de Jesus nos instiga a perceber o quanto estamos distantes deste mesmo sentimento de Jesus na nossa experiência de fé nos dias atuais. Nossa fé não se sensibiliza com a dor do outro.
Jerusalém e o “Templo Sagrado” como sinais de contradição e não como espaço de acolhida e da presença de Deus. Não foi à toa que tudo foi destruído, cumprindo assim a profecia de Jesus: “não deixarão em ti pedra sobre pedra”. (Lc 19,44) A cidade que não soube acolher o Verbo de Deus em si. A Cidade Santa que não sabe qual é o caminho da verdadeira paz. Os olhos dela estão tapados: ela se tornou o centro da exploração e opressão do povo, enveredando por um caminho que é o avesso do caminho da paz. Ela será destruída, porque não quer reconhecer na visita de Jesus a ocasião (Kairós) para mudar as próprias estruturas injustas, abrindo-se ao apelo de Jesus.

“Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te foram enviados! Quantas vezes Eu quis reunir os teus filhos como a galinha reúne os seus pintinhos debaixo das suas asas, mas vós não o aceitastes!” (Lc 13,34) O “Cronos” de Jerusalém não acolheu o “Kairós” de Deus. Fim da caminhada pública de Jesus e início da vida nova da era do “Kairós de Deus”. Jerusalém resolveu personificar o sistema que se fechou em si mesmo, e recusou a grande novidade trazida por Jesus. Por isso, seu destino já está traçado: em Jerusalém Jesus será morto, e sua morte trará o julgamento definitivo sobre ela. Abramo-nos ao Kairós de Deus e nos deixemos invadir pela essência do amor que transforma todas as coisas e relações. Que nos deixemos inspirar por São Francisco de Assis que dizia: “Onde há amor e sabedoria, não existe temor nem ignorância”.

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.