Incredulidade e oração

Segunda feira da Sétima Semana do Tempo Comum. A semana começando, nos levando ao final de mais um mês. A festa mais popular da cultura brasileira acontece lá fora em plena alegria dos que são adeptos da folia. De fora seguem os julgamentos daqueles que se “armam de um moralismo doentio”, na condenação daqueles e daquelas que se deixam levar pela alegria da festa. Ambiente que nos faz lembrar uma das falas de Dom Hélder Câmara: “Carnaval é a alegria popular. Direi mesmo, uma das raras alegrias que ainda sobram para a minha gente querida. Peca-se muito no carnaval? Não sei o que pesa mais diante de Deus: se excessos, aqui e ali, cometidos por foliões, ou farisaísmo e falta de caridade por parte de quem se julga melhor e mais santo por não brincar o carnaval”.

Meus 6.5 de janeiros e de estrada não me faz ser um folião ou apreciador das noites in loco desta festa. Nem por isso deixo de acompanhar os desfiles das Escolas de Samba com toda a sua criatividade, beleza e esplendor. Cada vez mais elas nos encantam com as suas expressividades culturais, mostrando assim a riqueza de nosso povo. Momentos específicos para extravasar de tanto trabalho que vive a nossa classe trabalhadora produzindo a riqueza. Como diria o filósofo e economista alemão Karl Marx (1818-1883): “Os ricos não produzem a riqueza, mas apropriam-se dela. Quem produz a riqueza é a classe trabalhadora”.

Rezei nesta manhã a caminho do Araguaia, refletindo sobre esta nossa festa tão querida do povo brasileiro. Estou na metade do caminho, agora na divisa de Mato Grosso com Goiás. A beira do Araguaia, mas não o mesmo em beleza que temos próximos de nós lá embaixo. Rezei repercutindo em mim as palavras do Papa Francisco ditas ao receber em audiência neste sábado (18/02) os participantes do Congresso dos presidentes e referentes das Comissões para o Laicato das Conferências Episcopais. O Pontífice foi direto ao assunto ao dizer: “os leigos não são ‘hóspedes’ em sua própria casa. O clericalismo é uma praga na Igreja. Chegou a hora de pastores e leigos caminharem juntos em cada âmbito da vida da Igreja, em todas as partes do mundo”.

Francisco sendo Francisco com a sua abertura e sinceridade absolutas. Numa Igreja que está cada vez mais perdendo o caminho que leva à mesma estrada percorrida por Jesus. Padres e bispos cada vez mais clericais, preocupados com as suas aparências de egos inflados, vultosas vestimentas e adereços, que com a prédica e prática de Jesus de Nazaré. Quando os membros da Igreja escolhem o caminho do clericalismo, os leigos, quase sempre vão atrás, sendo mais clericais que as suas próprias lideranças religiosas. Tem razão o Papa de ver nesta situação uma “praga” a ser combatida. Em tempos de “Sinodalidade”, o caminhar juntos na mesma direção se faz cada dia mais necessário, se quisermos ser fieis ao Projeto do Reino trazido por Jesus.

Projeto este que continua presente na história humana, como vemos hoje através do texto que a liturgia nos propõe refletir. A cena descrita pelo Evangelho de Marcos nos remete ao contexto logo após a “Transfiguração de Jesus”. Enquanto Pedro Tiago e João querem que Jesus faça três tendas para eles continuarem ali no “bem bom”, os demais discípulos estão em meio a multidão, discutindo com os mestres da Lei, tentando sem sucesso, libertar uma criança de um mal que a acometia. Diante da ineficácia dos discípulos, o pai da criança, desesperado, pede a intervenção de Jesus.

A incredulidade é a porta de entrada para uma fé medíocre e sem eficácia: “Ó geração incrédula! Até quando estarei convosco? Até quando terei de suportar-vos?” (Mc 9,19). O poder da oração está na fé de quem a professa: “tudo é possível para quem tem fé”. (Mc 9,23) Entretanto, não basta ter fé. Qualquer um de nós pode ter esta fé. É preciso revestir-nos da força que está presente no poder da oração. O ato de rezar com fé inabalável exprime a união íntima com Deus e com o seu plano, porque Deus pode libertar as pessoas, vencendo todas as formas de manifestação do mal. Não se trata de uma magia, mas é o poder de Deus que se faz presente no coração daquele e daquela que se abrem à intimidade com Deus, deixando ser tocados pelo seu jeito de nos amar infinitamente. Como o evangelista Mateus assim o manifestou através de uma das falas do Mestre Jesus: “tudo o que vocês na oração pedirem com fé, vocês receberão”. (Mt 21,22) A oração é a expressão de um coração suplicante e amoroso em sintonia com o Infinito de Deus.

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.