Julgar, incriminar, apedrejar, atacar ou praticar a misericórdia?

Reflexão litúrgica: segunda-feira, 27/03/2023 – 5ª Semana da Quaresma

 

 Na Liturgia desta segunda-feira, V Semana da Quaresma, vemos, na 1a Leitura (Dn 13,41c-62), que Susana, tentada primeiro pelos velhos, ou seja, por dois dos chefes dos exilados, eleitos como juízes, é privada de todo apoio humano, é condenada à morte exatamente por intervenção deles. Apesar da obra perversa daqueles que deveriam amparar a virtude, ela permanece fiel a seu Deus. Há no relato uma amarga condenação dos chefes que levam à ruína seus súditos indefesos, condenação que ocasiona palavras muito duras dos profetas. Mas há uma profundíssima confiança no Deus fiel, que nunca abandona a quem nele põe a própria esperança.

 O Evangelho desta liturgia (Jo 8, 1-11), e todos os ensinamentos de Jesus, nos interrogam, principalmente neste tempo quaresmal, sobre o que a conversão exige de nós?  “Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso… não julgueis para não serdes julgados… não condeneis e não sereis condenados… se não perdoardes aos homens, o vosso Pai, também, não perdoará os vossos delitos” (Mt 6 e 7). A vivência da misericórdia é própria de uma conversão autêntica.

Farisaísmo é a doença de quem não se olha no espelho. Ao invés de questionarem a própria conduta, ficavam olhando, reparando o cisco no olho alheio. Os fariseus apresentam a Jesus uma mulher pecadora e certamente pobre, sem prestígio social. Mas eles mesmos eram coniventes com a pecadora Herodíades, rica e da corte que adulterava com Herodes (Herodíades era mulher do irmão de Herodes). Diferente destes grupos religiosos, João Batista não é conivente e é admirado por Jesus. Os fariseus também eram coniventes com a sociedade machista, não denunciam o homem em pecado, legitimavam uma teologia e uma ética parcial.

Sobre a mulher pecadora recai a responsabilidade pessoal, mas também de quem a explora e que, muitas vezes, para se livrar da culpa, procuram um bode expiatório. Escondem o espelho para não ver mais o rosto, e assim pensam estar limpos. “Ultimamente as pedras estão voando de todos os lados contra mulheres, contra pessoas, contra grupos diversos. Os moralistas de plantão – os empedernidos (petrificados) e arrogantes de hoje – continuam com as pedras nas mãos, prontos para massacrar os outros diante de qualquer deslize. Muitos atiram pedras na tentativa de encobrir as próprias falhas e interesses. Há muitos que carregam pedras nas mãos por serem claramente contra a ascensão dos pobres e não conseguirem conviver com eles. Enquanto continuarmos condenando esta ou aquela pessoa, este ou aquele grupo, e não olharmos dentro de nós com sinceridade, a violência, o sofrimento e a intolerância não vão ter fim” (Pe. Nilo Luza, ssp).

Os fariseus armam ciladas: aprova-se o homicídio ou desobedece-se a lei de Moisés? Qual a saída? Saída a partir de uma profunda experiência com Deus.

“Não quero a morte do pecador, mas sim que se converta e viva”;

“Não vim para condenar, mas para salvar o mundo”.

A saída de Jesus desaprova e desaponta os orgulhosos de coração, pois estes não vivem a misericórdia e a compaixão. Misericórdia e compaixão são ações divinas com o sofrimento e as humilhações humanas, próprias de quem tem uma profunda experiência de Deus.

Um gesto de amor marca para sempre uma pessoa desamparada. O amor cura, a pessoa muda de vida, se transforma. O amor vale mais do que todos os critérios da moral ou da lei. Diante da nossa fragilidade, Deus não vem a nós com cobranças, mas com amor, mesmo que não mereçamos. Eis a nossa alegria!

Antes de ‘apedrejar’ apresentemos a Jesus a situação concreta. Vejamos o que Ele nos pede. Que atitude exige de nós? Será que Ele nos dirá que podemos ser juízes ou que muitas vezes somos os réus?

O mal é uma denúncia contra nós: não fomos tão bons, sal, luz, fermento etc. A mulher pecadora é cada um de nós. Somos todos fracos e pecadores (Igreja santa e pecadora). Jesus é aquele que, das trevas, faz surgir o universo de luz, de fé, de compromisso: tanto à pecadora como aos fariseus. Como aquela mulher se sentiu ao ouvir as palavras misericordiosas de Jesus? Nós, cristãos, apontamos para as pessoas as coisas boas ou nos apegamos aos seus erros?

Boa reflexão e que possamos produzir muitos frutos para o Reino de Deus.


Padre Leomar Antonio Montagna é presbítero da Arquidiocese de Maringá, Paraná. Doutorando em Teologia e mestrado em Filosofia, ambos pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR – Câmpus de Curitiba. Foi professor de Teologia na Faculdade Missioneira do Paraná – FAMIPAR – Cascavel, do Curso de Filosofia da PUCPR – Câmpus Maringá. Atualmente é Pároco da Paróquia Nossa Senhora das Graças em Sarandi PR.