O humano e o divino

Sábado da Festa de São José. Sim, festa antecipada, já que a liturgia, neste tempo quaresmal, quer dar ênfase aos seis Domingos que compõem a Quaresma, sendo que a partir da Quinta Feira Santa iniciamos o período que denominamos “Tríduo Pascal”, que envolve a Sexta Feria Santa, o Sábado da Aleluia e o Domingo da Ressurreição/Páscoa. Assim, a Igreja antecipa em um dia a Festa de São José, que é considerado o protetor da Igreja Católica e, por causa de seu trabalho de artesão, é também o protetor dos trabalhadores. O homem da Sagrada Família de Nazaré: Jesus Maria e José.

Família que é o modelo para as nossas famílias e serve-nos como inspiração de como construir o seio familiar com valores cristãos. A semana está terminando e dentro dela tivemos um exemplo de modelo a não ser seguido por quem preza os valores da Família de Nazaré. No mês que dedicamos em especial às mulheres, na quinta feira (16), um dos programas televisivos, expulsou dois de seus integrantes, acusados de assediarem sexualmente uma das mulheres. Não vou dizer os nomes destes infelizes, até porque os nomes deles já dizem à que vieram neste mundo. Se bem que eles estavam no lugar certo, já que o referido “programa”, presta um desserviço à sociedade brasileira, com a divulgação e consequente disseminação de “contra valores” (éticos, morais, humanos…) que, de cristão nada possuem.

O Brasil é tido como um dos maiores países cristãos do planeta. Possui aproximadamente 175 milhões de pessoas “seguidoras de Jesus”, atrás apenas dos Estados Unidos, 246 milhões, e à frente do México, terceiro colocado, com 107 milhões. Todavia, isto não quer dizer muita coisa, sobretudo porque, aqueles e aquelas que dizem seguir o Mestre Galileu, fazem acontecer e se permitem conviverem passivamente com coisas absurdas que aqui diuturnamente acontecem. Como exemplo disto, cito apenas um dado que é assustador. O Brasil possui 3% da população mundial. No entanto, na pandemia, negligentemente, deixou morrer o que corresponde a 11% das mortes em todo o mundo. De saber que de cada 5 mortos pela COVID-19, um deles poderia e deveria ter sido salvo.

Que São José dos perdoe por tamanha e incoerente contradição! O modelo de família para nós cristãos é a Família pobre de Nazaré, que a liturgia de hoje nos convida a refletir. O Lecionário Litúrgico nos propõe duas leituras de evangelistas distintos: (Mt 1,16.18-21.24a) e (Lc 2,41-51a). O primeiro, da comunidade de Mateus, nos fala da genealogia de Jesus, apontando-o como descendente direto da linhagem de Davi e Abraão. Jesus que é um ser de origem divina, mas que se encarna no humano de nossa existência, através da participação dos humanos José e Maria. Já o segundo texto em Lucas, a missão de Jesus decorre da relação divina e filial com o Pai, como mistério de Deus no cumprimento de suas promessas, através da encarnação de Jesus em nossa realidade histórica humana: “O Verbo se fez carne e habitou entre nós”. (Jo 1,14)

José e Maria instrumentos de Deus na construção da família humana na perspectiva do Reino. O humano fazendo parte da História da Salvação da humanidade. Apesar de divino, o humano Jesus não nasceu sabendo tudo. Na oficina de José, e no exemplo de dedicação dos pais humanos, Ele vai se descobrindo e revelando Deus. O mistério da encarnação vai se delineando e Jesus vai aprendendo a viver a vida humana como qualquer outra pessoa. O divino pleno de Deus vindo até a nossa humanidade na pessoa do Filho e nos levando a fazer parte do divino que é Deus. Também nós não nascemos sabendo tudo. Vamos aprendendo na medida da caminhada que fazemos, seguindo o exemplo da Família de Nazaré.

De modo geral o Evangelho nos mostra que Jesus não é apenas filho da história dos homens. Ele é o próprio Filho de Deus, o Deus que está conosco. “Eu e o Pai somos um”. (Jo 10,30) É Deus mesmo que vem morar no meio de nós. Jesus que define a sua condição de Messias, apresentando-se como o Filho de Deus. Todavia, as provas de seu messianismo entre nós não são teorias jurídicas abstratas. Através das suas ações concretas, Ele comprova que é Deus mesmo quem nele age. Esta condição de Jesus encarnado em nossa realidade no seio da família de Nazaré, me fez lembrar o primeiro Objeto Geral que nosso bispo Pedro consignou para a Prelazia de São Félix do Araguaia:  “viver e anunciar a Boa Nova do Evangelho com alegria, jeito humilde e paixão, para acolher o Reino de Deus e contribuir em sua construção já aqui na Terra, na esperança do Reino Definitivo”. Como também ele assim expressou em uma de suas canções, em parceria com o Frei Domingos dos Santos, O.P.: “Somos um povo de gente, Somos o povo de Deus. Queremos terra na terra, Já temos terra nos céus”. E viva São José!

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.