Terça feira da Quinta Semana da Quaresma. Já estamos às portas da Semana Santa que aponta no horizonte de nossa existência. O tempo urge buscar a nossa conversão. Mudar de comportamento, de atitude, mas principalmente uma mudança profunda de nossa natureza humana. Um processo que se inicia e não tem hora para acabar. Cada dia é um passo dado no sentido de irmos ao encontro da verdade absoluta de Deus. No processo de conversão que vamos desenvolvendo, fazemos com que o nosso caminhar se identifique com o d’Ele, que assim se afirma: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. (Jo 14,6) Jesus é o verdadeiro caminho para a vida. Através da encarnação, Deus, doador da vida, se manifesta inteiramente na pessoa e ação d’Ele.
Precisamos urgentemente mudar a rota das nossas vidas. Mudar para viver na intensidade com que Deus nos criou. Um Deus de amorosidade, ternura e compaixão, sempre presente na cainhada de seu povo. Um Deus que jamais abandona os seus. Na sua profunda amorosidade nos cria para a vida plena. A essência humana é amor, pois foi assim que Ele nos criou. Por mais que a nossa mente e coração tenham desviado da rota, nas nossas entranhas, trazemos o DNA do amor de Deus. O Ser pleno de Deus está gravado na nossa essência humana, lá onde somente Ele pode habitar. Somos a essência do maior de Deus e, como diria a ativista social norte-americana Helen Keller (1880-1968) “Tudo o que amamos profundamente converte-se em parte de nós mesmos”.
Mudar o nosso jeito de ser neste mundo para que tenhamos a vida plena. Estamos vivendo dias atípicos aqui na região amazônica. O fenômeno “La Niña” nos atingindo em cheio. Lembrando que este fenômeno climático-oceânico é caracterizado pelo resfriamento anormal das águas do oceano Pacífico, provocando alterações sazonais na circulação geral da atmosfera. Em consequência disto, estamos tendo chuvas acima da média, principalmente na área norte do país. Confesso que não tinha visto ainda por aqui um mês de março tão chuvoso como de agora.
“A terra nos foi confiada para que seja uma mãe para nós, mãe terra, capaz de dar a todos o que é necessário para viver”, disse o Papa Francisco em uma de suas falas no dia 10 de fevereiro passado. Estamos colhendo os frutos de nossa irresponsabilidade diante da mãe. Estamos maltratando a nossa mãe terra e, em consequência disto, estamos pagando um alto preço por isso. Ou mudamos o nosso jeito de ser neste mundo, ou os dias futuros estarão seriamente comprometidos. Não há mais como viver com estas nossas atitudes consumistas, preservando a “cultura do descartável”. Como dizem os indígenas, “O que acontecer à mãe terra, acontecerá aos filhos da terra”.
Somos filhos desta terra. Nossa origem vem húmus do qual Deus nos criou. “Eu Sou”, fez quem “nós somos”. Eu sou porque Deus assim me fez. Jesus que é o Deus Vivo presente no meio de nós. Como Ele revela a si mesmo diante dos incrédulos fariseus – “Eu Sou”, que a liturgia desta terça feira nos faz conhecer. Um Deus que sempre foi, como os israelitas experimentaram no passado histórico de libertação: “Deus disse a Moisés: ‘Eu sou aquele que sou’. ‘Você falará assim aos filhos de Israel: ‘Eu Sou me enviou até vocês’” (Ex 3,14) Deus se apresentando como aquele que está presente. O mesmo Deus do passado, se fazendo presente em Jesus, manifestando a sua identidade dentro de um processo de libertação.
Para o evangelista São João, Jesus é o enviado de Deus, aquele que vem revelar o Pai às pessoas: “Eu e o Pai somos um”. (Jo 10,30) Jesus que define a sua condição de Messias, apresentando-se como o Filho de Deus. Deus que muito ama e quer dar a vida a todos e todas na pessoa do Filho. “Eu Sou”, se faz um de nós, para que sejamos nós mesmos. Cabe a cada um de nós assumirmos esta condição e fazer da vida um serviço às causas da libertação. Diante desta revelação de Jesus devemos sempre nos perguntar: Quem sou eu? Como defino a mim mesmo? Como me defino diante de Deus? Eu sou com e como Jesus? Eu sou comigo mesmo? O meu jeito de ser, pensar e agir, diz quem eu sou diante de Deus e das causas da vida? Sou capaz de amar na mesma proporção em que Deus nos ama? Sejamos nós mesmos, livres para amar, talvez inspirando-nos no que disse o filósofo holandês Baruch Espinosa (1632-1677): ”É livre a pessoa se pode avançar abertamente sem ter de utilizar artimanhas”.
Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.