Quinta feira da Semana Santa. Festa da Ceia do Senhor. Neste dia, a comunidade cristã dá início ao Tríduo Pascal. A preparação para a grande celebração da Páscoa, a vitória da vida sobre a morte. Este é o dia em que a Igreja celebra a instituição de dois dos sete sacramentos: Sacramento da Ordem (sacerdócio) e o Sacramento da Eucaristia. Jesus que é o eterno Sacerdote quis contar com a participação humana de ministros ordenados, vindos do meio do povo, para dar prosseguimento às suas ações no serviço aos demais. Como diria São João Maria Vianney (1786-1859): “O padre não é para si. Não dá a si a absolvição. Não administra a si os sacramentos. Ele não é para si, é para vós.”
A espiritualidade deste dia é carregada de sentido e significado mais profundo. Após instituir o Sacramento da Eucaristia, segundo os relatos dos evangelhos, Jesus disse aos discípulos e discípulas: “Fazei isto em memória de Mim” (Lc 22,19). Também com outras palavras, Ele instituiu o sacerdócio cristão: “Pegando o cálice, deu graças e disse: Tomai este cálice e distribuí-o entre todos. Tomou em seguida o pão e depois de ter dado graças, partiu e o deu aos seus seguidores, dizendo: Isto é o meu corpo, que é dado por vocês; fazei isto em memória de mim.” (Lc 22,17-19) A última Páscoa celebrada por Jesus indica o sentido pleno da sua morte: Ele se entrega totalmente (corpo, sangue) em favor das pessoas.
Eucaristia, memorial da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus. Só há sentido do itinerário da cruz com a libertação posterior que advém com a Páscoa da vida nova. Gesto supremo de amor de quem se doa totalmente para libertar as pessoas de toda uma vida marcada pelas forças do mal, do egoísmo, da falsidade, da ganância, da prepotência, da desigualdade, da vida voltada para o eu egocêntrico. Celebrar a Eucaristia é celebrar a Nova Aliança, que produz a sociedade fundada no dom de si para o bem de todos. Na Eucaristia fazemos aquilo que Santo Agostinho falou com propriedade: “Não somos nós que transformamos Jesus Cristo em nós, como fazemos com os outros alimentos que tomamos, mas é Jesus Cristo que nos transforma nele.”
Eucaristia é dom maior de Deus pela vida do Filho que é entregue como doação total de si mesmo. Jesus, o “Servo Sofredor”, que passou a sua vida pública nos ensinando a amar através do serviço aos mais necessitados: amor, doação serviço. Amor, igualdade, fraternidade. É por este motivo que a Eucaristia celebrada nas primeiras comunidades era realizada após a ceia, quando todos traziam e partilhavam os alimentos entre todos: “Entre eles ninguém passava necessidade, pois aqueles que possuíam terras ou casas as vendiam, traziam o dinheiro e o colocavam aos pés dos apóstolos; depois, ele era distribuído a cada um conforme a sua necessidade”. (At 4, 34-35).
Não é uma mera coincidência que, ao instituir a Eucaristia, Jesus tenha realizado também um ato revolucionário, ao lavar os pés dos seus discípulos. Este gesto de abaixar-se e lavar os pés alheios era realizado pelos servos. Ao tomar à dianteira e fazer acontecer um gesto típico do servo, Jesus vai demonstrar aos seus que no Reino do Pai e seu, “os últimos serão os primeiros, e os primeiros serão os últimos”. (Mt 20, 16) Assim, o seguidor de Jesus de Nazaré deve ter sempre como meta servir e não ser servido. Na perspectiva de Jesus, quem não vive para servir não serve para viver. Servir na gratuidade do amor que se faz presente naqueles e naquelas que dão a sua vida pelas mesmas causas de Jesus em favor dos oprimidos, excluídos e marginalizados.
O Sacerdote é um servo de Deus prestando seu serviço à comunidade. Tanto que nos primórdios do cristianismo, a “Estola” utilizada pelos sacerdotes está relacionada a “toalha” que Jesus usou na noite da Ceia quando lavou os pés dos discípulos: “levantou-se da mesa, tirou o manto, pegou uma toalha e amarrou-a na cintura. Derramou água numa bacia e começou a lavar os pés dos discípulos, enxugando-os com a toalha com que estava cingido. (Jo 13,4-5) A estola é símbolo do serviço ministerial que o padre exerce para a Igreja. Servo com e como o Servo de Deus no serviço de entrega gratuita à comunidade.
Como servo pobre com os pobres e para os pobres, a exemplo de Jesus, o sacerdote deve fazer uso das vestes mais simples possível, para que assim possa desenvolver melhor o seu serviço à comunidade. Desta forma, as vestes mirabolantes, suntuosas e cheias de adornos luxuosos, estão em dissintonia com a simplicidade do “Servo Sofredor”. Quem tem uma preocupação excessiva com tais vestes dá mostras de querer chamar mais atenção sobre si mesmo que para o serviço que é chamado a desenvolver como sacerdote que veio para servir e não ser servido. Em sintonia com o Papa Francisco podemos dizer: “sacerdócio não é carreira, é serviço”.
Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.