Começar de novo

Segunda feira da Oitava da Páscoa. A Quaresma se foi. O clima agora é outro, mesmo que a conversão seja uma busca permanente de todos nós. A Quaresma só tem sentido e razão de ser em função da Páscoa. Assim, não podemos viver uma vida de “Quaresma sem Páscoa”, como nos alertou o Papa Francisco. A noite escura das trevas deu lugar ao amanhecer da Páscoa. O Senhor é conosco Ressuscitado. Sigamos em frente com o mesmo espírito paulino: “Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo: alegrai-vos”. (Filip 4,4)

O período litúrgico de agora é o da Oitava da Páscoa. Depois de celebrarmos festivamente o Domingo de Páscoa, este clima se estende por mais sete semanas em que a Liturgia celebra a presença de Jesus Cristo Ressuscitado entre nós. Este período é aquele que compreende o tempo que Jesus passou ensinando e animando os seus seguidores e seguidoras, de como levar adiante e sem medo a missão: “até o dia em que foi levado para o céu. Antes disso, ele deu instruções aos apóstolos que escolhera, movido pelo Espírito Santo”. (At 1,2).

Estamos, portanto, vivendo o Tempo Pascal. Este tempo é constituído pelos cinquenta dias, culminando no Dia de Pentecostes. Esta é uma palavra grega “pentēkostḗ”, que quer significar “quinquagésimo”. Celebramos o Tempo Pascal como se fosse um único dia festivo, como está assim definido no livro das “Normas Universais do Ano Litúrgico”: “Os cinquenta dias entre o domingo da Ressurreição até o domingo de Pentecostes devem ser celebrados com alegria e júbilo, “como se fosse um único dia festivo”, como um grande domingo” (n. 22). Fazendo referencia aos escritos de Santo Atanásio de Alexandria. Não nos cabe ficar esperando o futuro para ser felizes, mas devemos fazer do presente a nossa alegria de viver.

Celebrar o dom da vida com alegria e júbilo. Esta é a proposta que é feita a todos os que seguem os passos do Ressuscitado. Celebrar a Páscoa é mais do que frequentar assiduamente o templo e cumprir preceitos, normas e dogmas. A Páscoa de Jesus se dá no dia a dia, em cada gesto de amor que somos capazes de manifestar. Em cada ato de justiça que fazemos acontecer. Em cada sinal de solidariedade que vamos espalhando entre nós. Celebrar a Páscoa é lutar pelas causas da vida que precisa ser vivida por inteiro. Todos os dias são dias de Páscoa quando nos tornamos mais humanos, mais amorosos e nos deixamos ser seduzidos pela ternura e compaixão.

Mas nem tudo são sinais verdadeiros de Páscoa entre nós. Quando governantes propõem que professores e profissionais que atuam nas unidades escolares usem armas de fogo, como forma se defenderem da violência, estão dando um péssimo exemplo de como os dias podem não ser dias de Páscoa. A solução para violência é ser também violentos e retribuir na mesma medida? Isto vindo de “pessoas de bem”, que dizem acreditar em Deus e serem “terrivelmente evangélicas”. Se esqueceram daquilo que fora dito por Jesus à Pedro: “Guarde a espada. Pois todos os que usam a espada, pela espada morrerão”. (Mt 26,52) Não se defende a vida com as mesmas armas dos opressores.

Começar de novo! Recomeçar quantas vezes forem necessárias. Celebrar todos os dias a Páscoa sem medo. Sem medo de ser feliz! A vida venceu a morte. A coragem venceu o medo. O alerta é feito por Jesus Ressuscitado aos seus seguidores: “Não tenhais medo”. (Mt 28,10) Esta é uma das frases que aparece por centenas de vezes no Novo Testamento. Não ter medo de acreditar que o Ressuscitado vivo está no meio de nós. Como sempre nos dizia o nosso bispo Pedro: “O contrário dá fé não é a dúvida, mas o medo”. Somente uma fé ativa e atuante transformará o medo da morte na alegria da vida. Viver a vida começando tudo de novo e cantando com Ivan Lins: “Começar de novo e contar comigo. Vai valer a pena ter amanhecido”.

Páscoa da vida nova! Páscoa da Ressurreição de Jesus! Deus vivo presente no meio de nós na pessoa do Filho. Jesus, a verdade de Deus sendo vida nas nossas vidas. Apesar de tudo o sistema que gerou a morte de Jesus bem que tentou desqualificar a ação de Deus ressuscitando o Filho e apelaram para recursos rasteiros, fazendo uso da mentira e do suborno, tentando neutralizar o surgimento da plenitude de vida: “Os sumos sacerdotes reuniram-se com os anciãos, e deram uma grande soma de dinheiro aos soldados, dizendo-lhes: Dizei que os discípulos dele foram durante a noite e roubaram o corpo, enquanto vós dormíeis”. (Mt 28,12-13). A vida venceu a morte. A coragem venceu o medo e a verdade prevaleceu sobre a mentira. O mal da mentira é que faz o descrédito do mentiroso, como Nietzsche assim nos ensinou: “Fiquei magoado, não por me teres mentido, mas por não poder voltar a acreditar-te”.

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.