A pedagogia do amor serviço

Quinta feira da Quarta Semana da Páscoa. Em Jesus, a esperança venceu o medo. Aquilo que parecia não ter saída, Deus abriu a porta da vida, deixando a morte pelo lado de fora. O Ressuscitado está muito vivo no meio de nós. Ele é um conosco, hoje e sempre. Do horizonte sem perspectiva dos planos da morte, orquestrada pelos poderosos, Deus dá a última palavra e faz renascer a vida com todo o seu esplendor. Como diz o nosso menestrel Zé Vicente: “Vence a tristeza. Enxuga o pranto. Ó meu povo. Vem cantar um canto novo. Deus da vida aqui está!” E como está!

Com a vitória da vida sobre a morte, a história humana inaugura uma nova etapa. Somos todos e todas, filhos e filhas do Deus Ressuscitado na pessoa do Filho. A esperança está no ar e dita o nosso ser, irmanados com Jesus. Não de qualquer esperança, mas aquela que Paulo Freire nos ensinou a pensar: “esperança do verbo esperar não é esperança, é espera. Esperançar é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir! Esperançar é levar adiante, esperançar é juntar-se com outros para fazer de outro modo”. Esperançar é fazer do mesmo modo como e com Jesus: amar servindo.

Ser esperançamento do amor renascido do Ser Ressuscitado de Jesus, dando continuidade às mesmas ações d’Ele na história. Segui-lo mais de perto é estar preparado a fazer parte de seu discipulado. Anunciar este Jesus vencedor da morte, dando-nos a vida em sua plenitude. Quem se põe na caminhada com Ele, sabe que precisa estar disponível a ser servidor de todos, indistintamente, adotando inclusive a pedagogia do amor-serviço, como Ele mesmo assim nos ensinou. Mesmo sendo Ele o Kyrios, “Senhor”, “Mestre”, palavra grega que foi utilizada como sinônimo de Deus ou Jesus entre os cristãos gregos, Ele se coloca como aquele que está sempre pronto a servir, em todas as circunstancias. Ou seja, Jesus adota para si a pedagogia do amor como serviço.

Neste sentido, a liturgia desta quinta feira é bastante emblemática. O texto Joanino de hoje se situa imediatamente após a cerimônia do assim chamado “lava pés”. Depois de realizar um ato típico do servo (escravo), Jesus recomenda a todos os presentes: “Em verdade, em verdade vos digo: o servo não está acima do seu senhor e o mensageiro não é maior que aquele que o enviou. Se sabeis isto, e o puserdes em prática, sereis felizes”. (Jo 13,16-17) Na concepção de Jesus, não há demérito algum em quem se faz servidor. Ao contrário, prova que entendeu a sua mensagem. E entender esta mensagem é colocá-la em prática em todas as nossas relações.

A pedagogia do serviço só funciona nesta mesma dimensão de Jesus se for fundamentada pelo amor. O servir, conjugado com o verbo amar. Quem ama, serve! Quem ama, cuida! Quem ama sabe o que é servir por amor! Quem se deixa seduzir pelo carisma do serviço gratuito, são aqueles e aquelas que trazem dentro de si um coração transbordante de amor, cheios de amorosidade para darem-se. O amor e o seviço são irmãos gêmeos na pedagogia de Jesus. Um, não existe sem o outro, e ambos se complementam em êxtase. A albanesa naturalizada indiana, Madre Teresa de Calcutá (1910-1997) soube traduzir em vida esta pedagogia do serviço entendendo que: “A fome de amor é bem mais difícil de saciar que a fome de pão.”

No ensinamento de Jesus aos seus, Ele fala e age com autoridade. Todavia, o entendimento de autoridade para Ele é o serviço sendo feito na gratuidade das relações. A autoridade somente poderá ser entendida como função de serviço aos outros. Seguir Jesus é tornar-se servidor dos outros, entendimento este que a nossa instituição eclesial, deixou se perder em algum lugar nas entrelinhas da história. Estamos mais acostumados a ver algumas das nossas lideranças religiosas buscando mais serem servidas que o contrário disto, num clericalismo sem fim.

Se amar é servir, precisamos também entender que na comunidade cristã existem diferentes funções, que se juntam em torno de um objetivo comum, que é o amor produzindo igualdade e fraternidade. Assim sendo, não se justifica a superioridade de alguns sobre os outros, uma vez que somos todos irmãos e irmãs, irmanados na pessoa de Jesus, que veio servir e não ser servido. Não fazer desta forma, trairemos o projeto originário de Jesus, tendo em nós as mesmas atitudes de Judas, permitindo que os nossos interesses pessoais se sobreponham aos interesses da comunidade de irmãos. Que nos esforcemos para sermos os enviados do Kyrios, pois, como Ele mesmo disse: “quem recebe aquele que eu enviar, recebe a mim”. (Jo 13,20)

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.