O amor e a correção fraterna

Quarta feira da Décima Nona Semana do Tempo Comum. Depois de fazermos a memória viva da Terceira Semana Pedro Casaldáliga, da páscoa de nosso pastor e intercessor, a vida por aqui segue no mesmo ramerrão de sempre. Não acomodarmos diante dos desafios e obstáculos, são os grandes desafios para àqueles e àquelas que fazem a sua adesão ao projeto libertador de Jesus. O cristão deve ser sempre um inconformado com a injustiça e, como Pedro mesmo nos dizia, devemos ser movidos pela “teimosia, resistência e esperança como ato de rebeldia”, lutando pelas utopias do Reino no aqui e agora.

No dia de ontem, fizemos a memória do nascimento de um grande pastor: Óscar Arnulfo Romero (1917-1980). Arcebispo de San Salvador, ele denunciava as violações contra os direitos humanos. Era a voz dos sem voz e sem direitos. Seu país estava atravessando um período de grande turbulência. Assim, “ele sentiu-se no dever de denunciar as injustiças que estavam sendo praticadas. Defendia, com todos os meios, especialmente pelo rádio e meios de comunicação social, os fracos e as vítimas da violência”. Em 14 de outubro de 2018, o Papa Francisco o canonizou e deu-lhe o título “O Santo da América”.

“Aqueles que têm uma voz devem falar por aqueles que são sem voz”. Assim foi o pastoreio de São Romero de América. Bispo e pastor, considerado um exemplo destemido de pastor e intercessor. Assumiu pra valer a luta dos indefesos camponeses, depois que seu amigo, Padre Rutílio Grande, foi assassinado junto com dois camponeses. Como o Papa Francisco mesmo disse a seu respeito: “a força e a coragem para construir o Reino de Deus, e para comprometer-se com uma ordem social mais justa e digna”.

O cristão não pode ser alguém indiferente frente ao que acontece ao seu redor. Comprometer-se com Jesus é identificar e comprometer-se com as suas causas. As causas da vida. A indiferença é um dos sentimentos mais nocivos que existe hoje em nossa sociedade. Algumas pessoas naturalizaram a indiferença como se fosse algo normal. O espírito competitivo e excludente do capitalismo ensina as pessoas desde muito cedo a serem indiferentes, levando-as a não se importarem com as dores, sofrimentos e dificuldades dos outros. Para estes, a misericórdia do Pai, anunciada por Jesus, não lhes toca, muito menos o mandamento do amor ao próximo, como Mateus nos traz em uma das falas de Jesus: A iniquidade e a maldade se espalhará tanto, que o amor de muitos se resfriará”. (Mt 24,12)

Como a indiferença, também a omissão se faz presente em muitas de nossas ações. Indiferença e omissão, dois pecados graves deste nosso tempo. O pecado da omissão é quando sabemos o que deve ser feito e não o fazemos por puro comodismo ou por indiferença. Como na Carta de São Tiago: “Portanto, aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz nisso está pecando”. (Tg 4,17) O exemplo clássico dado por Jesus sobre a não omissão é a da “Parábola do Bom Samaritano”. (Lucas 10:30-37) Ser omisso é deixar de exercer a prática da misericórdia e ajudar os necessitados.

Todos somos passiveis de erro. Até dizemos, “errar é humano!” O filósofo Aristóteles, porém dizia no início de sua Metafísica: “Todo ser humano deseja conhecer”. Há nele um desejo ávido de conhecer mais e mais. Assim, partindo deste pressuposto, é também pelos erros que vamos conhecendo-nos e descobrindo os acertos e os caminhos que nos levam às nossas realizações e relações com os outros. Aprender a aprender, como na pedagogia de Paulo Freire, valorizando tudo aquilo que a pessoa aprende sozinha a partir do conhecimento de outras pessoas. Aprender a aprender como forma de superação e de novos passos dados rumo ao saber e ao “Bem Viver”.

“Quem não tiver pecado atire a primeira pedra”. (Jo 8,7) Esta foi a pedagogia adotada por Jesus diante de furiosos fariseus e doutores da Lei que insistiam em querer apedrejar uma pobre mulher surpreendida em pecado. Se nem Jesus julgou, as pessoas, não podemos julgar e condenar, uma vez que nenhum de nós estamos isentos de pecado. O próprio Jesus não veio para julgar, pois o Pai não quer a morte do pecador, e sim que ele se converta e viva. Amando e perdoando na perspectiva da correção fraterna. Quem não perdoa, não sabe o que é amar. A nossa missão, não pode ser de usar o critério da exclusão do pecador, mas de procurá-lo, como o pastor que sai em busca da ovelha perdida. Como o Evangelho desta quarta feira assim conclui: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome eu estou ali, no meio deles”. (Mt 18,20)

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.