O saber e o poder

Sábado da Vigésima Semana do Tempo Comum. O último final de semana de agosto apontando no horizonte de nossa história. Neste final de semana, do mês dedicado às vocações, estaremos celebrando na Igreja Católica os diferentes ministérios e serviços exercidos pelos leigos: vocação do leigo. Uma missão especial importantíssima, do laicato atuando no mundo, no trabalho, na família e também na política, para desespero de alguns clericais de plantão. Falando sobre eles e para eles, disse claramente o Papa Francisco: “Os leigos não são ‘hóspedes’ na Igreja, mas estão em sua casa”, ainda mais na caminhada sinodal que estamos fazendo.

O dia 26 de agosto é uma data histórica. Celebramos hoje o “Dia da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”. Foi nesta data, em 1789, que foi aprovado este documento, que representa um marco para a democracia. Graças aos ideais da Revolução Francesa de Liberdade, Igualdade, Fraternidade (1789-1799), acabando com os privilégios da aristocracia e pelo término do Antigo Regime. Este documento contempla, pela primeira vez na história, os ideais de liberdade, igualdade e direitos fundamentais inerentes a cada pessoa humana.

Uma data também importante para as mulheres. Hoje é o Dia Internacional da Igualdade Feminina. No Brasil, há 91 anos, elas passaram a exercer o direito de votar. Foi a partir do Código Eleitoral de 1932, decretado durante o Governo Provisório de Getúlio Vargas (1930-1934), que as mulheres brasileiras alcançaram o direito de votar nas eleições nacionais. Uma verdadeira conquista a do voto feminino. Reconhecido em 1932 e incorporado à Constituição de 1934, apesar de ser facultativo. A partir de 1965, passou a ser obrigatório o voto feminino. O direito de votar é um dos direitos mais importantes das democracias, uma vez que permite que as pessoas possam exercer a sua cidadania, votando e sendo eleitas.

As leigas mulheres conquistando o seu direito cidadão, muito embora na nossa Igreja a participação delas é ainda subalterna. Nossa Igreja é ainda por demais clerical e machista. Os homens é que mandam e decidem. As mulheres “servem” para fazer o “serviço sujo” de lavar, limpar e nada de decidir, uma vez que o padre, o bispo é quem tem a prerrogativa de exercer o comando. Uma Igreja nada semelhante à caminhada de Jesus que sempre trouxe as mulheres para o centro, fazendo delas protagonistas do processo evangelizador. Muito triste o episódio ocorrido em uma das celebrações no Brasil em que o pároco escreveu pedindo desculpas (certamente pressionado), pelo fato de uma religiosa ter elevado o cálice no momento sublime da celebração. No dia em que estava celebrando a vocação à Vida Religiosa. Triste!

Mas, voltando à liturgia deste sábado, Mateus nos coloca no centro de mais uma das contendas envolvendo as autoridades judaicas. Lembrando que os fariseus era o principal grupo religioso da época, e é sobre eles que Jesus está ensinando as multidões e aos discípulos alertando-os: “fazei e observai tudo o que eles dizem. Mas não imiteis suas ações!” (Mt 23,3) Tinham autoridade, conheciam plenamente a Lei, falavam, mas não faziam. Tinham a hipocrisia encarnada em suas vidas. Cobravam dos outros aquilo que eles mesmos não faziam. Hipocrisia que quer significar fingimento, falsidade; fingir sentimentos, crenças, virtudes, que na realidade a pessoa não as possui.

Jesus faz duras críticas às lideranças religiosas de seu tempo. Quiçá, hoje também. Uma crítica à classe dominante que transformava seu muito saber em poder opressor. Os interesses destas lideranças era a dominação, oprimindo os pobres pela religião. Uma prática religiosa alienante e desvinculada do Projeto Libertador de Deus, que Jesus veio nos revelar. Certamente, Jesus teria muito trabalho nos dias de hoje com a prática religiosa de algumas lideranças de nossas comunidades. Usam vestes vultosas, falam bonito nos púlpitos das Igrejas, mas não pisam os seus pés na realidade sofrida dos mais pobres. Ao contrário da hipocrisia das lideranças religiosas de ontem e de hoje, na nova comunidade de Jesus todos são irmãos e irmãs, voltados para o serviço mútuo e reunidos em torno de Deus que é Pai, e de Jesus, que é o único líder e que veio para servir. Saber é fazer e poder é serviço. Escutando, falando e fazendo, eis o desafio. Bem fazem os chineses como demonstra um de seus provérbios: “Somente os tolos exigem perfeição, os sábios se contentam com a coerência”.


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.