Mesmo se já velhos, temos que, todos os dias, nascer de novo

Reflexão litúrgica: segunda-feira, 20/11/23,
33ª Semana do Tempo Comum

 Na Liturgia desta segunda-feira, 33ª Semana do Tempo Comum, na 1a Leitura (1Mc 1,10-15.41-43.54-57.62-64), vemos que fora imposta uma violenta cultura grega pagã sobre o povo de Israel com um risco ameaçador de apostasia: cultos pagãos, profanação da Lei de Deus, destruição dos livros sagrados etc. A situação é desesperadora. Há, porém, um grupo não pequeno de judeus que defende com a vida a fidelidade à aliança. Esse choque frontal entre a perversidade e a fidelidade a Deus encontra um eco não muito distante em nossa vida de hoje.

No Evangelho (Lc 18,35-43), vemos que um “cego e mendigo estava sentado à beira do caminho”, isto é, imobilizado pelas suas carências, sem horizontes, não sabe aonde ir, totalmente dependente, está à margem da alegria de viver e conviver com dignidade. Mas, nisto, ouve dizer que Jesus estava passando; então, toma consciência de que Jesus está muito perto de sua vida, de suas dores, carências e sofrimentos. Começa a gritar: “Tem misericórdia de mim”. Como diz uma canção muito edificante para nossa alma: “Tenho esperado esse momento, tenho esperado que viesses a mim”.

O texto diz que “muitos o repreendiam para que calasse”. Aqui, vemos que a sociedade que manda o cego calar é a mesma que trama o fim de Jesus, não tolera quem vê a realidade a partir dos oprimidos, não se importa com os gritos dos que passam fome e que estão carentes de cidadania, não toleram a luta e a pressão popular; querem silenciar os profetas, pois vivem na total ignorância, com ódio no coração e cegueira moral. Querem que a miséria permaneça oculta, que não se mostre, que não perturbe. São os ricos na real miséria, cegos de Deus.

O grito do cego é o mesmo grito do povo pobre e oprimido que incomoda os bem instalados, os que estão tranquilos na sua vidinha cotidiana e não desejam mais um competidor nos seus espaços e privilégios, os que se sentem ameaçados pela ascensão do pobre. A história desse cego pode se repetir ainda em nossos dias quando nos opomos às conquistas dos marginalizados.

Mas, o cego venceu os impedimentos daqueles que o mandavam calar-se. Jesus ouviu o seu grito, parou e mandou chamá-lo. “Deus ouve o clamor dos oprimidos, vê a miséria, conhece os sofrimentos e desce para ajudá-los”.

Graças a Deus, próximo ao cego, estavam pessoas solidárias (Pastorais Sociais) que, sensíveis à sua condição desumana, o chamam para uma experiência de Deus libertador: “Coragem, levanta-te, Jesus te chama”. Então, ele rompe com a margem, salta para a vida nova, compreende que cegueira é não ter fé, não ver o Projeto de Deus que quer vida em abundância para todos e não só para uma pequena minoria que domina a imprensa de forma maléfica e impede políticas públicas de inclusão dos menos favorecidos. A iniciativa da fé fez com que recobrasse a visão e, iluminado e liberto, seguisse Jesus. Com isso, nos ensina que, por mais dura que seja a realidade, sempre é possível mudá-la para melhor.

Enfim, o princípio da fé é reconhecer a miséria, invocar a misericórdia e, alcançada a graça, seguir Jesus, multiplicando o bem. “Ele passou a vida fazendo o bem”. Neste sentido, cego é cada um de nós. Jesus nos ajuda a abandonar o ‘manto’ do egoísmo e da submissão às ideologias dominantes para nos tornarmos pessoas solidárias e comprometidas com um mundo melhor, mais humano e mais digno. Mesmo se já velhos, temos que, todos os dias, nascer de novo.

Boa reflexão e que possamos produzir muitos frutos para o Reino de Deus.


Padre Leomar Antonio Montagna é presbítero da Arquidiocese de Maringá, Paraná. Doutorando em Teologia e mestrado em Filosofia, ambos pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR – Câmpus de Curitiba. Foi professor de Teologia na Faculdade Missioneira do Paraná – FAMIPAR – Cascavel, do Curso de Filosofia da PUCPR – Câmpus Maringá. Atualmente é Pároco da Paróquia Nossa Senhora das Graças em Sarandi PR.