Não tem sido fácil estar ao lado dos povos indígenas. Se o trabalho já era difícil, nos últimos tempos houve um recrudescimento. Aqueles e aquelas que se colocam ao seu lado sabem que tem que estar preparados para lutar. Antes, os maiores adversários, eram a turma do agronegócio, madeireiros, garimpeiros e pecuaristas. Agora, até mesmo pessoas de “dentro” da própria Igreja Católica, se opõem veementemente à atuação dos indigenistas e da própria CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, definindo a todos como esquerdistas e comunistas. A Causa indígena é de todos nós! Este é o lema que o Conselho Indigenista Missionário – CIMI, órgão vinculado a CNBB, definiu como uma de suas bandeiras de luta, no trabalho indigenista.
Sou também da causa indígena e não abro mão desta opção, feita ainda no ano de 1992. Naquele ano, assim que me vi no meio dos povos indígenas daqui do Mato Grosso, percebi que aquele seria o meu lugar de estar. Amor a primeira vista! Uma opção de um jovem padre ainda, mas que iria mudar definitivamente, todo o meu jeito de ser, e estar no mundo, enquanto seguidor de Jesus. Naquele tempo vivíamos com intensidade a Opção Preferencial pelos Pobres, que a igreja da época havia abraçado nas pessoas de Dom Helder Câmara, Dom Tomás de Balduíno, Pedro Casaldáliga, para ficar nestes três expoentes, dentre tantos outros.
Fiz da causa indígena a minha causa, influenciado pelo bispo Pedro. “Aqui você vai se encontrar e vai se esquecer da periferia de São Paulo”, alertou ele. Isso funcionou como uma palavra profética, pois em pouco tempo, ficou para trás o apego que eu tinha pela Zona Leste. Mergulhei de cabeça neste universo dos povos indígenas e fui aprendendo dia a dia, uma nova dinâmica para a minha vida. Estar numa aldeia indígena era o que mais me satisfazia. Tive que refazer muitos dos meus conceitos e projetos, para conhecer de perto outra visão de mundo, outra cosmovisão, daquelas que não se aprende nas melhores universidades do mundo. Fui adentrando neste espaço de saberes tradicionais, perpassados pela oralidade, me fazendo um com eles nas suas lutas, anseios e expectativas. Estar com, este era o adereço maior.
Nunca tive dúvidas da opção estava fazendo. Foi um mergulho de corpo e alma. Muito me ajudou para isso um dos poemas de Pedro, que mostra que Jesus também tinha as suas opções preferenciais. Desde o berço familiar, o menino já crescia sabendo quem era os seus prediletos e quem eram aqueles da sua classe social: “No ventre de Maria Deus se fez homem. Na carpintaria de José, se fez classe” (Pedro Casaldaliga). Este poema também mostrou que eu não estava fazendo a opção errada. Pelo contrário, me vi cada vez mais inserido naquela realidade, no caminho sem volta.
Uma das primeiras lutas que aprendi a lutar com eles foi a luta pela terra. A terra é do povo indígena, quem não sabe disso?. Uma luta incansável, para ver demarcados os seus territórios. Demarcações estas que sofreram paralisação e retrocessos nos procedimentos administrativos de reconhecimento das Terras Indígenas. Com este atual governo então, as coisas pioram muito, uma vez que deu margem para que os interessados em invadirem as terras, os pistoleiros do desmatamento, partissem com tudo, para cima dos povos indígenas.
Também houve o recrudescimento de um discurso anti-indígena, de ódio e preconceito para com os povos originários, negando, inclusive, a sua identidade e do seu direito à autodeterminação dos povos. Ou seja, tudo o que querem é permanecerem sossegados nos seus territórios, sem serem importunados por quem quer que seja. Esta tem sido uma das principais lutas destes povos, que se vêem cada dia mais ameaçados.
Nestes tempos de pandemia, estamos vendo o que significa o aumento significativo das invasões dos territórios indígenas. Tudo com a finalidade de manter atividades ilegais de garimpo, pesca, caça, exploração madeireira. Os indígenas estão vendo tudo com muita preocupação, uma vez que afeta diretamente a defesa da dignidade da vida, colocados em xeque, mesmo estando devidamente assegurados na Constituição Federal de 1988 (Art. 231) Não somente o espaço sagrado de seu território que está sendo violado, mas significou a porta de entrada do vírus, que segue tirando a vida de indígenas, jovens e velhos. Como vêem, uma opção de vida pelas vidas, que vale a pena ser vivida! Uma opção para toda a vida!