Todos estamos nos perguntando: Como será a nossa igreja quando tudo isso passar? Qual deve ser a postura de padres, líderes das comunidades, agentes de pastoral, frente ao novo cenário que se descortinará mais a frente? Voltaremos à nossa rotina de antes, com as mesmas celebrações? Como as demandas que surgirão a partir de agora nos interpelarão? Trataremos a todos como se nada do que passamos significou nas nossas vidas? São perguntas que muitos estamos fazendo, como forma de nos adequarmos aos novos tempos que virão. Não há como ficar indiferente neste contexto.
Eliseu Wisniewski, padre Vicentino, mestre em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e professor na Faculdade Vicentina (FAVI), Curitiba, PR, escreveu um artigo muito interessante, acerca de como a Igreja Católica deveria posicionar-se frente ao cenário pós-pandêmico. Neste artigo ele diz: “Neste cenário, a Igreja deve estar preparada para se manifestar como uma mãe que cura feridas, que oferece o remédio da consolação e da esperança (…) conduzindo as pessoas a um sentido mais profundo da existência, a um retorno às raízes, que se encontram no mistério eterno do amor de Deus. Incentive-se o ministério da escuta, a ajuda de profissionais como psicólogos, que em nossas comunidades possam ajudar e atender, principalmente os mais pobres”.
Curar as feridas! Quantas feridas estarão abertas? Quantos dos nossos irmãos e irmãs, estarão sangrando pelos efeitos nefastos de uma pandemia que deixou rastros em nossas vidas? E a igreja é chamada a dar uma resposta que atenda a este grande desafio. Se atentarmos bem, Jesus, antes de fazer o envio de seus seguidores, os prepara e os orienta para não se esconderem, mas que fossem para o meio do conflito e, sobretudo, curasse os doentes, de todas as suas enfermidades. Hoje, podemos nos sentir assim, sendo enviados também por Jesus, para darmos respostas aos “deserdados filhos da pandemia.”
Precisamos mais do que nunca encontrar sentido para as nossas ações dentro da Igreja. Escutar a voz do Espírito que sopra onde quer e como quer. Devemos estar atentos ao clamor que brota dos anseios das pessoas, pelo sofrimento, pela dor da perda, pelo desemprego, pelo endividamento, pela fome. Como o próprio Deus ouviu o clamor do povo Hebreu no Egito: “Eu vi muito bem a miséria do meu povo que está no Egito. Ouvi o seu clamor contra seus opressores, e conheço os seus sofrimentos. Por isso, desci para libertá-lo…” (Ex 3, 7-8) Um Deus que não somente ouvi o clamor, mas vem em socorro dos sofredores.
Este é o grande desafio desta igreja que também brotará desta “nova normalidade.” Estar pronta a escutar o clamor e colocar-se no lugar daquele que clama. Ou a Igreja faz esta opção clara de ser porta voz dos excluídos, ou não haverá mais sentido manter as suas portas abertas, e comportar como se nada tivesse acontecido na história da humanidade. Neste sentido, as nossas celebrações precisam revestir de um carisma inovador, que venha de encontro a este homem e a esta mulher, machucados pela grande dor. Dizimados pelo estigma de uma doença que ceifou muitas vidas entre nós.
O Papa Francisco tem feito um grande esforço no sentido de sensibilizar as pessoas, para um olhar mais atento à esta realidade, convidando-nos a “estender as mãos aos pobres” e criticando veementemente aqueles que não escondem o seu cinismo e a sua indiferença, frente ao sofrimento das pessoas. Da mesma forma que a Igreja jamais poderá fechar os olhos, frente a esta realidade destes últimos meses, em que o mundo inteiro foi dominado por um vírus que causou dor e morte, angústia e perplexidade. São estas mesmas pessoas que fazem parte da nossa caminhada de igreja e que não poderemos ficar indiferentes frente a este contexto que elas trazem dentro de si, como uma ferida aberta.
A mesma realidade nos é apresentada pelo evangelho do dia de hoje, quando um leproso se aproxima de Jesus, ajoelha e diz: “Senhor, se queres, tu tens o poder de me purificar. Jesus estendeu a mão, tocou nele e disse: Eu quero, fique purificado. No mesmo instante o homem ficou purificado da lepra. Então Jesus lhe disse: Não conte isso a ninguém! Vá pedir ao sacerdote para examinar você, e depois faça a oferta que Moisés mandou, a fim de que seja um testemunho para eles.” A ação primeira de Jesus, é ajudar aquele homem e libertar-se daquela terrível doença. Penso que na nossa vivência cristã de comunidade, devemos ser assim, diante das chagas que cada um haverá de trazer para a vida de comunidade dos seguidores de Jesus. Uma Igreja menos sacramental e mais querigmática, profética, sintonizada com os anseios dos pobres.