Evangelho Mt 8,28-34

Caros irmãos e irmãs, paz e bem

Após a grande pregação da montanha, Mateus apresenta as ações de Jesus. Dentre essas ações, o evangelho de hoje nos apresenta o episódio dos dois homens possuídos por demônios que são libertos por Jesus. Apresento pequena reflexão sobre essa passagem do evangelho segundo Mateus.

A boa notícia da chegada do Messias que veio inaugurar o Reino dos Céus é apresentada em Mateus nas palavras e gestos de Jesus de Nazaré. Ele é o Enviado do Pai, e para que os cristãos adentrem o Reino, precisam seguir Jesus, o que significa ouvir a sua palavra e seguir a sua prática. Somente palavra, pregação, não é suficiente para formar um discípulo, pois palavras podem dar margem a muitas interpretações, por isso a pregação deve ser interpretada em comparação com a prática, com os gestos de Jesus, e é na prática que os discípulos serão reconhecidos como seguidores do Mestre, Jesus.

No Evangelho de hoje contemplamos Jesus que vai à outra margem, região dos gadarenos, e lá depara-se com dois homens saídos dos túmulos, possuídos por demônios. Ninguém havia chamado Jesus, ninguém o esperava nesse território, os homens endemoninhados eram violentos e viviam isolados. Quando Jesus vai até lá está ensinando aos discípulos que precisam sair da sua zona de conforto, ir às periferias, aos possessos por poderes que os aprisionam, mas demonstra que essas pessoas necessitadas da presença libertadora de Deus não são pessoas agradáveis e vivem em contexto de violência.

Interessante notar que os demônios reconhecem Jesus como Filho de Deus, sabem que ele está ali para os expulsar, por isso pedem para que ele os mande para os porcos. A única palavra dita por Jesus é “Ide”. Portanto, não é uma passagem centrada na palavra de Jesus, mas no seu gesto. Há nesta passagem uma oposição entre as forças do mal, os que são contra o Reino dos Céus e a pessoa de Jesus, o Filho de Deus, que traz libertação e vida. Jesus manda e os demônios deixam os homens e vão para os porcos que se atiram monte abaixo e morrem afogados no mar. Ou seja, Jesus com o seu gesto de proximidade daqueles dos quais ninguém queria estar perto expulsa o mal e liberta os oprimidos.

Espera-se que a população se alegre com a chegada do Reino dos céus, com a libertação dos oprimidos, mas não é isso que o evangelho apresenta. Quando a população sabe do ocorrido vai até Jesus e pede para que se retire da região deles. Ao que me parece, àquela sociedade era muito mais importante a atividade econômica da criação de porcos do que a libertação dos oprimidos. Para eles não havia problema em ter pessoas à margem, dominadas por demônios, porque isso não afetava suas atividades econômicas, mas uma vez que a atividade econômica é afetada, não importa que a vida digna para os marginalizados esteja acontecendo, a atividade de Jesus é vista como nociva.

Seguir Jesus não é possível somente por palavras, mas tem que se traduzir em gestos concretos que chegam às “periferias existenciais da humanidade”, para citar o Papa Francisco, e que lá encontram os marginalizados, oprimidos por tantos poderes e poderosos. Poderosos esses aos quais não importa a vida, mas sim os lucros. Esses poderes não conseguem perceber que Jesus é o Filho de Deus, e desprezam a sua forma de agir. Meditando o evangelho de hoje somos convidados a olhar para nossa realidade e discernir quem são os possuídos por poderes que os desumanizam, como esses poderes agem e quais são as atitudes que nós, discípulos de Jesus, devemos tomar, guiados pelo Espírito de Deus, para que seu Reino aconteça, apesar da oposição dos que põem os lucros acima da vida. Meditemos.