O clamor dos pobres

Uma centelha de luz e esperança paira sobre nossas cabeças, nesta manhã de terça-feira (22), início da primavera. Nuvens carregadas cobrem o nosso céu. Comecei o dia rezando para que, as tão desejadas chuvas, não fiquem apenas numa ameaça. Quem sabe assim, não apague tantos focos de incêndio sobre a nossa floresta, que já perdeu grande parte de sua vida. Alguns indígenas me ligaram, dizendo que estão fazendo todos os dias a dança da chuva. Que os ancestrais nos ouçam, já que quem deveria nos ouvir, fazem ouvidos mocos.

A liturgia de hoje nos coloca diante da narrativa de Lucas em que Jesus, aparentemente, age meio que, com desaforo para com a sua própria mãe: “A mãe e os irmãos de Jesus aproximaram-se, mas não podiam chegar perto dele, por causa da multidão. Então anunciaram a Jesus: Tua mãe e teus irmãos estão aí fora e querem te ver. Jesus respondeu: ‘Minha mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a Palavra de Deus, e a põem em prática”. (Lc 8,19-21). Com tal atitude, Jesus quer nos demonstrar que não há privilégios para aqueles que se julgam fazer parte de sua linhagem familiar. Todos os que escutam a Palavra e a procura viver, com intensidade, se fazem um com ELE.

Confesso que demorei um bocado de tempo para poder entender esta passagem na sua essência. Em principio, Jesus parece duro com a sua própria mãe, dizendo que também ela, precisa passar pela mesma experiência daqueles que se põem na caminhada consigo. Aqui não importa tanto a linhagem, mas a fidelidade na escuta e no seguimento dos passos d’Ele. Sem nenhum nepotismo, como estamos acostumados a ver, principalmente no meio político, com os privilégios estendidos àqueles que são da mesma família.

Por falar na questão política, o mentiroso mor do Palácio do Planalto, vai discursar logo mais na Assembleia da ONU. Não tenho dúvidas, de que vai dizer ali, que o Brasil é o país que mais cuida e defende o meio ambiente. Todo este fogo que estamos presenciando por aqui, são imagens forjadas pela oposição, que quer derrubar o monstro genocida que está à frente desta grande nação. Não há desmatamento. Não há fogo. Não há destruição da nossa rica flora e fauna. Os satélites do (IMPE) Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais captam imagens inverídicas de uma floresta que está intacta e sem destruição. Também não houve queimada de nenhuma casa de algum indígena qualquer. Nunca pensei também que eu fosse assim tão mentiroso, naquilo que estou vendo no meu dia a dia.

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, mui digna representante dos fazendeiros, veio a público dizer que, uma das formas de combater o desmatamento na Amazônia, seria regularizar as terras que estão invadidas pelos fazendeiros. Mesmo que estas invasões estejam dentro dos territórios sagrados dos Povos Originários. Em assim fazendo, estes criminosos ambientais, deixariam de desmatar as áreas sobre as quais fizeram a invasão, afirma ela. Empatia zero para com a luta dos povos indígenas, que lutam há anos, para expulsar estes invasores de seus territórios. O Povo Tapirapé, habitante da região da serra do Urubu Branco, no Mato Grosso que o diga.

A nossa querida Amazônia está entrando em colapso, destroçada por incêndios criminosos intencionais e pelo desmatamento sistêmico, com o aval do (des)Governo Federal. Ao contrario destes que ai estão, há todo um movimento para que estes crimes não continuem acontecendo e assim, possamos salvar a floresta que é a nossa fonte maior de vida no planeta. Os povos nativos, ribeirinhos, quilombolas estão clamando. Sua voz ecoa entre nós que não poderemos ficar indiferentes, frente ao descaso com todo este processo de destruição. Devemos fazer das nossas vidas um projeto de defesa intransigente da floresta. Se não ouvirmos o clamor dos povos que ora clamam, faremos como nos diz o texto da primeira leitura de hoje: “Quem tapa os ouvidos ao clamor do pobre, também há de clamar, mas não será ouvido.” (Pr 21, 13)

Chega de destruição de nosso país! Não estamos sós e desamparados. Conosco está o nosso Deus e ELE é pela vida e não pela morte. A voz dos pequenos povos da floresta, precisa ser ouvida. Se somos seguidores do Filho de Deus, como comumente falamos, não poderemos ficar indiferentes perante a tanto descalabro. Por fim, me vem a mente a passagem também de Lucas quando ele afirma: “Acaso Deus não fará justiça aos seus escolhidos, que clamam a ele dia e noite? Continuará fazendo-os esperar? Eu digo a vocês: Ele lhes fará justiça e depressa”. (Lucas 18, 7-8) E não é que a chuva veio…