Novembro começa a dar as caras. Estamos caminhando para o final do ano. Um ano atípico e tenebroso, é verdade, mas o mês segue o seu curso. Parecia que não chegaríamos até aqui, de tantas intempéries surgidas. Parecia que os meses estavam se arrastando e nós, com toda a nossa insegurança, diante desta pandemia maluca. Os tempos ainda são incertos. Não podemos abaixar a guarda, afinal, lá de fora chegam noticias nada animadoras a respeito da doença. É preciso estar vigilante e nos protegendo. Não sabemos ainda onde tudo isso vai chegar.
Hoje fiz questão de rezar com o texto da narrativa de Paulo aos Filipenses. (Fl 2, 5-11) Uma das mais belas páginas do Novo Testamento. Cada vez que leio este texto, me encanto mais. Um hino cristológico fantástico, que nos ajuda a entender, quem era esse Jesus de Nazaré e como o apóstolo o vê a partir da sua fé. Na realidade, num primeiro momento, Paulo nos convida a evitar as divisões causadas pelo espírito de competição, pelo desejo de receber elogios e pela busca dos próprios interesses. Segundo a sua visão, estas fraquezas denotam um fechamento egoísta sobre si mesmo, numa busca de autopromoção à custa dos outros.
O texto de hoje vai mais além, numa perspectiva de apresentar quem foi esse Jesus. Assim, este hino nos mostra qual é o Evangelho da cruz, o Evangelho autêntico, e apresenta na pessoa de Jesus, o Cristo o modelo para toda a humildade. Mesmo tendo a mesma condição de Deus, esse Jesus se apresentou entre os homens como simples mortal, abrindo mão de qualquer privilégio e tornando-se apenas homem que obedece a Deus que serve as pessoas. Foi alguém que sempre esteve disposto a servir até o fim, chegando inclusive ao ponto de perder a própria honra e morrer pendurado numa cruz, como se fosse um criminoso qualquer.
A grandeza deste Jesus foi tamanha que Deus o exaltou e o Ressuscitou, colocando-o no posto mais elevado que pudesse existir como o Senhor do universo e da história. Diante deste servo sofredor, que se entregou fielmente ao projeto de Deus, os cristãos somos convidados a fazer o mesmo, abrindo mão de todo e qualquer privilégio, até mesmo da boa fama, para pôr-nos a serviço uns dos outros, até o fim. Esta é a proposta que é feita a cada um de nós, se quisermos fazer a mesma experiência de Jesus, sendo com ELE servos na construção do Projeto de Deus.
Só Jesus salva, nos dirão alguns neopentecostais. Estamos diante de uma frase feita, repetida a exaustão, mas de significados diversos. Parece-me que não basta afirmar tal frase e ficar tranquilo esperando que esta tal salvação venha até mim. Com certeza ela virá, mas depois que cada um de nós fizer a sua parte, frente ao projeto salvífico de Deus. É necessário primeiro, fazer esta mesma caminhada que fez Jesus, esvaziando de si mesmo, e indo ao encontro dos seus, os menos favorecidos e, com eles, fazer a caminhada de libertação contra todas as formas de opressão.
Compreender a lógica de Jesus, através deste texto de Paulo aos Filipenses, é se colocar confiante nas mãos de Deus, numa tentativa de esvaziamento total de si mesmo, para ser e estar em Deus, pressupondo, de antemão, a vida do irmão, sobretudo daqueles que mais sofrem e precisam alcançar a sua libertação.
Talvez você fique até pensando: como posso fazer isso, na minha forma tão limitada de ser? Se cada um de nós assim pensar, creio que não conseguiremos ir muito longe. Mas, na medida em que, eu com a minha fraqueza, me junto com a fraqueza que o outro também possa sentir, vamos nos fortalecendo e construindo o novo. Fazendo a história acontecer, tendo como aporte, a presença do Deus vivo que conosco caminha.
A salvação nos virá não como algo mágico, como se bastasse apenas um clique de Deus. Ela nos virá sim, depois que aderirmos ao Projeto de Deus e nos colocarmos em marcha na caminhada da libertação. Ao abraçarmos o Projeto de Deus, abraçaremos também a causa dos irmãos e com eles seguiremos fazendo a história acontecer, onde a vida tem a primazia sobre a morte. A triste realidade de pobreza, exclusão e opressão a que está submetido o povo, requer ações urgentes de pessoas que estejam dispostas a lutar contra esta opressão que fere a dignidade das pessoas e sobe ao céu num clamor de justiça à Deus. Só Jesus salva, depois que nos libertarmos do fechamento sobre nós mesmos com os nossos projetos egoístas.
