Crise de identidade

Quarta-feira (16). Mais um dia nos é dado pelo Criador. Começo o meu dia em oração. Sempre dediquei as primeiras horas do dia à oração. Enquanto vou degustando uma boa cuia de chimarrão, aproveito para me colocar em sintonia com o Deus de Jesus. A natureza se descortina à frente, com os pássaros a procura de algo para saciar a sua fome. Ainda bem que o quintal possibilita uma diversidade de frutos, que eles, sem cerimônia, se deliciam a vontade. Rezando, tendo em mente o pensamento do filósofo e teólogo dinamarquês Soren Kierkegaard (1813-1855) que diz: “A função da oração não é influenciar Deus, mas especialmente mudar a natureza daquele que ora”.

Em tempos de pandemia, rezar ajuda aliviar um pouco as angústias de tantas notícias tristes e desencontradas. Infelizmente, a insanidade ainda se faz presente, através daqueles que ainda insistem em acreditar que a pandemia chegou ao seu ocaso. Talvez mudem de opinião, quando os mortos, forem os seus mortos. Enquanto isso, preferem seguir as orientações dos negacionistas do conhecimento cientifico de plantão. Triste saber que mais de 20% da população brasileira pesquisada não aderirá à vacina que se prenuncia.

A oração faz parte da vida do cristão. Ela é essencial na vida cristã. A narrativa bíblica nos diz que podemos conversar com Deus, através da oração, a todo o momento. Todavia, em meio à correria do dia a dia, deixamos a oração de lado, como se confiássemos mais em nós mesmos do que na ação de Deus em nós. Mesmo assim, é muito importante encontrar um tempo para orar. Dom Angélico costumava dizer: “Quem não reza vira bicho”. Já Afonso Maria de Ligório (1696-1787), fundador dos Redentoristas, afirmava: “Quem reza, certamente, salva-se e quem não reza, certamente, será condenado.”

A oração nos possibilita entrar em sintonia com o Projeto de Deus, revelado em Jesus de Nazaré. Nela, conseguimos vislumbrar o sonho de Deus. Com ela, conseguimos fazer a experiência do seguimento do Nazareno, tendo em nós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus. (Fil 2, 5) Através dela, vamos posicionando na história dos homens e fazendo-nos instrumentos nas mãos de Deus para a transformação da realidade.

No dia de hoje, percebemos uma crise de identidade entre os discípulos de João Batista e os discípulos de Jesus. Num dado momento, João manda que os seus, vão até Jesus para lhe perguntar: “És tu aquele que há de vir, ou devemos esperar outro? (Lc 7, 19). Será que Jesus é verdadeiramente o Messias esperado? Entretanto, a resposta de Jesus é clara e objetiva. Não uma resposta com palavras, até porque o messianismo não é simples ideia ou teoria, mas uma atividade concreta, que realiza o que se espera da era messiânica: a libertação em todos os níveis dos pobres e oprimidos.

Jesus recorre à profecia de Isaias para dar a sua resposta que, de certa maneira, satisfez os seguidores de João. “Ide contar a João o que vistes e ouvistes: os cegos recuperam a vista, os paralíticos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam, e a boa nova é anunciada aos pobres”. (Lc 7, 22-23) Mais concreto impossível. Um Deus que está no meio dos pobres para libertar definitivamente os pobres. Um Deus que não se define através de teorias mirabolantes, mas que se vive integralmente o seu projeto de vida.

O profeta dos pobres de Roma encontrou uma forma muito peculiar de traduzir isto para os dias de hoje este discurso programa de Jesus. Francisco na sua primeira Exortação Apostólica pós-Sinodal Evangelii Gaudium ou Alegria do Evangelho, pensando numa igreja em saída, assim se manifesta: “A alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus. Quantos se deixam salvar por Ele são libertados do pecado, da tristeza, do vazio interior, do isolamento! Com Jesus Cristo, renasce sem cessar a alegria. Quero, com esta Exortação, dirigir-me aos fiéis cristãos, a fim de os convidar para uma nova etapa evangelizadora marcada por esta alegria, e indicar caminhos para o percurso da Igreja nos próximos anos.” Jesus, Boa Nova dos pobres, nos faça também ser portadores desta Boa Nova!