Saber cuidar

Domingo da Epifania (manifestação) do Senhor (03) Celebramos a vinda do Senhor para todos os povos. Ou seja, neste dia, celebramos a redenção de todas as pessoas de boa vontade. É Deus mesmo que vem cuidar de seu povo. “Eu vi a aflição do meu povo no Egito. Ouvi o seu clamor e desci para o libertar. (At 7, 34) Com esta sua atitude, Deus quer nos mostrar que somos um povo em contínua marcha histórica em direção à vida plena. Um Deus que não está localizado e fechado num templo, nem é manipulado como ídolo para legitimar uma ordem social injusta. ELE está presente na vida e na história, caminhando com o povo.

Um Deus que acolhe e cuida dos seus. Este é também o desafio para todos nós ao longo deste ano de 2021. Precisamos saber cuidar. Cuidar de nós mesmos e do outro. Um ano de muita esperança. Esperança na vacina que está a caminho. Como nos disse o Papa Francisco, “um bom ano se as pessoas cuidarem umas das outras. Além de uma vacina contra o Coronavírus, o mundo precisa de uma ‘vacina para o coração’”. Será um bom ano se cuidarmos uns dos outros, como enfatiza o Papa da importância de “educar o coração para cuidar, para valorizar as pessoas”.

 

Preparar o nosso coração para a prática do cuidado. Saber cuidar. Cuidar dos mais pobres e vulneráveis entre nós. Se a Igreja leva a sério a opção pelos pobres, ela terá que dar um passo mais além, ajudando também os pobres a fazerem a opção por eles mesmos. Quantos pobres entre nós pensando e agindo com a cabeça do rico? Fazer a opção pelos pobres é fazer a mesma opção feita pelo próprio Deus. O mesmo que nos dizia Pedro “Deus não opta pela humanidade, Deus opta pelos pobres da humanidade”. Na sua concepção, “ou a Igreja é dos pobres e para os pobres, ou não é a Igreja de Jesus de Nazaré”.

O ano novo começa primeiro dentro de cada um nós. E levaremos as nossas atitudes e concepções para dentro do ano que ora se inicia. Desta forma, precisamos abrir-nos a esta perspectiva de desenvolver em nós a “pedagogia do cuidado”. Fazer acontecer em nós a mesma experiência de Deus, que cuida de cada um de nós, com o amor de mãe, como nos afirmava Dom Hélder Câmara. “Deus é mais mãe do que pai”, esta foi uma das frases ditas pelo Para João Paulo I e que deu muito que falar. Um Deus que nos ama com o amor de mãe. E por falar em amor, talvez pudéssemos incorporar em nós a canção “Eu Sei Que Vou Te Amar”, de Vinicius Moraes e Antonio Carlos Jobim, aqui interpretada por Ana Carolina.

Cuidar é o verbo da vez entre nós. Ou cuidamos ou nos perderemos todos. Um cuidar solidário, naquela mesma compreensão de Pedro que nos alertava: “a solidariedade só é levada às últimas consequências quando se faz tudo o que é possível para que o irmão deixe a situação em que se encontra”. Cuidar para que tenhamos entre nós um mundo mais justo e solidário. Apesar da palavra caridade já estar bastante desgastada, talvez pudéssemos, assim como Pedro, dar a ela uma nova roupagem “Para que a caridade não seja apenas ‘compaixão’ distante, ou ‘benevolência’ intermitente ou transitória, deve ser solidariedade política”.

Cuidar da terra e da criação. “Afagar a terra, conhecer os desejos da terra, tirar da terra a doçura do mel”. (Milton Nascimento) Ano propicio para repensarmos a nossa maneira de habitar a Terra e de conviver com os outros, com quem a partilhamos o mesmo espaço. Como os indígenas nos dizem, “nós não cuidamos da terra. É ela que cuida de nós, pois ela está dentro de nós e nos sustentam todos os dias”.

O ano de 2020 nos mostrou toda a nossa limitação. Não somos a fortaleza que imaginávamos que seriamos. Este ensinamento nos servirá para melhorar as nossas relações sob uma nova perspectiva. A noite escura que estamos ainda passando nos serve de alerta e lição, para que possamos abraçar as causas mais nobres. Nunca nos esqueçamos de que são nas noites mais escuras que temos a oportunidade de enxergar as estrelas. E como os magos do Oriente, depois de visitarem o menino, “Retornaram para a sua terra, seguindo outro caminho. (Mt 2, 12) Ora de buscarmos também nós novos caminhos, que nos aproximam mais uns dos outros. Cuidar de nós. Cuidar do outro e cuidar também da Casa Comum. Só cuida bem do outro quem sabe cuidar bem de si mesmo. Esta é também a mesma perspectiva trazida por Jesus de Nazaré: “Ame ao seu próximo como a si mesmo”.(Mt 22, 39b) Cuidar de mim é cuidar do outro. Cuidar do outro é cuidar de mim, num espírito de fraternidade e não de opressão ou de submissão.