Jesus e o Reino de Deus

Iniciando aqui mais uma semana. Uma segundona (11) preguiçosa pela frente. Hoje estou saindo do castigo que o senhor facebook me colocou, calando-me por uma semana. Tudo porque, segundo a análise deles, eu estava fazendo propagação de nudez infantil, por causa de uma das fotos que postei de uma das aldeias do Povo Xavante. Paciência!

Ao longo desta quarentena, tenho aproveitado o espaço das redes digitais, para provocar a reflexão nas pessoas. Apenas uma singela contribuição, através de textos nada muito elaborados, sobre algumas temáticas relacionadas ao contexto atual, no intuito de provocar o posicionamento como cristãos, seguidores de Jesus, em meio a uma pandemia de proporções assustadoras. Durante a semana que passou, deixei de postar estes rabiscos, cumprindo assim a determinação do todo poderoso Facebook. Mesmo assim, contando com a ajuda de amigos/as, conseguimos ainda compartilhar alguns destes escritos.

Escrevo hoje movido pela surpresa desagradável, ao ter assistido um vídeo, onde um padre jovem, numa das celebrações de uma destas emissoras televisivas de longo alcance, desfiando um rosário de lágrimas contra a vacina que está chegando até nós. Depois de uma homilia acalorada sobre os maléficos da vacina, uma ruidosa salva de palmas deu lugar à fala do referido padre. Atitude minimamente irresponsável deste sacerdote, posto que não temos a exata dimensão do que isso representa para as centenas de milhares de pessoas que estarão assistindo tal celebração. Penso que alguém deveria fazer o controle de ato tão irresponsável como este.

Tristeza e decepção a parte, quero falar hoje acerca de Jesus e o Reino de Deus que ELE veio nos anunciar. Depois do seu batismo e da morte de João Batista, ELE dá inicio ao seu ministério, indo exatamente para a Galileia (Mc 1, 14). Era ali que estavam os destinatários do Reino de Deus. Terra dos pagãos, a Galileia era tida como a morada da ralé. “Pode vir alguma coisa boa de Nazaré” (Jo 1, 46) Ou seja, Jesus volta para a sua realidade e começa ali o anúncio do Reino para àqueles que ninguém dava nada por eles, muito menos a classe dominante de Israel.

Segundo o historiador judaico-romano Flavio Josefo (37 d.C), os galileus eram pessoas trabalhadoras, ousadas, corajosas, impulsivas e fáceis de indignar-se frente à opressão em que viviam. É com a para esta gente que Jesus dá predileção especial, começando aí no meio delas a sua missão de trazer-lhes o Reino de Justiça, Fraternidade, Compaixão e de Paz. Estas pessoas abraçam o projeto anunciado por Jesus.

Jesus que anuncia o Reino de Deus. Ao contrário do que muitos possam pensar, Jesus não vem anunciar a Igreja, mas o Reino de Deus. São duas coisas diferentes. “Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça”. (Mt 6, 33) Reino que é a promoção de novas relações de partilha, de igualdade de fraternidade. E, para o alcance destas coisas, necessário que se haja a Justiça, como fruto natural das novas relações entre as pessoas. A Igreja surge como interpretação desta vontade de Jesus de que o Reino começasse o quanto antes. “O Reino de Deus está próximo. Convertei-vos e crede no Evangelho!” (Mc 1, 15)

Reino de Deus e Igreja caminham lado a lado. A primazia está no Reino, claro. Mesmo que tenhamos ouvido a exaustão a frase “Fora da Igreja não há salvação”. Esta é uma máxima que muitos de nós conhecemos, ao longo da nossa caminhada de Igreja. Esta expressão já é antiga. Ela aparece nos escritos de São Cipriano de Cartago († 258), na obra Sobre a unidade da Igreja (n. 6 e 14), e nas Cartas 141,5; 185,42 e 50, de Santo Agostinho de Hipona († 430). Todavia, a Igreja fez sua essa afirmação, de modo especial nos Concílios de Latrão IV (1215), Florença (1438-45) e Vaticano II (1962-65).

Nos tempos de seminário, tínhamos uma forma de brincar com esta expressão. Quando nos dizia que “fora da Igreja não há salvação”, nós contrapúnhamos com outra frase: “Há salvação, apesar da Igreja”. Brincadeiras a parte, o que mais nos interessa é que somos desafiados a viver o Reino de Deus entre nós. Neste sentido, cabe-nos discernir que o mais importante não é ter uma igreja para frequentar, mas ser Igreja onde quer que a pessoa possa estar. Este é também o desafio que nos é proposto pelo Papa Francisco, com a sua “Igreja em Saída”. Para Francisco, a transmissão da fé não se resume a uma difusão de doutrinas, mas no testemunho da fé em Jesus Cristo, principalmente entre os mais pobres e fragilizados da sociedade. Não uma Igreja fechada em si mesma ou em grupos de elite, mas para ir ao encontro dos mais carentes e necessitados. Nas galileias nossas dos dias de hoje.