Hoje (02), comecei o meu dia de forma muito triste. Estou triste e meu coração está em frangalhos. Primeiro porque uma pessoa de nossa comunidade teve que sair às pressas, em busca de uma vaga em UTI. Felizmente achou e está intubada, correndo risco de morte. Ela que ficou este tempo todo se cuidando, cumprindo o protocolo do distanciamento social, de nada adiantou. Foi apresentada ao vírus pela sua neta, que não teve os mesmos cuidados. Agora arrependida, disse que não sabia que com as suas atitudes, colocava em risco a vida da própria avó. Só ela que não sabia disso.
O dia primeiro de fevereiro é um daqueles dias que não pode ser esquecido jamais. Este dia passará para a história, como uma das páginas mais obscuras de nossa vida republicana. Tudo porque, vimos acontecer um verdadeiro balcão de negócios no parlamento brasileiro. Parlamentares sendo comprados a peso de outro, para votar num determinado candidato, que manterá acesa a chama de tudo aquilo que não presta no cenário político. Os historiadores terão trabalho para registrar este obscurantismo e não deixar que se perca de nossa memória. Parafraseando o escritor irlandês Edmund Burke (1729 – 1797) “Um povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la”.
Um dia para não nos esquecermos de forma alguma. Neste dia, o nosso parlamento deu uma mostra de que estamos mal representados. Aqueles que deveriam ser os dignos representantes de nossos interesses e da nação brasileira, são os primeiros a participar de negociatas para manterem ainda mais os seus apaniguados privilégios. Que falta nos faz um Teotônio Vilela, um Darcy Ribeiro e um Leonel Brizola, para ficarmos nestes parlamentares que honraram o parlamento com atuações dignas de respeito.
A pandemia do novo coronavirus, de longe, não é o nosso maior problema. É claro que estamos preocupados com ela. Entretanto, o nosso maior dilema é ser (des)governado por pessoas que não possuem o mínimo de respeito pela vida humana. Além de orquestrarem uma política necrófila, ainda zombam da situação, com os seus sorrisos amarelos sínicos e sarcásticos, promovendo toda forma de aglomeração, contrariando todas as recomendações da gente séria. Já não suportamos mais tamanha irresponsabilidade. Estamos desgovernados, descendo ladeira abaixo.
Como se não bastasse tudo isso, uma horda de admiradores nada secretos continua divinizando este personagem tosco da política brasileira, nas suas costumeiras aparições públicas. Faz-nos lembrar de uma das frases ditas pelo romancista britânico Henry Graham Greene: “A ingenuidade é uma forma de insanidade”. Será mesmo ingenuidade ou o grau de alienação que é gigantesco? Fico ainda com esta dúvida. Pessoas que apostam na máxima do quanto pior, melhor. Só pode ser.
Diante desta situação pitoresca, me vem à mente a metáfora da Águia e a galinha que nos é apresentada pelo teólogo Leonardo Boff. Nesta sua narrativa, ele nos apresenta a história de uma águia que foi criada como galinha nos fundos de um determinado quintal. O tempo todo se recusando a ser a imponente águia, com todas as suas características peculiares. Por mais que alguém dissesse a ela que ela não era uma galinha, mesmo assim ela insistia em querer se comportar como uma simples galinha. Até que um dia, um alpinista perdeu completamente a paciência, jogou aquela águia num saco e subiu montanha acima. Atirou a águia no precipício. A se ver em apuros, ela descobre a águia que havia dentro de si e percebe toda a limitação que o curral, quer dizer, galinheiro lhe impunha.
Será que esta mesma fábula não pode ser também aplicada ao contexto que hora estamos vivendo? Pessoas que poderiam ser belas águias, incorporando em si o espírito de galinha e se comportando com tal? As pessoas precisam acordar do seu sono letárgico. Não é possível ser tão alienado desta forma, que não conseguem enxergar um palmo a frente de seus narizes. Não é possível ser tão alienado assim. Tem razão o grande geógrafo brasileiro Milton Santos quando afirma: “A força da alienação vem dessa fragilidade dos indivíduos, quando apenas conseguem identificar o que os separa e não o que os une” Fica a dica.
Precisamos jogar luz nesta escuridão em que muitos alienados vivem. Ainda bem que para nós cristãos, Jesus é a grande luz. Precisamos desta luz para iluminar as nossas trevas, sobretudo a da ignorância, da estupidez e da cegueira: “Luz para iluminar as nações e glória do teu povo Israel”. (Lc 2, 32) Lembrando que o casal Simeão e Ana, de que fala o evangelho de hoje, representam todos os pobres que esperam pela libertação. Jesus que é para nós não apenas a luz que iluminará toda a nossa vida, mas será também sinal de contradição, isto é, julgamento para os ricos e poderosos, e libertação para os pobres e oprimidos. Que venha a luz para nos iluminar e dar forças para continuarmos acreditando que iremos vencer as forças das trevas do mal!