Quarta feira da segunda semana da páscoa. Já estamos em meados de abril. Mês que dedicamos, em especial, aos povos indígenas, aos povos originários. O Conselho Indigenista Missionário (CIMI), que há anos vem defendendo os interesses dos povos indígenas, escolheu como tema para a Semana dos Povos Indígenas deste ano de 2021 “Povos Originários lutando pela Paz, Justiça e Bem Viver”. Não poderia ter escolhido temática melhor, sobretudo nestes tempos em que ora estamos vivendo e em sintonia com a Campanha da Fraternidade também deste ano.
Assim como os Povos Originários, o CIMI tem enfrentado dias difíceis em seu trabalho ao lado destes povos. Não somente por parte do governo central, mas também dos interesses escusos que se escondem por detrás de madeireiros, garimpeiros, pecuaristas e do “Agro-veneno”, que na sua avidez e ganância, querem “passar boiada” sobre os territórios ancestrais dos Povos indígenas. É uma campanha sórdida de ódio e mentiras deslavadas, difamando todo o trabalho deste órgão diretamente vinculado À CNBB. Que me perdoe o cantor e compositor paraibano Zé Ramalho, mas o gado novo não é nada admirável. Pelo contrário, insiste em ser massa de manobra da política de morte.
“Índio tem muita terra”, é o que se vê falar a boca pequena dos poderosos do país, de olho nas terras indígenas. Ganância tem nome e sobrenome. Esta também é a narrativa do senso comum entre nós, posto que se perpetua entre nós uma herança colonial perversa, legado que nos foi deixado pelo colonizador que por aqui passou. Além de ter muita terra, não gosta de trabalhar, é fedido como um bicho do mato. De saber que são eles os verdadeiros guardiões do pouco que ainda nos resta de floresta em pé. O que mais desejam é permanecerem sossegados no seu canto, mantendo esta sintonia fina com a sua mãe terra.
A Terra é a sua mãe. Mãe Terra! Pacha Mama, que do Quíchua, Pacha quer dizer “universo”, “mundo”, “tempo”, “lugar”, e Mama, “mãe”, “Mãe Terra!”. É como se fosse mesmo uma divindade máxima, que tem uma correlação estreita com a fertilidade de uma mãe, cujo lado feminino, com o seu útero, gera a vida. Desta forma, eles mantêm com a terra uma relação de sintonia simbiótica respeitosa, pois dela sobrevêm tudo do que necessitam. Para eles, a floresta só possui valor se permanecer de pé. Bem ao contrário do desejo e dos olhares gananciosos. que vêem a terra apenas como um bem de capital a ser explorado ao máximo.
Sabemos bem pouco acerca dos Povos Originários. Mesmo o pouco que conhecemos passa por esta herança colonial, que incide sobre a narrativa do senso comum. Nas escolas então, quando chega o mês de abril, elas tratam de pintar o rosto das crianças, que ficam emitindo sons desconexos, mostrando um jeito caricato de falar acerca dos povos indígenas. Um Horror! Perde assim a grande chance de convidar uma das lideranças indígenas, pajé, parteira, ancião, para que eles mesmos falem sobre as suas vidas, seus anseios e expectativas diante do atual contexto que estão vivendo.
“Povos Originários lutando pela Paz, Justiça e Bem Viver”. O Bem viver sempre foi o seu principal objetivo, nesta terra chamada Brasil. Um Brasil que lhe virou as costas e os tratam como “selvagens”. Este tem sido o desafio enfrentado pelos Povos indígenas em meio a uma pandemia que devastou as populações indígenas. Várias lideranças perderam suas vidas na luta contra este vírus letal. Vidas perdidas como as do cacique Aritana yawalapiti, Tabata Kuikuro, habitantes do Parque Nacional do Xingu e Issarire Lukukui Karajá, da Ilha do Bananal, são apenas algumas destas lideranças que deixaram os seus parentes de luto.
Os indígenas são unânimes em afirmar que houve no meio dos povos originários um verdadeiro genocídio. Mesmo vacinados, eles ainda encontram-se assustados. Alguns deles se recusaram em tomar a vacina. Isto depois de serem orientados por algumas lideranças religiosas das igrejas evangélicas que tem presença nas aldeias. Não foi o caso, por exemplo, dos indígenas de Marãiwatsédé. Ali a vacinação atingiu o índice de 80% de vacinados. Estrategicamente eles assim raciocinam: “vamos tomar a vacina porque esta doença é de vocês, mas nós vamos também tomar o remédio do pajé, vamos usar a máscara e não vamos para a cidade e nem vamos deixar nenhuma wahadzu (branco – não indígena) entrar na aldeia, a não ser os profissionais da equipe multidisciplinar de saúde”.