Quarta feira da quarta semana da páscoa. Jesus, o crucificado, ressuscitou no Cristo e vive no meio dos seus. A última palavra de Deus é vida e não morte. Ele venceu a morte e está vivo em cada um de nós, que acredita e faz o seu seguimento pelos caminhos da história humana. Com Jesus, somos eternos caminhantes, ate o dia em que descansaremos nos braços do Pai, afinal foi Ele mesmo que nos garantiu: “Existem muitas moradas na casa de meu Pai. Se não fosse assim, eu lhes teria dito, porque vou preparar um lugar para vocês”. (Jo 14, 2).
“Vem caminheiro, o caminho é caminhar”, já dizia um dos versos que cantamos em uma de nossas canções do Cancioneiro Popular. Conosco vai também ela, Maria mãe dos caminhantes. Ela que sempre soube ser fiel ao Projeto de Deus, colocando-se à disposição no seguimento também de seu Filho. Maria a Senhora de todas as horas. Sempre tive uma relação muito estreita com esta companheira. Nos meus mais variados desafios, ela sempre se fez presente, ajudando-me a ser fiel na caminhada, sem trair as causas de seu Filho. Neste sentido, o bispo Pedro muito me ajudou a conhecer um pouco mais a história de vida e luta desta mulher. A “comadre de Nazaré”, como ele costumava dizer, nunca teve uma atitude ingênua, apática e passiva na sua ação de mulher, pelos caminhos por onde andou. Ao contrário, sua prática sempre foi libertadora, como a de Jesus de Nazaré.
“Maria, mãe dos caminhantes, ensina-nos a caminhar”. Precisamos aprender com esta mulher a ter a coragem de lutar. Infelizmente, alguns representantes da Igreja Católica, passaram uma imagem distorcida de Maria, colocando-a como alguém que aceitou passivamente a contribuir com o Projeto de Deus. Numa sociedade machista, onde predominava o patriarcado, ela levanta a sua voz e se faz ouvir, denunciando todas as formas de opressão, sobretudo das mulheres, que eram subjugadas, domesticadas e não possuíam valor algum. Somente alguém empoderada como ela poderia recitar palavras tão proféticas dentro do contexto de época: “Derruba do trono os poderosos e eleva os humildes; aos famintos enche de bens, e despede os ricos de mãos vazias”. (Lc 1, 52-53) Maria fez de si o lugar de fala das mulheres de seu tempo. https://www.youtube.com/watch?v=KPJvb09VOVM
Maria é o sinal de esperançamento para nós nos dias de hoje. Apesar de toda dor e sofrimento, com tantas mortes acontecendo, olhamos para ela e vemos que a luta continua. Há luto, mas também há luta. Seguimos em frente, acreditando que Deus é o Senhor da História. Um Deus presente em nossa caminhada, como no sinal de esperançamento vindo do jovem estudante, de família humilde de Pernambuco, Davi Eduardo Ferreira de Brito, de 20 anos, que estudava com livros achados no lixo, não tinha internet em casa, mas mesmo assim, foi aprovado para um dos cursos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Em meio aos sinais de esperançamento, há também sinais de horror entre nós. Não há de ver que um desqualificado senhor, fez esta semana uma fala pra lá de infeliz. Diz ele: “Longevidade é ruim para os cofres: “Querem viver 100 anos… “não há capacidade de investimento para que o Estado consiga acompanhar a busca por atendimento médico”. Como se saúde não fosse um direito do cidadão e dever do Estado. Como se o Estado estivesse fazendo um favor aos cidadãos. Como se o Brasil não fosse um dos países do mundo, que mais se paga imposto. Para este senhor, bem que poderíamos dizer: “Os maus políticos são ruins aos cofres públicos. É muito dinheiro gasto com quem nada tem a ver com a vida do povo, sobretudo dos mais vulneráveis”.
Mas sigamos com os nossos sinais de esperançamento, como a Carta Pastoral da Prelazia de São Félix do Araguaia, que este ano está completando 50 anos. “Uma Igreja da Amazônia em conflito com o latifúndio e a marginalização social”. No dia 10 de outubro de 1971, Pedro teve a coragem de escrever um documento profético, no inicio de sua caminhada à frente desta Igreja. O clima era hostil, de bastante perseguição aos que pensavam diferente do governo militar. Pedro coloca o dedo na ferida, sem nenhum temor. Ao seu estilo, foi a primeira vez que se falou abertamente as palavras: “latifúndio”, “trabalho escravo”, “pistolagem”, e sobretudo, na opressão dos mais fracos, dos pobres, dos indígenas. Um documento que teve uma grande repercussão, tanto dentro da Igreja quanto nos meios militares. Quase que Pedro foi expulso do país, não fosse a fala do Papa Paulo VI: “Se mexerem com o bispo estão mexendo com a Igreja de Roma”. Que venham outros 50 anos, para continuarmos semeando sinais de esperançamento nesta nossa Igreja. Um convite à leitura.