A virtude da paciência

Sexta feira da quinta semana da páscoa. Acordei hoje bem mais cedo que os demais dias. Acompanhei de perto mais um amanhecer no Araguaia, vendo a aurora ceder lugar ao dia que veio chegando mansamente, desbravando as trevas, prenunciando mais um dia de vida como dádiva do Criador. Vendo este descortinar do horizonte, veio-me, inevitavelmente, à mente um dos versículos do Evangelho de Mateus: “Deus faz o sol nascer sobre maus e bons, e a chuva cair sobre justos e injustos”. (Mt 5,45) Ou seja, independente de quem somos nós, lá está o dia para que tenhamos uma nova chance de recomeçar, e fazer diferente, muito embora muitos de nós não pensam desta forma e seguem a sua rotina mecanicamente. Como nos diria Albert Einstein: “Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes”.

A vida não pára! Seguimos na nossa caminhada rumo ao encontro definitivo com o Pai. Não sabemos nem o dia e nem a hora deste encontro, muito embora, alguns dos nossos, anteciparam este dia, e fizeram a sua páscoa prematuramente. Com mais perguntas que respostas em minha cabeça, fiz da minha oração desta manhã, uma tentativa de encontrar respostas para algumas destas perguntas. Por esta razão, não quis meditar sobre os textos da liturgia do dia. Invoquei a presença do cantor e compositor Lenine para me fazer companhia com a sua canção: “Paciência”.

“Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma. Até quando o corpo pede um pouco mais de alma. A vida não para”. Não pára mesmo! Ela não pára, para que possamos fazer os reajustes que temos que fazer. Ela segue e nós precisamos ir encontrando o fio da meada, para que possamos dar conta de fazer a nossa história acontecer. Seria a mesma coisa que trocar o pneu furado do carro com ele em movimento. Lenine sugere que precisamos ter paciência. De fato, precisamos urgentemente exercitar a paciência.

A paciência é uma das virtudes que cultivamos ou não em nós. Não se adquire a paciência da noite para o dia, como num passe de mágica, mas requer um exercício diário de cada um de nós. Significa educar-se para adquirir o autodomínio, quando não se pode controlar as situações que vivenciamos, sobretudo quando as coisas não saem como gostaríamos. É por este motivo que a paciência e a tolerância são duas irmãs gêmeas, que podem conviver diariamente no nosso interior, frente às dificuldades pelas quais passamos.

Geralmente, a pessoa paciente tem uma facilidade a mais de desenvolver a habilidade de ver com mais clareza a origem dos problemas e, desta forma, encontrar maneiras adequadas para solucioná-los, ainda que a possível solução só venha com o passar do tempo. Paciente é aquela pessoa que sabe encarar a vida de maneira positiva, otimista, tranquila, buscando sempre certo equilíbrio. Poderíamos dizer, grosso modo, que a paciência é a característica fundante de uma personalidade madura. Talvez por este motivo que Santo Agostinho se referiu a paciência afirmando que: “Não há lugar para a sabedoria onde não há paciência”.

Sabedoria que sobrava em Agostinho. Sabedoria que precisamos apropriar dela para fazermos o discernimento inequívoco entre o sagrado e o profano. Entre o sagrado e o profano está a pergunta que frequentemente precisamos nos fazer: Quem é Deus para nós? Esta foi uma das conversas que tive com Pedro, curioso que eu estava para saber, como aquele místico, poeta, profeta, via e se relacionava com Deus. Confesso que não me satisfiz com a resposta que inicialmente ele me foi dada: “Deus é o Pai d’Ele e nosso”, me disse apontando para o sacrário da capela que fica nos fundos de sua casa. Posteriormente, lendo um de seus escritos, deparei com um de seus poemas (Equívocos) que me deu uma resposta mais satisfatória. Onde tu dizes lei, Eu digo Deus. Onde tu dizes paz, justiça, amor, Eu digo Deus! Onde tu dizes Deus, Eu digo liberdade, Justiça, Amor!

O sagrado e o profano convivem diuturnamente em nossa realidade. Quantos de nós não nos fazemos esta pergunta? Ainda mais num contexto em que o nome de Deus está sendo manipulado. Invocam o nome d’Ele, para os momentos mais díspares possíveis. Ao ponto de chegarmos a percepção de que não estamos falando do mesmo Deus. O Deus, por exemplo, que ouviu o clamor do povo escravo no Egito. O mesmo Deus do profeta Jeremias “Antes de formar você no ventre de sua mãe, eu o conheci; antes que você fosse dado à luz, eu o consagrei, para fazer de você profeta das nações.” (Jer 1, 5) O mesmo Deus revelado por Jesus de Nazaré. O Deus da páscoa que nos trouxe o Cristo vivo, presente no meio de nós, sendo páscoa na nossa páscoa.