23º domingo do tempo comum. O primeiro deles do mês de setembro. Mês especial em que ficamos aguardando a chegada de mais uma primavera, para ver acontecer a metamorfose espetacular da mãe natureza, ainda que, sistematicamente agredida, faz renascer para nós a experiência da vida. Como o cantor e compositor mineiro Milton Nascimento, precisamos continuar sonhando o sonho acordado: ”Mas renova-se a esperança. Nova aurora a cada dia. E há que se cuidar do broto. Pra que a vida nos dê flor e fruto”.
Madruguei neste domingo. Gosto de rezar, vendo a madrugada se transformando em dia. Nem deu para contemplar a beleza que se descortina com o alvorecer, dada a massa cinzenta que nos envolve nestes dias. Já são mais de três dias em que o fogo tem o predomínio das ações por aqui. O ar denso e irrespirável, se completa com as nuvens que se formam sobre o céu, dando a impressão, para aqueles que não conhecem, de que as chuvas estão próximas. Com tanto fogo lá fora e eu sem poder esquentar a minha água para desfrutar do chimarrão. Não é que o gás acabou? Não fosse o meu vizinho, rezaria sem a presença de minha cuia de todos os dias.
O fogo assusta e espanta! Nenhum de meus nobres visitantes de todas manhãs se fez presente, para comigo rezar. Apenas um corajoso camaleão, fez questão de marcar a sua presença por aqui. Tive que fazer um acordo de cavalheiros com aquele enorme rabudo, para que não continuasse a comer os brotos, ainda jovens, das mandiocas que plantei. A contragosto seu, entre golpes de seu longo rabo, fui obrigado conduzi-lo para a mata que se estende para além dos fundos de meu quintal. Isso para a ira de minhas cachorras, que insistiam em que eu as deixasse, a sua maneira, escorraçar aquele inocente multicor visitante.
Neste domingo, 5 de setembro, comemoramos o “Dia da Amazônia”. Mesmo sendo este um dia especial, o homem, na sua cobiça insaciável, encontra um jeito sui generis de comemorar o dia do maior pulmão da humanidade, colocando fogo em tudo. Esta data vem sendo comemorada desde 2008, quando foi instituída pela lei federal 11.621/2007, cujo objetivo é o de sensibilizar as pessoas sobre a importância de se trabalhar na preservação da maior reserva natural do planeta. A Amazônia é um dos biomas fundamentais para o equilíbrio ambiental e climático de todo o mundo. Ela é a nossa “Casa Comum”, que nos permite as abençoadas chuvas, inclusive para as cidades mais distantes, como São Paulo, por exemplo.
Cuidar da Casa Comum, é cuidar da vida de todo o planeta. Cuidar do planeta é cuidar de cada um de nós. Tarefa esta que não cabe somente aos que aqui moramos. Todos e todas, temos a missão de lutar pela preservação desta Casa Comum, onde quer que estejamos. Ou nos envolvemos todos e tenhamos a vida, ou todos nos sucumbiremos juntos no abismo da destruição. O tempo é agora, pois o amanhã nos reserva tragicidade. Segundo estudos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), no mês de agosto que se foi, a Amazônia registrou 28.060 focos de calor (incêndios), o terceiro maior índice para o mês desde 2010, perdendo apenas para 2019 e 2020. Nossa floresta está sendo consumida vorazmente. Acordemos em tempo ou nos renderemos a uma das frases atribuídas ao padre e escritor francês François Rabelais (1494-1553): “Conheço muitos que não puderam, quando deviam, porque não quiseram quando podiam.”
No texto do evangelho deste domingo (Mc 7,31-37) vimos as pessoas à volta de Jesus entusiasmadas com as suas ações afirmativas no meio delas: “Jesus faz bem todas as coisas…” (Mc 7, 37) Jesus que se ocupa em anunciar a chegada do Reino de Deus entre os pobres. Entretanto, o “fazer” está no horizonte concreto do projeto messiânico de Jesus. Ele não somente “anuncia”, mas faz acontecer a nova perspectiva de vida. Aos que desejamos estar com Ele, precisamos também, nos revestirmos desta mesma dinâmica. Muitos de nós contentam apenas em anunciar (pregar) para os outros, esquecendo de que a “pregação” primeira é para nós mesmos. Somente depois de nos convencermos de que precisamos viver aquilo que pregamos, é que podemos cobrar dos demais. Como Jesus, “fazer bem todas as coisas” e não nos contentarmos apenas com o mínimo necessário, como aqueles que costumam dizer: “eu não faço mal a ninguém”. Resta então lhes perguntar: E o bem, será que fazem?
Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.