Sexta feira da primeira semana do tempo comum. O ano começa como terminou o anterior. Nossas vidas ainda sendo ditadas pelas regras da pandemia. Muitas pessoas infectadas pela nova variante Ômicron. Agora sem as testagens, uma vez que não disponibilizamos mais do “kit teste”. Todavia, muitas pessoas seguem sem se protegerem com as máscaras, colocando em risco suas vidas e a das demais pessoas, numa clara demonstração de falta de amor próprio e amor ao outro. Quem ama se cuida e cuida também do outro, esta é uma das máximas cristãs. Usar máscara é um ato de amor a vida!
Rezei nesta manhã tendo o Araguaia como minha maior inspiração. Quis acompanhar o nascer do dia à beira dele. O sol despontando na Ilha do Bananal, banhando de raios dourados as águas do Araguaia, refletindo nelas a esplendorosa imagem de quem tudo isso criou. Rezar neste contexto é acreditar que Deus ainda aposta em cada um de nós, para fazer acontecer o seu projeto salvador, pois o espetáculo de cada manhã é um convite à contemplação de toda a criação. Finalizei este momento especial com o refrão do salmo de hoje: “Ó Senhor, eu cantarei eternamente o vosso amor!”
Fiz uma visita rápida pelo túmulo do profeta do Araguaia. Ali encontrei uma linda flor, certamente trazida por alguma de suas admiradoras. Fazia dias que ali estava, mas mantinha uma vivacidade presente em si. Lembrei-me de uma amiga professora do interior, que todos os dias, recebia flores de seus alunos. Curiosa, quis saber de onde as crianças traziam todas aquelas flores. Descobriu que, antes de chegar à escola, elas passavam pelo cemitério e recolhiam dali as flores para a professora. Com muito carinho, minha amiga pediu que elas não retirassem dali as flores, pois elas significavam o carinho de quem às deixou ali para com os seus entes queridos.
A liturgia de hoje possibilita o nosso encontro pessoal com Jesus em Cafarnaum (Mc 2,1-12). Estando em sua casa, uma numerosa multidão se faz presente com ele. Em meio a àquele tumulto todo, é trazido a Jesus um homem paralitico, para que Jesus o curasse. Diante daquele contexto, Jesus simplesmente lhe diz: “Filho, os teus pecados estão perdoados”. (Mc 2, 5) Tudo para afrontar os escribas e doutores da lei, (as autoridades) que interpretavam as doenças como a paralisia, causada pelo pecado daquelas pessoas. Ou seja, estas autoridades se preocupavam mais com as teorias religiosas e não com a possibilidade de transformação da vida daquelas pessoas.
Jesus fala e faz acontecer a palavra. A fala acompanhada da ação. A palavra não se perde no vazio, mas se completa na ação que transforma. Jesus não se contenta apenas em perdoar o pecado daquela pessoa doente, mas a liberta do mal que a impedia de ser quem ela era: “O que é mais fácil: dizer ao paralítico: ‘Os teus pecados estão perdoados’, ou dizer: ‘Levanta-te, pega a tua cama e anda’?” (Mc 2, 9) A palavra que é revestida da amorosidade. Antes do falar, Jesus se reveste de toda a ternura de Deus e se faz humano com aquele ser humano impossibilitado de viver a sua dignidade humana. A ação de Jesus é completa. É um falar e fazer que promove a cura por dentro e por fora, fazendo o homem reconquistar a sua capacidade de caminhar por si mesmo. Ação libertadora total.
Perdoar, falar e fazer! Este é também o desafio que nos é proposto como seguidores deste mesmo Jesus. Não somente levar o perdão, mas ser perdão em pessoa. Ser pessoas de perdão. Não somente levar a palavra, mas ser agentes transformadores pela palavra. Ser e fazer pela nossa ação que transforma. Perdoar é um gesto de profundo amor. Nem sempre muito fácil. É um exercício que vamos aprendendo a dominar. Exige de cada um nós, um esforço pessoal, que cada um precisa estar ciente de que há uma caminhada a ser feita. Apesar de o perdão estar ligado a alguém fora de nós, também há aquela situação da pessoa, que não consegue perdoar a si mesma. Se não sou capaz de perdoar a mim mesmo, como serei capaz de perdoar o outro? Trata-se, portanto, de algo que precisamos ir amadurecendo dentro de nós.
O perdão liberta e salva. Ele cria oportunidades e faz reviver. Funciona como um ato pedagógico, pois está ligado ao falar e ao fazer. Na comunidade dos seguidores de Jesus não existem limites para o perdão (Mt 18,21-22). Perdoar sempre! Como diria o pastor batista e ativista político estadunidense Martin Luther King (1929-1968): “O perdão é um catalisador que cria a ambiência necessária para uma nova partida, para um reinício”. Foi o que fez o paralítico do contexto de hoje: “Se levantou e, carregando a sua cama, saiu diante de todos”. E ficaram todos admirados e louvavam a Deus, dizendo: Nunca vimos uma coisa assim”. (Mc 2, 12) Perdoar, falar e fazer, tudo junto e misturado.
Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.