Terça feira de uma manha atípica para o mês de fevereiro aqui por estas bandas. Depois das chuvas torrenciais que caíram pela noite afora, o dia amanheceu bem friozinho. Chuva com direito a todos os ingredientes: raios, trovoadas e ventos. São Pedro matou a sua vontade de nos lavar a todos. Depois de um dia terrivelmente quente, as águas desceram do céu em formato de vendaval. Fosse uma cidade propensa à alagamentos, São Félix teria amanhecido debaixo d’água. O Araguaia é que agradece, pois toda essa água se dirige a ele, que segue imponente e transbordante de felicidade. Sobrando peixe.
Uma terça feira especial para a História da Igreja. Celebramos hoje a Festa da Cátedra de São Pedro apóstolo. O pescador que recebe das mãos de Jesus, o indicativo de ser o primogênito desta caminhada de Igreja. Nada mas significativo, um homem simples, um reles pescador do meio do povão, tendo a incumbência de iniciar todo um processo de fazer acontecer no mundo, o sonho de Deus sonhado por Jesus: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja” (Mt 16, 18) Jesus delegando poder a um pobre homem para também nos dizer que a Igreja não se institui a partir dos grandes palácios, mas na estrada itinerante de quem se poe a caminho com Ele.
Uma festa que remonta ao século IV da era cristã, celebrada como forma de manter o sinal de unidade de toda a Igreja na pessoa do apóstolo Pedro que se transforma em rocha viva. Celebrar esta festa é manter a sintonia com o Papa Francisco, como membro desta mesma caminhada, que iniciou nos primórdios do cristianismo. Tal sintonia está prevista num dos documentos centrais de referência da Igreja Católica: “Em virtude de seu múnus de Vigário de Cristo e de Pastor de toda a Igreja, possui na Igreja poder pleno, supremo e universal (…) Porém, o múnus de ligar e desligar, que foi dado a Pedro, consta que também foi dado ao colégio dos Apóstolos, unido a seu chefe” (Catecismo da Igreja Católica, 552, 881 e 882).
Uma festa que nos leva a refletir profundamente, sobre os caminhos da Igreja nos dias de hoje, tendo como aporte o legado de Jesus de Nazaré, que foi repassado aos seus seguidores e seguidoras. A cadeira da qual faz referência a festa, não se trata de uma cadeira de poder, onde se assenta uma majestade, uma realeza triunfal. Trata-se antes da cadeira do poder, como princípio ativo do serviço. Sentar-se sobre ela é estar disponível para sair de si mesmo e dar-se por inteiro, em forma de caminhada com os pequenos, no mesmo formato de Jesus, que assim definia o seu serviço: “Somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer”. (Lc 17,10)
Realidade muito distante do que os nossos olhos observam nos modelos de Igreja que temos entre nós na atualidade. Para início de conversa, vemos frequentemente alguns epíscopos, se comportarem como verdadeiras majestades, prontas para serem servidas pelos seus “criados”. Situação não muito diferente de alguns presbíteros, que se vêem como verdadeiras vedetes do cenário teatral, se portando como os autênticos “donos das comunidades”, das igreja as quais estão à frente no seu apostolado. Tais situações remontam ao período medieval que a Igreja, influenciada pelo pensamento e comportamento da época, transformou a Igreja em espaços de celebres personagens da ostentação do poder, das vestimentas vultosas, distantes da proposta originária de Jesus de Nazaré. Uma Igreja que entrou pela Idade Média e não mas dela saiu.
Bem fez o nosso bispo Pedro, que transformou o seu “palácio” e a sua “cadeira episcopal”, num centro de refúgio dos pequenos: posseiros, indígenas, “passantes”, ribeirinhos… Sua casa como ponto de chegada. Quem chegava, era plenamente acolhido e comia do que se tinha. Sua pessoa mesma, era o centro de acolhida e do cuidado. Sempre fora assim. A cátedra de nosso Pedro era a cadeira dos pobres. Com eles e para eles, Pedro se fazia o servidor de todos. O Papa Francisco tem se desdobrado, no sentido de trazer a Igreja para mais perto dos anseios de Jesus para com os pequenos. Nem sempre tem logrado êxito. O que se vê são ataques frontais à sua pessoa e ao seu pontificado, alcunhando-o de “o Papa do fim dos tempos”, “o anticristo”.
Fazemos parte da Igreja instituída por Jesus na pessoa de Pedro. Ele que é constituído como o “Servus Servorum Dei” (Servo dos Servos de Deus), termo que é utilizado para referir-se aos papas, no exercício de seus respectivos pontificado. Somos todos Igreja, cujo fundamento inicial é a pessoa de um simples pescador. Não somos seguidores de um Messias triunfalista, ou de uma majestade encastelada num suntuoso palácio. Somos Igreja pé no chão da estrada dos pequenos. “A Igreja não é aquele grupinho que está perto do padre e manda em todos, não. A Igreja somos todos, todos”. (Papa Francisco) Que a nossa cadeira seja a sarjeta do pobre sem teto, sem trabalho, sem ganho, sem saúde e de pratos vazios à espera de comida.
Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.