A família do discipulado

Terça feira da Trigésima Terceira Semana do Tempo Comum. O Período Litúrgico é Comum, mas o dia de hoje é especial. Celebramos a Festa da Apresentação de Maria ao Templo. Ainda criança, segundo a tradição judaica, para cumprir a promessa de seus pais, com apenas três anos de idade, a menina Maria apresentou-se livremente no Templo de Jerusalém. Esta era uma prática comum para os judeus daquela época. Assim, temos na Mãe de Jesus o modelo mais perfeito de consagração, de entrega total a Deus. Com a Encarnação do Verbo de Deus, teve início um novo tempo, pois n’Ele realizou-se o mistério da Redenção. Desta forma, pelo Batismo, nos tornamos filhos e filhas de Deus e, consequentemente, somos à semelhança de Maria, templos vivos de Deus.

Depois da chuva da tarde/noite de ontem, trazendo o frescor e afugentando o forte calor, o dia amanheceu em festa no meu quintal. Uma celebração ecumênica acordou o dia e se fez plena alegria, renovando o ambiente. Várias espécies da natureza marcando sua presença, rejubilando em cânticos de festa. A natureza festiva em harmonia, louvando o Criador pelo dom total da vida. Deus se manifestando em cada uma de suas criaturas. Fiz-me sintonia com a Mãe Natureza, rezando com o salmista: “Nossa esperança está no Senhor; Ele é o nosso auxílio e a nossa proteção. Nele se alegra o nosso coração, pois confiamos no seu santo nome. Esteja sobre nós o teu amor, Senhor, como está em ti a nossa esperança”. (Sl 33,20-22)

Vivemos um dia pra chamar de nosso, com a riqueza que a liturgia deste dia nos apresenta. Somos parte integrante da família de Jesus, se assim o quisermos. Ser pertencentes da família do discipulado. Estamos juntos e misturados com o grupo de Jesus, pelo menos é assim que Ele nos quer seus, segundo o relato do evangelista Mateus no texto de hoje. Aliás, esta perícope não é especifica apenas de Mateus, mas ela também perpassa nos demais livros sinóticos de Marcos e Lucas. Cada um deles, a sua maneira, com as especificidades próprias de suas comunidades.

Mateus inicia o texto dizendo-nos que Jesus estava falando às multidões, ao mesmo tempo em que sua mãe e seus irmãos ficaram do lado de fora, tentando falar com Ele (Mt 12, 46). A surpresa maior fica por conta da pergunta de Jesus, quando ficou sabendo desta intenção deles: “Quem é minha mãe, e quem são meus irmãos?” (Mt 12,48) Jesus relativizando aqueles que são seus irmãos e sua Mãe: “Todo aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”. (Mt 12,50) Está dentro e estar fora da família de Jesus é muito relativo. Enquanto a família segundo a carne está “fora”, a família segundo o compromisso de fé com as causas do Reino está “dentro”, junto com Jesus. Podemos estar dentro e podemos estar fora, cabe a nós decidirmos.

A verdadeira família de Jesus é formada por aqueles e aquelas que realizam na própria vida, no chão da história, a vontade de Deus, que consiste em dar continuidade à mesma missão de Jesus. Alguns que se acham os tais e imaginam que estejam dentro da família de Jesus, pode ser que estejam bem distantes dela. Não basta querer fazer parte desta família, mas é necessário se comprometer com o Reino. Trilhar o mesmo caminho de Jesus. A família de Jesus são os seus discípulos e discípulas, isto é, a comunidade que já se dispôs a segui-lo, por onde quer que Ele for. São aqueles e aquelas que aprendem os ensinamentos d’Ele, para levá-los aos outros. A família do discipulado de Jesus trilha o caminho da vontade de Deus Pai, isto é, na obediência e na radicalidade do seguimento de Jesus.

Fazer a vontade de Deus! Este é de todos, o maior dos desafios. O que é afinal a vontade de Deus? Fazer a vontade de Deus é deixar-nos ser guiados pela luz e força do Espírito. Aceitar o desafio de encarnar em nós os desígnios de Deus e nos colocarmos livremente em suas mãos, para sermos moldados por Ele. Isto não se faz apenas com palavras, mas com gestos concretos de entrega total e gratuita: “Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus”. (Mt 7,21) Nem mesmo o ato de fé mais profundo da pessoa, que é o reconhecimento de Jesus como o Senhor, faz que alguém faça parte da família de Jesus. Se o ato de fé pela palavra não for acompanhado de ações, é vazio e sem sentido. Que Maria, Mãe dos caminhantes, nos ensine a caminhar, de mãos dadas com a família de Jesus. Ter uma família pra chamar de sua é uma bênção fecunda de Deus. Ame, valorize e respeite a sua, ela pode ser a expressão da nossa relação amorosa com Deus.


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.