A fé testemunhal

Quinta feira da quarta semana da quaresma. O mês de março aos poucos vai se despedindo de nós, passando as coordenadas para o mês de abril. Em meados deste mês, celebraremos a Páscoa da “Testemunha Fiel” (17/04). Aquele que deu a sua vida pelo resgate de muitos (1Tm 2,6), como consequência de sua fidelidade ao Projeto de Deus. Não arredou o pé, mas fez da sua vida martírio por aqueles que nele crerem. Jesus, a Testemunha Fiel que passou pela cruz e venceu a morte, possibilitando a todos nós a perspectiva da Ressurreição: “Há muitas moradas na casa de meu Pai… vou preparar um lugar para vocês”. (Jo 14,2)

Findando o mês de março, ainda há tempo de lembrarmo-nos de uma realidade bastante cruel para muitas mulheres em nosso país. Segundo uma pesquisa publicada recentemente pelo Instituto Data Popular, o Brasil possui uma população aproximada de 20 milhões de mães solteiras, espalhadas pelo seu território. Mulheres que carregam uma pesada cruz, para conseguirem criar os seus filhos sozinhas, abandonadas que foram pelos seus parceiros. Das 67 milhões de mães que compõem o cenário nacional, dentre estas, estão as “mães solteiras”, ainda mais castigadas nestes tempos cruéis de pandemia, com o desemprego, falta de dinheiro para o aluguel, falta de comida na mesa para os seus. Quanto a estas mães, o Papa Francisco disse uma de suas frases que repercutiu mundo afora ao afirmar: “Não existe mãe solteira. Mãe não é estado civil”.

Liturgicamente seguimos ainda com Jesus se confrontando diretamente com os judeus, lideranças religiosas do Sinédrio. Não eram todos os judeus que rivalizavam com Jesus, até porque o Nazareno era também judeu. O Sinédrio era considerado a suprema corte dos judeus. Ou seja, o mais alto tribunal que se reunia em Jerusalém. A palavra Sinédrio, vem do grego synedrion, cujo significado supõe a ideia de assembleia, concílio e tribunal. Um tribunal de justiça, ao qual, as lideranças religiosas de Jerusalem se apegaram para fazer o confronto com a pessoa de Jesus e a proposta que Ele representava, colocando em cheque a forma de viver daquelas lideranças religiosas.

A grande temática do dia de hoje é a questão fundamental do “testemunho”. Os judeus ficaram furiosos com Jesus, porque Ele dava testemunho de si mesmo. Consideravam-no suspeito, o que levou Jesus a afirmar: “Se eu der testemunho de mim mesmo, meu testemunho não vale”. (Jo 5,31) Ainda bem que Jesus os desmascara apresentando três testemunhas que confirmam sua missão divina ali naquele contexto: sua ação em favor da vida e da liberdade; o testemunho do precursor João Batista, que o apresenta como salvador; as Escrituras, que pré-anunciavam a ação libertadora de Jesus de Nazaré, como foi dito claramente no Monte Tabor: “Este é o meu Filho amado. Escutem o que Ele diz!” (Mc 9,7) Jesus era o cara de Deus!

A espinha dorsal do cristianismo passa necessariamente pelo viés da ação testemunhal. Uma fé que não seja testemunhal é a mesma fé que não se deixa ser testada pela ação do fogo do Espírito em nós. Como costumava nos dizer nosso bispo Pedro: “Ser cristão, cristã, é dar testemunho; responder com a própria vida aos apelos do Reino e contestar profeticamente à iniquidade do anti-reino. Responder diariamente, com fidelidade, ao Amor de Deus no serviço fraterno. É ser coerente, com a palavra feita anúncio e com o anúncio feito prática. É ser testemunha, em primeiro lugar, da suprema testemunha, Jesus de Nazaré”.

“A fé sem obras é morta”, já nos alertara o apóstolo Tiago (Tg 2, 26). É pelas nossas ações embasadas pela fé, que vamos testemunhando e dando continuidade à mesma missão de Jesus. Assim, vamos fazendo parte da família de Jesus, sendo continuadores de sua ação libertadora no mundo. Formamos a grande corrente testemunhando Jesus, “uma corrente de ‘testemunhança’. Jesus dá testemunho do Pai, os mártires dão testemunho de Jesus, nós damos testemunho dos nossos mártires. Somos testemunhas de testemunhas.” (Pedro Casaldáliga)

Somos ou queremos ser, as testemunhas do Reino. Se nos evangelhos sinóticos a palavra chave era a “o Reino de Deus”, o evangelista São João trabalha com o conceito “vida eterna”. Seja o “Reino”, seja a “vida eterna”, o que importa é que sejamos construtores de relações novas, de um mundo permeado pela justiça, pela igualdade e pela fraternidade, afinal Jesus veio para fazer a vontade do Pai, testemunhando radicalmente com a própria vida, o grande amor de Deus para com os seus. Ele veio para que todos tenhamos vida e vida plena (Jo 10,10). Não foi atoa que para a nossa Romaria dos Mártires da Caminhada deste ano de 2022, tenhamos escolhido o tema: “TUDO PELO REINO”, lembrando daquilo que fora dito por Paulo na Carta aos Romanos: “O Reino de Deus é Paz e Justiça”. (Rm 14,17) Sejamos nós as testemunhas fiéis de Jesus!


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.