A hipocrisia do puritanismo

Hoje iniciamos mais uma daquelas quartas-feiras (10) sisudas de nossas vidas. A hipocrisia parece não ter limites. Como se não bastasse atacarem a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC), agora estão indo para cima da pastora luterana Romi Bencke. Ela vêm sendo sistematicamente difamada nas redes sociais por grupos neoconservadores católicos, por ser uma das pessoas que contribuíram na elaboração do texto base da Campanha da Fraternidade Ecumênica (CFE) de 2021.

O que tem o propósito de ser uma campanha ecumênica, dialogando com a sociedade, enfocando temáticas pertinentes, com as quais nos deparamos no dia a dia, está funcionando com o seu efeito reverso. Grupos sectários de católicos ultraconservadores intransigentes, acharam-se no direito de atacar as pessoas, por não concordarem com a campanha proposta para este ano. Ou seja, não foi só no tempo de Jesus que tinham os fariseus hipócritas. Eles estão presentes nas instituições e também dentro da nossa própria Igreja. Triste, mas esta é a nossa realidade. Várias pessoas e também instituições mais sérias, tem manifestado seu apoio e solidariedade aos que estão sendo atacados gratuitamente.

Tal situação me fez lembrar a 39ª edição da Campanha da Fraternidade, ocorrida no ano de 2002. Naquele ano, foi proposto o tema “Fraternidade e Povos indígenas”, cujo lema era: “Por uma terra sem males”. Esta campanha visava discutir toda a problemática enfrentada pelos povos indígenas em nosso país, sobretudo da necessidade de demarcação de seus territórios. Aqui próximo da nossa Prelazia de São Félix do Araguaia, numa das cidades, os padres boicotaram veementemente a CF, se recusando a seguir as orientações da CNBB, nem sequer falando da temática indígena. Nestas horas, o preconceito e a discriminação falaram mais alto naquela igreja local. É desta forma que muitas lideranças religiosas vêem os povos indígenas.

Por falar nos povos indígenas, eles estão muito assustados e preocupados com aquilo que está acontecendo às voltas de seus territórios, aqui na Região Amazônica. Nesta semana, por exemplo, o governador de Roraima Antônio Denarium, sancionou, na ultima segunda-feira (08), um projeto de lei que regulamenta a atividade garimpeira no estado. Lembrando que grande parte da ação ilegal destes garimpeiros, ocorre nas áreas indígenas. São invasões dos territórios indígenas, com a anuência dos poderes públicos, sejam eles municipal, estadual e até federal.

Tudo isso nos deixam muito tristes. Não temos apenas o enfrentamento da pandemia com que nos preocuparmos. Na hora em que deveríamos unir as nossas forças para juntos enfrentar as forças da morte, somos dilacerados por pessoas que se dizem cristãs como nós, e “seguem os mesmos passos de Jesus”. Nem o próprio versículo bíblico proposto como lema, é capaz de convencê-los da necessidade de nossa caminhada comum r numa mesma direção: “Cristo é a nossa paz: do que era dividido, fez uma unidade” (Ef 2,14a). Tais pessoas não demonstram o “Espírito Crístico”. Agem movidos pela mentalidade pagã, cujo modo de pensar e de agir, manifestam a presença do mal em si, que é o egoísmo que assume formas individuais e coletivas, dividindo as pessoas.

Hoje eu não estou bem. Não é somente o meu coração que está triste, mas todo o meu ser. Acordei trazendo em mim os sintomas da Covid-19. Talvez nem seja a doença em si, mas o estado de insegurança em que vivemos, leva-nos a achar que estamos infectados. É muita pressão psicológica o tempo todo. Espero que o meu teste seja negativo. Aqueles que estiverem lendo estas linhas rezem por este filho de Deus aqui, que busca incessantemente a sua conversão.

Jesus não teve vida fácil diante dos seus na Palestina de seu tempo. Também, deparou com pessoas que não queriam abrir mão de seus projetos mesquinhos hipócritas. E esta hipocrisia se manifestava na forma de um puritanismo esquizofrênico No Evangelho de hoje (Mc 7,14-23), mais uma vez, no embate com os fariseus, ELE afirma categoricamente: “Não é o que vem de fora e entra numa pessoa pode torná-la impura”. (Mc 7,18) Em outras palavras, não é o que vem de fora que torna uma pessoa mais ou menos pecadora, mas aquilo que sai do seu interior, do seu coração, isto é, da consciência humana, que cria os projetos e dá uma direção às coisas. Afinal foi o próprio Jesus que assim se referiu àquelas serpentes venenosas: “A boca fala aquilo de que o coração está cheio”. (Mt 12, 34) Será que não é o mesmo que estão fazendo com a nossa Campanha da Fraternidade Ecumênica de 2021? Pensemos!