A hora é agora

Sexta feira da Quarta Semana da Quaresma. Tempo de repensar a vida e o nosso ser cristão diante deste mundo em que vivemos. Oportunidade para refletir e tomar pé da realidade para nos transformarmos em fermento, sal e luz com Jesus. O tempo é agora e a hora é esta. Não devemos esperar pelo amanhã para dar este passo e tomar decisões. Como diz o Livro do Eclesiastes, “Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu.” (Ecles 3,1) Mesmo que a todo custo, o homem tenta dominar a vida, que lhe escapa numa série de tempos diferentes. Só Deus tem a visão do conjunto da vida.

O tempo de Deus é de Deus. O seu “Kairós” se faz presente em nós. Como os gregos que tinham na definição desta palavra como o “momento certo” ou “momento oportuno”. No tempo de Deus algo especial acontece, pois só Ele conhece de antemão todos os momentos. É natural que vivamos na ânsia pela plenitude e no desejo de realizá-la. Todavia, com o nosso “khronos” (tempo cronológico), ficamos limitados aos momentos que são geralmente incertos para nós. Cabe-nos então aceitar cada momento presente como dom (dádiva) de Deus, e ter o discernimento para fazer a coisa certa no momento certo.

O tempo cronológico marca a nossa história. No dia de hoje, há 43 anos, mais um martírio estava sendo realizado na América Central, com o assassinato do bispo Dom Oscar Romero, aos 62 anos em El Salvador. O ano era o de 1980, e Dom Oscar foi fuzilado pelo exército de seu país, no momento em que celebrava a Eucaristia na capela do Hospital da Divina Providência, na capital de El Salvador. Um bispo que, como Jesus, assumiu o lado e a defesa dos pobres, denunciando as injustiças que estavam sendo praticadas. Fez uso de todos os meios, especialmente pelo rádio e meios de comunicação social, sempre na defesa dos fracos e das vítimas da violência naquela atual conjuntura e morreu por este motivo.

Beatificado em 23 de maio de 2015 e canonizado em 14 de outubro de 2018, ambos pelo Papa Francisco, Santo Oscar Romero não estava celebrando uma “Missa de Cura e Libertação”, como as que vemos acontecer com os “cristãos” de hoje. Como se Jesus marcasse o dia e hora para fazer acontecer os seus milagres, como querem e defendem alguns padres e pastores midiáticos. São Romero, fazendo jus a Doutrina Social da Igreja (DSI), assumiu o lado dos pobres e indefesos, principalmente depois que seu amigo Padre Rutílio Grande foi assassinado junto com dois camponeses. O clima era hostil e violento, mas nem por isso o bispo se escondeu atrás de sua “mitra” ou das paredes de seu palácio, contemporizando.

Jesus também não fugiu da raia. Mostrou a cara e foi pra cima daqueles que estavam por detrás da organização da sociedade opressora da Palestina de seu tempo. Lá os pobres não tinham voz e nem vez. Como a liturgia de hoje nos mostra, mesmo jurado de morte e com a sua “Pena de Morte” decretada pelos judeus, Ele faz questão de ir à “Festa das Tendas”. Uma festa tradicional judaica, para lembrar a fragilidade da morada nas tendas que se acampavam, e também da fragilidade humana e dependência de Deus durante os 40 anos de travessia do deserto, rumo à Terra Prometida.

Ainda que sem ser notado, Jesus vai à festa, conforme João nos relata: “Quando seus irmãos já tinham subido, então também ele subiu para a festa, não publicamente, mas sim como que às escondidas”. (Jo 7,10) Difícil de não ser descoberto, logo os habitantes de Jerusalém começam a questionar o messianismo de Jesus pelo fato de saberem a sua “procedência terrestre”. Entretanto, o que preocupava as autoridades judaicas era o fato de Jesus, com a sua atividade prática em favor da vida dos pequenos, denunciava o agir perverso daquela sociedade, vendo nele um perigo para a manutenção da ordem estabelecida e, por isso, querem a sua morte.

O Evangelho de hoje nos ajuda a encontrar o caminho de volta da Igreja na mesma dinâmica e caminhada com Jesus. Ela precisa buscar inspiração nas primeiras comunidades primitivas, se quiser estar em sintonia com a proposta de Jesus: ser, estar e caminhar com os pobres. Para isto, ela precisa e pode contar com a força e a luz do Espírito Santo que, no dizer do Papa Francisco, “sem o Espírito Santo só fazemos propaganda, não evangelização”. Serve também de alerta outra frase também do nosso pontífice que disse: “a Igreja deve evangelizar a si mesma, a fim de evangelizar o mundo, senão ela corre o risco de virar uma peça de museu”. Esse Papa Francisco! Santo Oscar Romero, rogai por nós!


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.