A humildade como projeto de vida

Vigésimo segundo domingo do tempo comum. Neste último domingo do mês de agosto, a Igreja reserva para celebrar como o dia de oração pela vocação dos ministérios leigos, e também dos/das catequistas, encerrando assim o mês vocacional. Leigos e leigas são aquelas pessoas que tem uma missão fundamental ao serem chamados por Deus para participar ativamente na caminhada da Igreja, no seguimento de Jesus de Nazaré, dando continuidade à sua missão messiânica. Também neste domingo celebramos a memória do grande bispo e doutor da Igreja Santo gostinho (354 d.C-430 d.C).

Aurelius Agostinus, Agostinho de Hipona ou Santo Agostinho foi um dos mais notáveis membros da corrente filosófica Patrística. De mente brilhante, foi ele um dos responsáveis por criar todo um embasamento teológico e doutrinário para o cristianismo na perspectiva de uma filosofia cristã. Recordando que a Filosofia Patrística corresponde ao período que se inicia com a passagem da Antiguidade para o período Medieval, começando com as Cartas de São Paulo e o Evangelho de São João, encerrando no final do século VIII. Uma de suas frases nos ajuda a refletir dentro da proposta da liturgia para este domingo: “O orgulho é a fonte de todas as fraquezas, porque é a fonte de todos os vícios”.

“Filho, realiza teus trabalhos com mansidão e serás amado mais do que um homem generoso. Na medida em que fores grande, deverás praticar a humildade, e assim encontrarás graça diante do Senhor. (Eclo 3,19-20) A humildade deve ser para o cristão a fonte de toda a sua existência. Humildade como projeto de vida. Ser humilde é a proposta que nos é feita por Jesus, que no texto de Lucas hoje, está participando de um jantar na casa dos fariseus (aqueles que eram “separados”). Como não podia deixar de ser, o Mestre confronta aquelas autoridades, dizendo para elas que as suas condutas estavam equivocadas, pois ocupavam sempre os melhores lugares nas festas. Não eram nada humildes. Pelo contrário, se vangloriavam de serem os tais. Para eles, Jesus vai dizer alto e bom tom: “Quem se eleva, será humilhado e quem se humilha, será elevado”. (Lc 14, 11)

Numa sociedade marcada pela busca dos primeiros lugares, pela concorrência, pela competição desenfreada e ambição, pela cobiça pelos cargos mais elevados, Jesus vai nos dizer que a sua proposta é diferente desta realidade. A humildade deve ser a característica principal daqueles e daquelas que buscam o Reino de Deus. São os pequenos, os pobres, os humildes que são os destinatários primeiros do Projeto de Deus. Num de seus momentos de oração, Jesus assim se expressa diante do Pai: “Eu te louvo, Pai, porque escondeste essas coisas aos sábios e inteligentes, e as revelaste aos pequeninos”. (Mt 11,25) Os arrogantes e prepotentes não conseguem vislumbrar esta lógica de Jesus.

Jesus critica a sociedade que se estrutura na competição e na concorrência. A Humildade aqui vista como símbolo do desapego da honra baseada no orgulho e ambição, gerando as aparências de justiça, mas que no fundo escondem os maiores contrastes sociais. Na concepção de Jesus, a honra da pessoa humana depende diretamente de Deus, o único que conhece a situação real de cada um de nós. Nesta sua visão, com a humildade, a pessoa é capaz de superar a ideia de que ela pode ter honraria baseada apenas nos seus próprios méritos. Nesta sua aula de humanidade Jesus nos mostra que o amor verdadeiro não é competitivo e nem comércio, mas serviço gratuito, pois o pequeno e pobre não pode pagar e o inimigo não pode merecer. Na gratuidade do amor humilde, somente Deus pode retribuir também com gratuidade.

Não querer ser maior ou melhor que os outros, este é o nosso maior desafio enquanto seguidores de Jesus. O espelho da sociedade em que vivemos nos mostra exatamente o contrário disto. Uma sociedade fundamentada nos princípios da meritocracia, cuja falácia maior significa que toda pessoa é capaz de prosperar e vencer somente pelas suas capacidades, sem precisar da ajuda da sociedade, do Estado ou de quem quer que seja. Todavia, como falar em meritocracia enquanto não há oportunidades iguais para todos e todas? O Projeto de vida da humildade nos coloca no mesmo plano de igualdade diante da proposta de Jesus. Ser o que se é! Ser quem você é! Não menosprezar o outro, julgando-o como um ser inferior. Fazer o que se acredita. Sermos sábios inspirando-nos na sabedoria que vem de Deus. Sabedoria esta que nos vem das pequenas coisas da vida. Como nos dizia o mestre Paulo Freire (1921-1997): “Não há saber mais ou saber menos: há saberes diferentes.”

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.