A Mensagem e o mensageiro

Quinta feira da terceira semana do Advento. Já avistamos o Natal do Senhor no campo visual dos nossos sonhos. Momento de levar a sério aquilo que nos adverte o evangelista São Lucas: “Preparai o caminho do Senhor, endireitai suas veredas!” (Lc 3,4) Oportunidade para rever o nosso jeito de ser, de pensar e também as nossas atitudes diante da vida, nos nossos relacionamentos com as pessoas. Tempo oportuno para olhar o mundo com os olhos da fé engajada e comprometida com as causas dos pequenos, pobres e marginalizados. Olhar o mundo com os olhos do coração movido pela compaixão. Natal é muito mais do que uma festa profana do consumismo capitalista; é Deus se fazendo presente na pessoa do Filho, trazendo-nos a libertação.

Se no dia de ontem celebramos a memória ainda viva da páscoa de Dom Paulo Evaristo Arns, também foi o dia de celebrar o aniversário de um dos nossos maiores expoentes da Teologia da Libertação: Leonardo Boff (84 anos). Poucos de nós sabem que este é o pseudônimo de Genézio Darci Boff. Teólogo, escritor, filósofo e professor universitário, um catarinense comprometido com as causas do Planeta e, sobretudo, com a defesa dos direitos dos pobres e excluídos. Ainda como estudante de teologia em São Paulo, li e reli sua obra clássica da Teologia da Libertação, “Jesus Cristo Libertador”, tornando assim o meu livro de cabeceira no trabalho pastoral desde a Favela do Jardim Oratório, em Mauá (SP). Quem ainda não leu, precisa ler. Trata-se de uma importante dica da Igreja de Jesus no comprometimento com a verdade, a justiça, a misericórdia e o amor, em vista da plena libertação.

“Vanitas vanitatum et omnia vanitas” ou “Vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. (Ecles 1,2). Esta é uma das frases mais conhecidas do Livro do Eclesiastes, enfatizando a pequenez das coisas diante da imensidão do mundo. O Livro do Eclesiastes, ao contrário do que alguns possam imaginar, não se trata de uma realidade pessimista. Antes disso, é um livro profundamente crítico, lúcido e realista sobre a condição do povo na Palestina, por volta do século III a.C. Todavia, ao invés das pessoas caírem no desespero e achar que tudo está perdido, o autor apresenta a seguinte perspectiva: Deus como Senhor absoluto do mundo e da história. Um Deus sempre presente, oportunizando o dom concreto da vida para as pessoas, a cada instante e continuamente, convidando-nos a viver intensamente o momento presente, na presença do Deus que dá a vida.

Vivemos num mundo onde impera a vaidade como virtude de egos inflados. A incessante busca pela própria aparência, ou quaisquer outras qualidades físicas ou intelectuais, fundamentadas no desejo de que tais qualidades sejam reconhecidas ou admiradas pelos outros é uma das características da modernidade em tempos de redes digitais. Uma das definições da palavra vaidade é a qualidade daquilo que é vão, vazio e de aparência ilusória. Exatamente o contrário daquilo que nos chama a atenção o texto da liturgia desta quinta feira, quando Jesus se dirige às multidões dizendo: “Que fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? Que fostes ver? Um homem vestido de roupas finas? Ora, os que se vestem com roupas preciosas e vivem no luxo estão nos palácios dos reis”. (Lc 7,24-25)

João Batista é um grande profeta que fecha o Antigo Testamento. Apesar de ser aquele que vem anunciando o Salvador, foi alguém que soube se colocar no seu devido lugar, sem jamais querer ser mais importante que Aquele que anunciava. Pelo contrário, sua humildade e desprendimento caracterizavam o seu jeito próprio de ser: “eu não sou digno sequer de me abaixar para desamarrar as suas sandálias”: (Mc 1,7) João sabia de antemão que a mensagem é infinitamente maior que o mensageiro que ele era: “É preciso que ele cresça e eu diminua”. (Jo 3,30).

João era o maior de todos os profetas. Ele não apenas anuncia a promessa do Messias, mas também testemunha e o presencia: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo”. (Jo 1,29) Nenhum homem do Antigo Testamento é maior do que o precursor. Ele sabia da sua importância, como instrumento nas mãos de Deus no seu projeto salvífico para a humanidade. Mesmo assim, não se deixa levar pela vaidade. O povo simples, os humildes e os cobradores de impostos souberam acolher a pregação de João Batista, acreditando que, com Jesus, iria surgir uma nova sociedade. Estes estão inclusos no projeto do Reino de Deus. Diferentemente das autoridades, convencidas de que não precisavam mudar de vida, foram postas fora do plano de Deus. Que a Igreja dos tempos de hoje aprenda com esta lição de João Batista. Quantos dos padres na nossa Igreja, sobretudo os mais novos, se vestem como se fossem frequentadores dos “palácios dos reis”? Estão mais preocupados com as suas vestimentas que com a mensagem própria de Jesus. Mensageiros vaidosos mais importantes que a mensagem. Que saibamos nos vestir com a mesma personalidade do profeta João, voz e vida que brota no deserto.


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.