A missão e os interesses adversos

Sexta feira da décima quarta semana do tempo comum. Sextou outra vez também aqui pelas bandas do Araguaia. Uma sexta mais fria que as demais do ano, o que não impediu que uma turba de queixadas (porco do mato) passasse ruidosamente pelos fundos de meu quintal, emitindo o seu som característico assustador. Quem não se conformava mesmo foram as minhas duas cachorras, que queriam por todo custo, colocar aqueles visitantes para correr. Tive que contê-las. Mal sabiam elas que seria o seu fim. Fatalmente Seriam estraçalhadas pelos porcos selvagens. Rezei no clima de fervor destes visitantes, tentando encontrar nexo entre a proposta de Jesus aos seus e os interesses adversos desta missão.

Viver no Portal da Amazônia tem as suas vantagens. Estamos distantes do burburinho dos grandes centros urbanos. Assim que aqui cheguei, no início da década de 90, me senti em casa. A paixão pelo Araguaia foi a primeira vista. Sou feliz no Araguaia! Para completar a minha felicidade, fiz da causa indígena minha causa maior. Um sacerdócio que procuro exercer em sintonia com as várias etnias estas que estão presentes em nossa Prelazia de São Félix do Araguaia. Aprendi logo com Pedro a ter muito respeito pelos povos indígenas, a quem devotei a minha entrega de vida. Um aprendizado e uma experiência de vida que venho acumulando nestes mais de trinta anos que por aqui estou. Vida doada pela causa indígena.

Mas nem tudo é somente maravilha pelas terras da floresta. Aos poucos, a Amazônia está perdendo o seu encanto de beleza natural. Com tanta destruição ambiental, desmatamento, queimadas, envenenamento do solo, dos riachos, pelas centenas de milhares de agrotóxicos, a morte vem no seu encalço. Várias espécies estão deixando de existir em função da ação devastadora dos “homens do lucro”. Um vasto canteiro de soja é sinônimo de morte à sua volta. Sem falar naquele alimento ali produzido, que vem inflado dos mais variados tipos de veneno. Os mais de mil tipos de agrotóxicos proibidos lá fora, são livremente utilizados aqui na “Terra Brasilis”.

Até mesmo o Araguaia está passando por uma metamorfose. Segundo alguns estudiosos, a rica variedade de peixes está com os seus dias contados. Além do veneno que chega às suas águas, há também a ação predatória dos turistas que para cá deslocam. A pesca esportiva é um destes mecanismos que está mudando a configuração da bacia pesqueira. Como este tipo de atividade retira do rio o filhote, o pintado e alguns outros mais, está provocando um desequilíbrio no rio. Há uma quantidade excessiva de piranhas, uma vez que o seu predador natural não se faz mais presente no rio. O rio está morrendo. Estimativas dão conta de que ele não existirá mais em 40 anos.

Viva a Ciência! Viva o conhecimento cientifico. No dia 8 de julho se comemora o Dia Nacional da Ciência e também do Pesquisador Científico. Muito embora, nestes últimos tempos, tenha havido um crescimento desordenado dos “negacionistas da Ciência”, ela está ai para salvar vidas e nos fazer crescer em conhecimentos mil. Independentemente destes acéfalos, no dia de hoje temos a oportunidade de homenagear uma instituição séria que é a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que está entre nós desde 8 de julho de 1948, levando conhecimento e despertando novas cabeças pensantes no campo da ciência.

O conhecimento é a luz do crescimento humano. O nosso caminhar pela vida é permeado por aqueles conhecimentos que vamos adquirindo ao longo da existência humana. O conhecer não ocupa espaço em nosso ser. Quanto mais conhecimento adquirirmos, mais vazios de nós mesmos nos sentimos, deixando espaço memorável para a humildade. Um conhecimento que não nos sobrepõe sobre as demais pessoas. Conhecer para sermos nós mesmos. Com dizia o filósofo Platão, “A coisa mais indispensável a um homem é reconhecer o uso que deve fazer do seu próprio conhecimento”. Disse tudo.

Conhecimento que nos chega através da mensagem de Jesus endereçada aos seus que a liturgia de hoje nos traz. O discípulo seguidor de Jesus precisa estar preparado e saber que nem tudo são flores ao longo de seu caminhar: “Eis que eu vos envio como ovelhas no meio de lobos. Sede, portanto, prudentes como as serpentes e simples como as pombas”. (Mt 10, 16) A missão é árdua e aqueles que se dispuserem a caminhar com o Mestre, terão o mesmo destino que Ele: sofrer as consequências da missão que liberta e dá vida nova. Missão esta que atingirá em cheio os interesses de muitos e, por isso, provocará a perseguição, a divisão e o ódio, até mesmo dentro das próprias famílias. Conhecer Jesus é fazer a experiência de caminhar com Ele pelas estradas da vida, sabendo que não estaremos sozinhos, mas seremos guiados pela presença de Jesus e pelo Espírito de Deus. A presença de Jesus nos faz conhecer a Deus Pai e Mãe de todos nós. Que venha o conhecimento de Deus a despeito de todos os interesses adversos!


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.