A morte como mistério

Dia de Finados. Dia em que nos lembramos e fazemos memória das pessoas que nos deixaram. Este é um finados diferente, pois nunca tivemos tantas mortes dos pobres como neste ano de 2020. Segundo dados do levantamento feito, o país registrou 530 mortes pela doença nas últimas 24 horas. Com isso, o total de óbitos provocados pela doença chegou aos 157.981. O que mais dói, não é perda destas vidas, mas a negligência e a irresponsabilidade do governo brasileiro, diante desta pandemia. Quantas destas vidas não seriam poupadas, se tivéssemos governo?

Aproveitei hoje para rezar na sepultura de nosso eterno bispo Pedro. Comove qualquer um, estar diante de sua sepultura tão simples. De imaginar que ali está sepultado um bispo. Mas este bispo é Pedro. E Pedro é diferente até no jeito de ser sepultado. Passou pela vida como um homem pobre e despojado, se encontrando com o Ressuscitado, com quem tinha tamanha intimidade, quando estava no meio de nós. Simplicidade expressa em um de seus poemas: “Para descansar eu quero só esta cruz de pau, com chuva e sol. Estes sete palmos e a Ressurreição.” (Pedro Casaldáliga)

A morte sempre foi um mistério para nós. Por mais que tenhamos fé, o encontro com ela sempre foi algo que nos incomodou. Verdade é que ninguém deseja este encontro com a morte, por mais que ele seja inevitável. A nossa relação com ela é algo que trás muitos mistérios. A fé nos faz acreditar que ela é uma passagem, mas nenhum de nós sabe como será este encontro que faremos no face a face com Deus. O psicanalista Freud até que tenta nos orientar, mas não ajuda muito quando ele diz: “Se quiseres poder suportar a vida, fica pronto para aceitar a morte. (Sigmund Freud) A mkorte continua sendo um mistério para nós.

Queremos viver, este é o nosso sonho de sempre. Passamos pela vida desfrutando daquilo que ela pode nos oferecer. Quando ainda jovens, nem sequer pensamos na possibilidade de vir a nos tornarmos um ancião. Vivemos na intensidade das coisas que a vida vai nos proporcionando. Segundo a fé cristã, Deus nos projetou para a vida e para vivermos com muita intensidade. Vida plena, portanto. (Jo 10, 10) O morrer parece que não está nos planos de Deus, mas a vida, que se apresenta em primeiro plano.

A vida é o sopro maior de luz que vai nos alimentando na nossa caminhada. Para os que acreditamos, a morte não pode ser o fim. Bem antes de Jesus, o profeta Isaías que teria vivido por volta dos anos 765 AC e 681 a.C já nos dizia que: “Os teus mortos hão de reviver e seus cadáveres se levantarão. Os que dormem no pó vão acordar e cantar, pois o teu orvalho é um orvalho de luz, e a terra das sombras dará à luz.” (Is 26, 19) A nossa esperança acabará sendo a de que o julgamento parece tardar, mas Deus, na hora certa, o realizará na história. O sangue dos justos e inocentes clama a Deus, que responde julgando e destruindo o orgulho e ambição, geradores de opressão, violência e morte.

O clima de morte que nos ronda é, de fato, muito triste e assustador. Nunca estivemos tão inseguros como agora nestes últimos tempos. Muitos amigos, irmãos nossos nos deixaram, com uma morte que sugere serem prematuras. Poderiam muito bem serem evitadas. Pessoas que poderiam estar ainda entre nós, mas que por uma série de situações, embarcaram prematuramente para o seu encontro com Deus. Frente a estas situações, não podemos dizer, em hipótese alguma, que Deus assim o quis, pois isso não é verdade. Ele nos criou para vivermos até o último dia de nossas vidas, ao lado dos nossos entes queridos.

Viver intensamente! Esta é a proposta de Deus para nós. Uma vida numa busca constante pela felicidade. Curtir cada instante, cada momento como se fosse o último de nossas vidas. E no dia que formos fazer o nosso encontro com o Pai, estejamos confiantes naquilo que o próprio Jesus nos assegurou no texto do evangelho do dia de hoje: “Esta é a vontade do meu Pai: que toda pessoa que vê o Filho e nele crê tenha a vida eterna. E eu o ressuscitarei no último dia”. (Jo 6, 40) Afinal, Jesus é aquele que se apresenta como vindo de Deus para dar a vida definitiva às pessoas. Claro que este seu anúncio provocou os seus adversários que não admitiam que um homem pudesse ter origem divina e dar a vida definitiva.