Quarto domingo da quaresma (14) Mais três domingos e já estaremos celebrando a Páscoa do Verbo que se encarnou em nossa realidade humana e veio fazer morada no meio de nós. Jesus é o Deus conosco presente em nossas vidas. Com a sua Morte e Ressurreição, Deus vem nos mostrar que não estamos órfãos e nem desamparados a mercê da sorte. “No ventre de Maria Deus se fez homem. Mas, na oficina de José Deus também se fez classe”, nos diria nosso bispo Pedro. Deus que se faz para todos e todas, mas que tem a sua predileção: os pequenos e marginalizados. “O resto de Israel” (Isaías 10,20). Os Anawin, os “pobres de Javé”.
No Projeto de Deus revelado por Jesus, Deus faz questão de contar com a participação decisiva de uma mulher: Maria de Nazaré. Uma mulher simples do meio do povo, de onde não se esperaria que viesse nada de bom: Galileia dos pagãos. “Pode vir alguma coisa boa de Nazaré”? (Jo 1,46) Uma digna representante da comunidade dos pobres que esperavam pela libertação. Dela nasce o Jesus Messias, o Filho de Deus, graças ao sim desta mulher. O Filho de Maria é aquele que vai iniciar nova história da humanidade. Ou seja, ELE surge dentro da história de maneira totalmente nova, graças a participação interativa de uma mulher pobre, do meio dos pobres.
Assim também é conosco. Deus sempre conta com a nossa participação para realizar o seu Projeto entre nós. É com esta participação imprescindível nossa, que o Reino vai acontecendo na nossa história de vida. Deus também faz questão de que a nossa participação seja indispensável, através das nossas ações cotidianas, fazendo acontecer os fragmentos do Reino, a partir da Ressurreição de seu Filho. Assim como Maria acreditou e se colocou à disposição, somos também interpelados a contribuir neste projeto salvífico de Deus.
Estamos a caminho da vida. Com a Páscoa de Jesus, temos a certeza de que a morte não venceu. Aqueles que acreditavam que matando o Filho, matariam também o projeto sonhado por Deus, se enganaram. A morte já não tem mais a última palavra, pois Deus interveio e fez ressurgir a vida plena de seu Filho, dividindo a história humana em duas partes: antes e depois d’ELE. Nós também passamos a experimentar desta vitória, pois alcançamos a chance de também com ELE ressuscitar. Esta é a grande novidade que Deus tem para a humanidade, que está presente em Jesus, que nos revela na cruz a vida nova. ELE nos demonstra o maior ato de amor: a doação de sua própria vida em favor da humanidade. “É necessário que o Filho do Homem seja levantado, para que todos os que nele crerem tenham a vida eterna. (Jo 3, 14-15)
Neste dia 14 de março, experimentamos um sabor amargo de fiel. Um dia marcado pelos sinais (anti)-Pascais do (anti) Reino. Há exatos três anos, era assassinada no Rio de Janeiro a socióloga e vereadora do PSOL, Marielle Franco (1979-2018). O martírio de uma vida que foi ceifada covardemente em sua plenitude. Os andarilhos das trevas tiraram a vida de uma grande guerreira. Certamente uma mulher que, com a sua luta incansável pelos direitos das mulheres pobres da periferia, contribuía com o projeto de Deus, mesmo sem acreditar nesta possibilidade. A nossa cega justiça, que tarda e também falha, não foi capaz de dar-nos uma resposta positiva, punindo os seus algozes criminosos. Não tenho dúvidas de que estes estão inscritos no “caderninho de Deus” e um dia serão chamados à prestar contas.
No dia de ontem (13) no ano de 1976, aos 41 anos de idade, minha rainha fez a sua Páscoa no Cristo Ressuscitado. Quarenta e cinco anos se passaram da partida de minha mãe do meio de nós. Tenho dela uma viva lembrança dos meus tempos de criança, que guardo em meu coração. Mesmo sendo uma criança sapeca, aprendi dela os valores que me fizeram ser quem sou hoje. Um aprendizado que carrego ao longo de toda a minha vida. Tenho mais dela em mim do que eu mesmo posso imaginar. Naquele ano de sua páscoa, decidi entrar para a vida religiosa. Todos os obstáculos e desafios enfrentados sinto fortemente a sua presença em mim dizendo: não desanime, mas segue em frente! Deus é contigo!
Assim, vamos dando prosseguimento às nossas vidas, com as lutas pertinentes que cada um as abraçou. O mais importante é saber que o nosso Deus não se encontra lá nas alturas, mas aqui no dia a dia caminhando conosco. Como está sendo mostrado no Evangelho de hoje, onde Deus não quer que nos percamos e nem sente prazer em condenar-nos. Temos um Deus que manifesta todo o seu amor através de Jesus, para salvar e dar a vida a todos. Um Deus que não se compraz ao ver-nos na nossa luta individualizada do “cada um pra si” ou do “salve-se quem puder”, mas que sejamos capazes de fazer acontecer em nós o espírito de humanidade Ubuntu: “Sou o que sou pelo que nós somos”. “Sou quem sou porque tu és”. “Se sou é porque nós somos”, sendo iluminados pela LUZ que é Jesus.