A pedagogia da cruz

Sábado da Festa da Transfiguração de Jesus. Festa esta que chegou até nós pelos relatos dos três Evangelhos Sinóticos (Mt 17,1-9; Mc 9,2-10; Lc 9,28-36). Uma festa iniciada nos primórdios do cristianismo, mas que somente a partir do ano de 1457, no pontificado do Papa Calisto III (1455-1458), ela se estendeu para toda a cristandade. Uma festa por demais significativa, como assim a traduz o salmista: “O rosto de Cristo é um rosto de luz que rasga a obscuridade da morte: é anúncio e penhor da nossa glória, porque é o rosto do Crucificado Ressuscitado, o único Redentor da humanidade, que continua a resplandecer sobre nós”. (Sl 67, 3). Deus se fazendo presente no Filho: “Este é o meu Filho, o Escolhido. Escutai o que ele diz!” (Lc 9,35)

Hoje é também um dia significativo para a educação brasileira. No dia 6 de agosto se comemora o Dia Nacional dos Profissionais da Educação. Lembrando aqui que não se trata apenas dos professores/as e pedagogos. Graças a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9.394/96 (LDB), que instituiu a categoria “Profissionais da Educação para todos aquelas pessoas que estão no “chão da escola”. Esta data foi instituída pela Lei nº 13.054, de 22 de dezembro de 2014. Estes profissionais, nem sempre valorizados adequadamente, mas que possuem uma gigantesca responsabilidade de serem os construtores da sociedade através da educação.

Profissionais da Educação que carregam sobre os seus ombros uma pesada cruz, ao serem os porta-vozes da educação cidadã. Uma cruz que se encontra no horizonte de cada professora/a na tarefa de construir uma educação de qualidade, no espaço da vida pública, sobretudo para os filhos das famílias de baixa renda, as camadas populares de nosso país. Mesmo sem serem valorizados, cada um destes profissionais tem dado o melhor de si no sentido de construir outro Brasil possível. Entretanto, isto somente será possível quando levarmos a sério aquilo que nos disse o grande patrono da educação brasileira Paulo Freire: “Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor”.

Pedagogos e pedagogas do conhecimento. Pedagogia de Jesus que encanta e seduz. Pedagogia da cruz que liberta e salva, segundo o horizonte de Deus. Cruz que entra na vida de Jesus não como uma predestinação ou porque Deus assim o quis. Deus não nos revela o seu Filho para acabar os seus dias, dependurado numa cruz. A cruz entra na vida de Jesus como decorrência direta de sua fidelidade ao Pai, ao dar a sua vida por inteiro, até as últimas consequências. Uma cruz pedagógica que nos ensina que a entrega de cada um de nós no seguimento de Jesus de Nazaré tem que ser total, assumindo as consequências da perseguição por causa d’Ele. Seguimento coerente e persistente na procura do Reino.

A cruz pedagógica de Jesus nos convoca ao seu seguimento. Como fizeram os três discípulos de Jesus que o texto de Lucas nos apresenta na liturgia do dia de hoje. Na cena da transfiguração de Jesus no Monte Tabor, Pedro, João e Tiago, são convidados a assumirem o desafio de se fazerem presentes em meio ao conflito. Não se trata de ficarem venerando as figuras emblemáticas de Moisés e Elias (a Lei e os Profetas), mas serem presença de transformação na planície. Descer da montanha é o primeiro dos desafios a serem cumpridos na prática cotidiana da missão messiânica com Jesus. Ir às periferias das vidas, sejam elas as periferias geográficas, sociais, políticas e até as periferias existenciais. Ser presença viva do Ressuscitado lá onde estão as mazelas da existência humana. Na concepção do Papa Francisco, uma ‘Igreja em Saída’: “Sair em direção dos afastados, dos excluídos (…) sair em direção às periferias humanas. Uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas”.

Ao se transfigurar diante daqueles seus seguidores, Jesus dá uma pequena amostra daquilo que está previsto no seu itinerário rumo à Jerusalém. A cruz aponta no horizonte de seu projeto messiânico libertador. Mediante sua Morte, Ressurreição e Ascensão, o ato supremo de libertação do povo, acabando com a opressão exercida pelo sistema implantado em Jerusalém. A cruz como horizonte pedagógico de todo seguidor de Jesus. Pedagógico no sentido de que Deus não quer o sofrimento e nem a dor dos seus, mas no enfrentamento das forças de exploração e da morte, a cruz aparece como perspectiva consequente da missão. Cruz pedagógica e redentora, afinal as forças da morte não prevaleceram, uma vez que Deus Ressuscitou o seu Filho e Ele está vivo presente no meio de nós.

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.