A polêmica sobre os irmãos de Jesus

CRÍTICA DOS EVANGÉLICOS:

A Bíblia menciona várias vezes os irmãos de Jesus e também suas irmãs (Mc 3,31-35; 6,1-6; Jo 2,12; 7,3. 10; At 1,14; 1Cor 9,5). Como a grande maioria dos casais judeus, Maria e José tiveram muitos filhos, além de Jesus. O dogma católico da virgindade perpétua de Maria carece de fundamento bíblico.

 RESPOSTA CATÓLICA

         O dogma da Virgindade Perpétua de Nossa Senhora é um dos ensinamentos católicos mais criticados. Apoiados em algumas passagens bíblicas, onde são mencionados os irmãos e irmãs de Jesus, os evangélicos rechaçam a referida doutrina. Para desfazer mal entendidos busquemos entender quem eram os irmãos de Jesus e consequentemente os argumentos em que os evangélicos se apóiam.

         Partimos do pressuposto que só Jesus é chamado “o filho de Maria” (Mc 6,3), quando se diz “tua mãe” (Mt 12,47, ou “a mãe dele” (Mt 13,55). A Bíblia não faz uso da expressão “filhos de Maria e de José”, nem usa a expressão “filhos da mãe de Jesus”. Ao usar a expressão “irmãos de Jesus”, o texto grego toma como ponto de partida o substrato cultural da língua hebraica e aramaica, falada por Jesus e pelos seus discípulos.

Para os hebreus a expressão irmãos tem uma abrangência maior de significado, podendo designar primos, tios sobrinhos, entre outros parentes. Por exemplo, o texto bíblico menciona Lót como sobrinho de Abraão (Gn 12,4-5). Pouco depois, aparece Abraão chamando Lót de irmão (Gn 13,8). Do mesmo modo Jacó se declara irmão de Labão, quando na verdade era filho de Rebeca, irmã de Labão (Gn 12-15). Veja ainda: 1Cr 23,21-23.

         O grau de parentesco de Jesus com os ditos irmãos pode ser entendido, se analisarmos as mulheres mencionadas na crucifixão. “E também estavam ali algumas mulheres, olhando de longe. Entre elas, Maria Madalena, Maria mãe de Tiago, o menor, e de José e Salomé” (Mc 15,40). Aqui Marcos destaca duas mulheres no calvário: Maria Madalena e Maria mãe de Tiago,  e de José e Salomé. Lembrando que Tiago, José e Salomé são chamados de irmãos de Jesus em outras passagens (Mc 3,31-35; 6,1-6; Jo 2,12; 7,3. 10; At 1,14; 1Cor 9,5). Por sua vez, Mateus especifica três mulheres no calvário: “Entre elas Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago e de José, e a mãe dos filhos de Zebedeu” (Mt 27,56). Observe leitor que Mateus afirma, em sintonia com Marcos, a presença de uma Maria mãe de Tiago e de José no calvário.

Mas quem era essa Maria mãe de Tiago, de José e Salomé? Lendo o texto paralelo de João encontramos a reposta: “Perto da cruz de Jesus, permaneciam de pé sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria mulher de Cleofas e Maria Madalena” (Jo 19,25). Observe que João acrescenta a presença de Maria mãe de Jesus na cruz e ainda menciona a Maria, irmã da mãe de Jesus e mulher de Cleofas. Graças a João podemos entender que essa Maria, irmã da mãe de Jesus, era a mãe dos irmãos de Jesus, mencionada nos textos paralelos de Marcos e Mateus. Assim sendo, os irmãos e irmãs de Jesus são apenas primos, filhos de outra Maria que é irmã de Nossa Senhora.

         Temos evidências nos evangelhos que confirmam ser Jesus o filho único de Maria. Quando a Sagrada Família fugiu para Egito, podemos observar que o evangelho apenas menciona São José, Maria e Jesus (Mt 2,13). Caso tivessem filhos com idade pouco superior a Jesus como poderiam deixá-los abandonados por dois anos? Quando Jesus adolescente “se perdeu” no Templo aos doze anos (Lc 2,46-49), Ele aparece sozinho com seus pais em Jerusalém. Se Maria tivesse outros filhos mais novos como poderia viajar e deixá-los em casa tantos dias sozinhos? A maior evidencia encontramos no evangelho de João. Pouco antes de morrer, Jesus entregou sua mãe aos cuidados do discípulo amado (Jo 19,25-26). Ora, não faria sentido o Senhor entregar sua mãe aos cuidados de um discípulo se Maria realmente tivesse outros filhos.

         Um argumento usado pelos evangélicos contra a virgindade de Maria é o fato do evangelho apresentar Jesus como o primogênito. “Maria deu à luz o seu filho primogênito” (Lc 2,7). Mas isso não indica necessariamente que Maria teve outros filhos depois. A lei de Moisés exigia que todo o primogênito fosse consagrado a Deus, quer dizer, seja filho único ou não (Ex 13,2). Afirma o livro do êxodo: “Todo o primogênito da terra do Egito morrerá” (Ex 11,5). E assim sucedeu: “Não havia casa que não houvesse um morto” (Ex 11,30). Certamente que havia no Egito casais de um só filho; por exemplo, todos que tinham casado nos últimos anos. Outro exemplo bem interessante é quando Deus ordena “contar todos os primogênitos masculinos dos filhos de Israel, da idade de um mês para cima” (Nm 3,40). Ora, uma vez que menciona primogênito de um mês de idade, como é que se pode exigir que, para haver um primeiro, haja um segundo? Por conseguinte, há primogênitos sem que haja, necessariamente, um segundo.

         Ademais, o termo hebraico “bekor” (primogênito) podia designar simplesmente o bem-amado, pois o primogênito é aquele filho querido que durante algum tempo os pais dedicam todo o amor e cuidado. Assim os hebreus julgavam os primogênitos como dignos de especial amor de Deus, pois deviam ser consagrados ao Senhor nos primeiros dias (Ex 13,2; 34,19). Podemos entender que Lucas ao referir-se a Jesus como primogênito estaria colocando-o como herdeiro privilegiado, uma vez que descendia de Davi. Isso sem significar que Jesus teria outros irmãos.

         Outro argumento usado pelos evangélicos contra a virgindade de Maria são as expressões do evangelho “Antes de coabitarem” e “Até que”. “Maria, sua mãe, estava desposada com José. Antes de coabitarem ela concebeu por virtude do Espírito Santo” (Mt 1,18). Seria errado insinuar que depois coabitarem José tivesse relação. Também se lê: “José não conheceu Maria (ou seja, que não tiveram relações) até que ela desse à luz um filho (Jesus) (Mt 1,25). Seria errado insinuar que depois coabitarem José tivesse relação sexual com Maria.

 “Até que” ou “Antes de” na língua hebraica é uma expressão que se refere apenas ao passado. “Micol, filha de Saul, não teve filhos até o dia da sua morte” (2Sm 6,23). Isso não significa que após a morte Micol teve filhos. Outro exemplo é a fala de Deus no sonho de Jacó: “Não te abandonarei, enquanto não se cumprir tudo o que disse” (Gn 28,15). Isso não significa que depois Deus poderia abandoná-lo. Vejamos também a afirmação de Jesus aos discípulos: “Estarei convosco todos os dias até a consumação dos tempos” (Mt 28,20). Ninguém ousaria concluir que depois do final dos tempos, Jesus não estaria mais presente com seus discípulos. Portanto, não tem sentido apelar para expressão “antes de coabitarem” ou “até que”, para insinuar que Maria teve outros filhos depois que foi morar com São José.

         Desde os primeiros séculos os escritores cristãos afirmaram a Virgindade Perpétua de Maria e reconheceram-na como “Sempre Virgem”. Essa verdade refere-se à Maria como virgem: antes, durante e depois do parto e sua concepção milagrosa. Para eliminar possíveis dúvidas, no Sínodo de Latrão (649) o papa Martinho I proclamou definitivamente o dogma da Sempre Virgem Maria (Concílio de Latrão, 649, cânon 2-5, Denzinger, 255)