Hoje (10) estou chique. Invoquei para rezar comigo, nada menos que o pensamento de Pierre Teilhard de Chardin (1881-1995). Sim, este jesuíta, paleontólogo, biólogo, cientista, teólogo, filosofo francês, com seu espírito visionário de encarar o mundo e as teorias da evolução humana. Homem de uma inteligência rara, fazendo jus a comunidade jesuítica. Neste ínterim, me vem a mente uma das suas frases que reflete muito bem o atual momento que ora vivemos. Dizia ele: “Nós mesmos somos o nosso pior inimigo. Nada pode destruir a humanidade, mas a própria humanidade.”
Rezar o Planeta Terra! Numa perspectiva teilhardchardiana, de sintonia fina de amorosidade e respeito com tudo aquilo que nos cerca e envolve. Quanto desafio se nos coloca como forma de nos posicionarmos frente à Mãe Terra! A “Patchamama”, na concepção dos povos indígenas. Ou seja, aquela que é conhecida como Mãe da humanidade, como representante máxima da Deusa maior, capaz de mudar todo o sentido da vida das pessoas, possibilitando prosperidade, sustento e acima de tudo, energia vital. Segundo os povos originários, ela possui o dom da purificação e da limpeza, plantando no coração dos seres, o poder, o amor e o perdão, desde que estes se abram a esta perspectiva de acolhimento.
Seguindo na mesma perspectiva de Teilhard, James Lovelock, cientista inglês, nascido em 1919, que ficou conhecido por ser o primeiro a formular uma teoria científica na qual se aborda uma intuição profunda no pensamento humano. Nesta sua teoria ele levanta a “Hipótese Gaia” de que o Planeta está vivo e que é um organismo complexo em si mesmo. Ainda segundo a visão de Teilhard, a Terra tem sua própria dinâmica e personalidade autônoma, sendo o principal centro diretor de nosso futuro. Ou seja, estamos interligados a ela e a nossa vida depende diretamente da forma como nos relacionamos com ela.
“Vocês estão morrendo e também matando a nossa Mãe Terra. Não se contentam em receber da terra aquilo que ela nos dá de graça, mas vocês têm a necessidade de destruir tudo a sua volta”, desabafou comigo uma das principais lideranças do nosso meio, o professor Xavante Cosme Rité, filho do cacique Damião Paridzané. Tive que concordar com a assertiva do professor, pois, segundo ele, nós somos profundamente ingratos em relação a terra. De graça recebemos e de morte a tratamos. Neste sentido, eles jamais concebem a ideia de que possamos vender a terra. Seria o mesmo que estar vendendo a própria mãe.
Faz sentido esta lógica indígena. A Terra é o espaço sagrado onde acontece a relação de todos os seres vivos com o mundo ancestral. Nada acontece ali por acaso, mas tudo tem uma razão de ser e todos os seres que convivem naquele espaço, tem a sua função especifica no todo. Desta forma, precisamos aprender muito com eles e, mudar urgentemente, a nossa ideia de como lidamos com o meio que nos envolve, com a terra que pisamos. Sendo eles um povo “não civilizado”, como costumamos dizer, possuem sabedoria ancestral milenar e sabem lidar com a Mãe Terra de uma forma bem mais harmônica do que nós que nos achamos os tais. Nada acontece ali por acaso. Quando estes povos estão nos seus rituais culturais sagrados, eles pisam a terra com os pés descalços pois recebem diretamente da terra a força necessária para continuar existindo e resistindo, fazendo valer os seus conhecimentos.
Da terra também brota a sabedoria de Deus! Dela emana o sopro divino da criação. Tudo nos advém dela. É ela que provê o nosso sustento e a nossa sobrevivência. Sem ela, nada somos! Esta é também a experiência do povo semita (o povo da Bíblia) na sua relação de amor e ódio com a Mãe Terra. O profeta Isaías assim se refere a nossa Mãe Terra: “Porque assim diz o Senhor, que criou os céus, o único Deus, que formou a terra, que a fez e a firmou em suas bases; ele não a fez para ser um caos, mas para ser habitada”. (Is 45, 18) Terra como dom para todos! A ser habitada por todos, como presente do Deus vivo, que caminha com o seu povo. Nada de concentração de uma parte dela nas mão de alguns. Concluindo este sentido bíblico da nossa Mãe Terra, nosso bispo Pedro identificou no latifúndio o inimigo do povo. Na concentração da terra, segundo ele estão as bases da desgraça hereditária da sociedade brasileira. No seu poema “Confissões do Latifúndio” ele resume assim: “Por onde passei,
plantei a cerca farpada, plantei a queimada. Por onde passei, plantei a morte matada. Por onde passei, matei a tribo calada, a roça suada, a terra esperada… Por onde passei, tendo tudo em lei, eu plantei o nada”. (Pedro Casaldáliga)