A vacina da incoerência

Depois de testar pela terceira vez para a Covid-19, mais uma vez fui negativado. Como entender a ação deste vírus esquisito? Convivendo com pessoas que testaram positivo, mesmo assim não fui infectado, graças a Deus! Várias situações apresentam com esta mesma configuração. O vírus segue apanhando os mais descuidados. Muitos casos de pessoas infectadas para uma cidade do porte de São Félix do Araguaia, com os seus 14 mil habitantes.

A vacina será a nossa grande esperança. Todos aguardamos ansiosamente por esta. Ela será uma garantia para nós? É o que esperamos, muito embora a comunidade científica, anda perplexa com a segunda onda de infectados nos países pelo mundo, inclusive com a reinfecção. Na verdade, o vírus é ainda um grande desconhecido para os infectologistas, que merece a atenção redobrada. Por mais que os comitês eleitorais não pensem assim, com as pessoas comportando-se como se não houvesse mais a pandemia. O importante é “ganhar as eleições”.

Há uma esperança no ar com a vacina que segue o seu curso natural, com a testagem nas pessoas. Ainda não dá para se fazer um prognostico seguro ainda. O certo é que ela vai nos possibilitar uma situação de maior segurança, mesmo que alguns “negacionistas” pensem de forma contrária. A incoerência maior ficou por conta do inominável presidente que, em uma de suas falas, afirmou que não irá obrigar ninguém a vacinar-se, uma vez que, estamos numa democracia. Como se numa democracia não houvesse direitos e deveres dos cidadãos.

Por falar em democracia, a comunidade indígena do Brasil está apavorada e muito apreensiva. E com razão. No dia 28 de outubro próximo, está pautada a votação do Marco Temporal pela Suprema Corte (STF). Este chamado Marco temporal é uma ação no Supremo Tribunal Federal, defendendo a ideia de que os povos indígenas só podem reivindicar suas terras onde já estavam no dia 5 de outubro de 1988, data em que foi promulgada a nova Constituição Federal. Entendendo a Advocacia Geral da União que a jurisprudência desta decisão, deverá valer para todas as reservas indígenas do Brasil.

Este marco temporal fere frontalmente os direitos dos povos originários, às suas terras imemoriais. Nunca é demais lembrar que a ocupação dos territórios tradicionais pelos povos indígenas, é anterior a criação do Estado Brasileiro. Ou seja, os indígenas não passaram a existir no Brasil a partir de 1988, como quer o Marco Temporal. A apreensão é maior, pois se aprovado este marco temporal, colocará em cheque todas as demarcações feitas até a presente data, além de legitimar as invasões feitas aos territórios indígenas por ruralistas, grileiros, madeireiros, garimpeiros, pecuaristas, eternos opositores dos direitos dos indígenas.

Todas as lideranças indígenas com quem tenho conversado, tem manifestado a sua preocupação com relação à política atual do governo brasileiro. Um governo manistadamente anti-indígena. Os interesses indisfarçáveis sobre as terras indígenas estão em jogo, nesta grande cartada que está sendo objeto de disputa na Suprema Corte do país. Os ministros do STF têm em suas mãos, uma grande chance para dar uma solução definitiva aos conflitos envolvendo terras indígenas no país e, com isso, garantir um respiro às comunidades que se encontram, atualmente, pressionadas por poderosos setores econômicos. Vale a nossa pressão para que este marco diabólico não seja aprovado em hipótese alguma. Estejamos atentos.

Ainda falando sobre a vacina, os indígenas também não acreditam que uma vacina traga a solução definitiva para esta grande pandemia do novo coronavírus. No entender deles, vai ser apenas um paliativo, pois o grande problema que vêem é a nossa relação com a mãe natureza. E este problema não vai ser resolvido com a vacina, segundo eles. “Vocês tem uma relação de morte com a terra. Tudo o que tem nela, vocês querem destruir. Vocês não sossegam enquanto não acabar com tudo o que a terra nos dá”, me disse o professor indígena, diretor da escola Indígena de Marãiwatsédé, Boaventuira Waluaxano. No entendimento deste professor, a vacina que poderá nos salvar vai ser aquela que nos trará de volta a humanidade perdida na relação desrespeitosa com todos os demais seres da natureza.