Acreditar com discernimento

Sexta feira da primeira semana do Advento. A primeira vela que foi acesa neste domingo que passou (27) traz o significado do perdão de Deus a Adão e Eva. Perdão este que Deus está sempre disposto a nos conceder. Isto nos quer dizer que devemos sempre buscar o arrependimento das nossas falhas, nossos erros, através de um processo de conversão, preparando o nosso coração para o encontro com o Senhor que vem na pessoa do Filho no Natal. Uma conversão que se faz permanentemente e de uma vigilância constante para o encontro do absoluto de Deus na pessoa do Menino-Deus. Convertendo e caminhando à luz do Advento.

A conversão está no itinerário da vida cristã. A busca pelo melhor que podemos ser diante de todas as circunstâncias de nossas vidas. Sem acomodação, um caminho que se faz de erros e acertos, mas mirando o horizonte do Reino que já está no meio de nós, mesmo que algumas das nossas atitudes não se coadunam com esta perspectiva. Como no caso da escola municipal da cidade de Contagem, em Minas Gerais, que foi invadida na madrugada desta última terça-feira (29). Vândalos nazi-fascistas, aproveitaram da madrugada, quebrando vidros e carteiras, deixando registrado nas paredes mensagens de cunho nazista, reverenciando Adolf Hitler. Até quando seremos vítimas destes desordeiros do “terceiro turno”?

A experiência de fé deve nos possibilitar desenvolver em nós um processo de discernimento. Na caminhando que vamos fazendo vamos aos poucos passando por este processo de discernir, saber o que somos e o que queremos. Assim como vamos amadurecendo na vida, a fé também precisa passar por este amadurecer, provando deste processo de discernimento. Ter fé é mais do que acreditar em algo. É uma intimidade que se dá entre o conhecer, o viver e o sentir. A cabeça pensa, o coração sente e a adesão ao Projeto de Deus, revelado na pessoa de Jesus, vai se solidificando através das nossas ações no seguimento. Mais do que uma fé intimista, egocêntrica e egoísta, somos desafiados a viver uma fé transformadora, libertadora nossa e das estruturas que nos rodeiam.

A liturgia desta sexta feira, proposta pelo Lecionário Litúrgico quer nos fazer refletir sobre esta nossa experiência de fé mais profunda. No texto advindo do evangelista Mateus, dois cegos se dirigem a Jesus aos gritos querendo a cura pelo Mestre Galileu: “Tem piedade de nós, filho de Davi!”. (Mt 9, 27) Ao que Jesus lhes pergunta: “Vós acreditais que eu posso fazer isso?” (Mt 9, 28) “Sim, Senhor”, prontamente respondem eles. A busca que encontra uma alternativa viável ao estado de vida daqueles pobres homens. Jesus não somente os curam como hes devolvem a dignidade, uma vez que naquele contexto de sociedade, a doença, a deficiência, era tida como um castigo, obrigando-os a viverem na marginalidade.

A pessoa de fé faz a experiência mais profunda do absoluto de Deus em si. Movida pela ação de Deus, a fé vivida no discernimento liberta e salva. Na Carta aos Hebreus são Paulo nos traz a definição da fé de modo bastante acessível a nossa compreensão: “A fé é um modo de já possuir aquilo que se espera, é um meio de conhecer realidades que não se vêem”. (Hb 11,1) A fé nos aproxima dos mistérios insondáveis de Deus. A Palavra de Deus nos coloca em sintonia com o absoluto de Deus, uma vez que a justiça do Reino de que nos fala o evangelista Mateus, nos liberta para o discernimento (ver) afastando de nós a alienação (demônio) que nos impede de viver a palavra que transforma a realidade.

A fé é uma adesão que fazemos ao seguimento de Jesus de Nazaré. Num dos documentos da Igreja, o Catecismo da Igreja Católica (CIC), promulgado pelo Papa João Paulo II, em outubro de 1992, traz uma exposição dizendo-nos que “a fé é, primeiramente, uma adesão pessoal do homem a Deus; é, ao mesmo tempo e inseparavelmente, o assentimento livre a toda verdade que Deus revelou” (CIC 150). Uma resposta que vamos dando a Deus na medida em que vamos caminhando e discernindo os passos desta caminhada. A fé é a luz que vai iluminando o nosso existir, quando então buscamos um sentido último para as nossas vidas, como fizeram aqueles dois cegos. Que tenhamos a maturidade suficiente da nossa fé ao ponto de ouvir também do próprio Jesus: “Faça-se conforme a vossa fé”. (Mt 9,29)

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.