Amo, logo existo

Domingo da 27ª semana do tempo comum. Primeiro domingo do mês missionário. “Estamos na terra para ser missão”, diz o Papa Francisco. Somos chamados e desafiados a viver a nossa missão, comprometidos com o Projeto de Deus, revelado em Jesus de Nazaré. Assumir na caminhada um sentido para a vida, de tal forma que estejamos empenhados na construção do Reino de Deus entre nós. Reino no aqui e agora de nossa história, por mais que ele se estenda para mais além do horizonte cósmico, onde Deus será tudo em todos. (1 Cor 15,28)

Viver subtende desafios. Viver na perspectiva de Deus pressupõe algo um mais. Um comprometer-se, encontrando sentido para o existir. Nesta perspectiva, não vivemos para nós mesmos. A vida não tem sentido em viver, única e exclusivamente, para nós mesmos e nossos caprichos. Só há sentido para o existir se estivermos voltados para o outro. Aquele que comigo caminha rumo ao horizonte, que vamos construindo juntos na convivência cotidiana. Se para o filósofo francês René Descartes (1596-1650), “Penso, logo existo” (cogito ergo sum), para nós, a frase que define melhor a nossa vivência de fé é: “amo, logo existo”.

Deus é amor! (1Jo 4, 8) Esta talvez seja a melhor definição de quem, de fato, é Deus. Desta forma, o amor se transforma no paradigma maior de nossa vida cristã. É ele o sentido e o significado de nosso existir neste mundo. Um dos textos bíblicos mais significativos acerca do amor, foi escrito pelo apóstolo Paulo: “Ainda que eu falasse línguas, as dos homens e dos anjos, se eu não tivesse o amor, seria como sino ruidoso ou como címbalo estridente. Ainda que eu tivesse o dom da profecia, o conhecimento de todos os mistérios e de toda a ciência; ainda que eu tivesse toda a fé, a ponto de transportar montanhas, se não tivesse o amor, eu nada seria”. (1Cor 13,1-2)

O sentido de nossa vida, portanto é a vivência prática do amor. Não como um mero discurso eloquente e propagandístico de nós mesmos, mas como um caminho que ultrapassa a todos os demais dons e ao qual todos nós devemos aspirar que é a prática deste amor. Se observarmos bem, o centro do Evangelho é o mandamento do amor, como nos assegura Marcos (Mc 12,28-34). Assim, o amor se transforma na fonte primordial de qualquer comportamento verdadeiramente humano, pois leva as pessoas a discernirem as situações e a criar gestos oportunos concretos, capazes de dar respostas à problemática existente. Os outros dons dependem do amor, não podem substituí-lo, e sem ele nada significam. Se o amor é a força de Deus, é ele também a força das pessoas que fazem a sua adesão firme à Ele.

“Não é o que você faz, mas quanto amor você dedica no que faz que realmente importa”, dir-nos-ia a Madre Teresa de Calcutá (1910-1997). É o amor que nos possibilita um sentido concreto para o nosso existir. É este amor que nos define ou não como fiéis seguidores do Mestre de Nazaré. Não é a prática de preceitos morais, normas regras, que define o nosso existir perante o mundo, mas o existir regidos pela prática do amor. Talvez por este motivo, Santo Agostinho tenha afirmado: “Ama e faz o que quiseres”. Na sua compreensão, somos o que amamos, isto é, a nossa essência está definida pela capacidade de amarmos ou não até as últimas consequências.

Somos filhos e filhas de um Deus que muito nos ama verdadeiramente. Amor gratuito do próprio Deus para conosco. Um Deus que se revela na amorosidade à sua criação. Um Deus que é gratuidade. Ama-nos tanto que nos deu de presente seu Filho único. Nascido do ventre de uma mulher simples do meio do povo, para nos mostrar que a essência da vida não nasce dos grandes projetos mirabolantes. É da simplicidade das coisas que nos virá o que há de melhor. É isto que nos está dizendo também Jesus hoje no Evangelho de Marcos: “Quem não receber o Reino de Deus como uma criança, não entrará nele” (Mc 10,15) Elas servem de exemplo, não pela sua inocência e ingenuidade, mas como simbologia do ser fraco, sem muitas pretensões. São movidas pela simplicidade e sem muitas ambições. É importante salientar que na sociedade do tempo de Jesus, as crianças não eram valorizadas, não tinham nenhuma significação social. Elas personificam em si o símbolo do pobre marginalizado, que está vazio de si mesmo, pronto para receber o Reino.

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.