Anunciadores e anunciadoras do Reino

Domingo da Festa da Ascensão do Senhor. Domingo é um dia especial em que dedicamos um tempo maior às nossas famílias e a alguns amigos e amigas especiais. Neste momento pandêmico, não podemos nos encontrar, é verdade! Mas, graças as tecnologias disponíveis, podemos nos falar e também nos vermos, e assim vamos trocando carinhos, afetos, que fazem tão bem ao nosso coração. Ainda estou sendo movido pelo grande espírito de alegria que tomou conta de todo o meu ser, fruto do retorno às aldeias Iny, depois de um longo período de ausência física. Isso é a minha vida tanto que não consigo mais viver longe desta realidade. Estava me fazendo falta.

A Festa da Ascensão de Jesus, celebrada hoje nas nossas comunidades nos dá a feliz ideia de que, no final do caminho percorrido no amor, na entrega gratuita e na doação, está a vida definitiva, a comunhão com Deus, onde somos acolhidos nos braços amorosos do Pai. O Mestre de Nazaré deixou-nos o seu testemunho vivo e concreto, do qual nos propusemos a sermos seus seguidores e seguidoras, dando continuidade ao Projeto messiânico libertador de Deus para as pessoas e para o mundo. Isto depois da ordem explicita dada pelo próprio Jesus: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda criatura! (Mc 16,15)

O contexto da celebração desta festa é o do encontro final de Jesus ressuscitado com os seus discípulos e discípulas, num dos montes da Galileia. Eles reconhecem o Ressuscitado, o acolhe, recebendo d’Ele a missão de dar continuidade no mundo, como testemunhas fieis ao Kerigma do “Reino”, da mesma forma como fez Jesus. Assim, os seguidores e seguidoras de Jesus não podem ficar olhando para o céu, numa passividade alienante; mas têm de ir para o meio dos conflitos, no meio das pessoas, dando continuidade ao projeto de Jesus. “Sereis minhas testemunhas…” (At 1,8), percorrendo os mesmos caminhos pelos quais Jesus percorreu. “Que responsa!”, diria a molecada hoje em dia.

Celebrar a festa da ascensão de Jesus significa, antes de tudo tomar pé da nossa realidade e saber que a consciência da missão que foi confiada a cada um de nós é a de sermos responsáveis pela presença do “Reino” na vida das pessoas no hoje da nossa história. Festa esta que nos faz conscientes de que a Igreja – a comunidade daqueles e daquelas que seguem os mesmos passos de Jesus, é a presença libertadora e salvadora de Jesus no meio das pessoas. De testemunho em testemunho do Reino: em casa, no trabalho, na escola, na cidade, no bairro, no meio dos mais necessitados.

Será que a nossa Igreja abraçou pra valer este desafio ao qual Jesus propôs aos seus seguidores de dar continuidade da sua missão libertadora para as pessoas no mundo? Parece que não! Pelo menos esta é uma das chamadas de atenção de nosso papa Francisco: “O mundo está cansado de mentirosos, de padres da moda, de arautos de cruzadas.” “Não poupem esforços para ir ao encontro do povo de Deus, estejam perto das famílias com fragilidade. Nos seminários, apontem para a qualidade, não para a quantidade. Desconfiem dos seminaristas que se refugiam na rigidez.” Esta foi uma de suas falas aos novos bispos esta semana. O papa entende de que precisamos de uma igreja que não fique fechada em si mesma, mas que seja capaz de abrir-se ao mundo e de estar onde estão as pessoas que mais sofrem, fome, miséria, desemprego, desamparo. Uma igreja que se especializou nas celebrações dos sacramentos, dos dogmas e preceitos, mas se esqueceu de ser Igreja como os mais vulneráveis, prediletos de Jesus. O papa, mais uma vez pondo o dedo numa de nossas feridas abertas, de uma Igreja que ainda é capaz de apoiar a ineficiência de um governo e sua política necrófila.

Jesus que volta para o Pai, mas que também continua naqueles e naquelas que o seguem. Tristeza pela partida, mas também alegria por saber que Ele está aqui. Jesus, o Cristo! Esperança que se renova nos desafios da história, na construção do Reino. “Reino de paz e de justiça. Reino de vida e verdade.” Reino que se renova na esperança das pessoas que acreditam de que ainda somos capazes de construir uma nova realidade, uma nova sociedade, como aquelas pessoas que, sequer me conhecem, mas se manifestaram solidárias para ajudar aos professores indígenas, isto depois de lerem os meus rabiscos cheios de alegria do dia de ontem. Como não manter o meu coração alegre e esperançoso de que a vida continua. Jesus está vivo!