Reflexão: Liturgia da Quarta-feira de Cinzas,
Ano B – 14/02/2024
A Quarta-feira de Cinzas é a porta de entrada da Quaresma rumo à Páscoa da Ressurreição. No Brasil, também, damos início à Campanha da Fraternidade. Entramos, assim, no grande tempo em que se vive, de maneira mais intensa, o programa que Jesus nos propõe: oração, jejum e caridade.
A cinza na cabeça é usada em sinal de penitência, de conversão, de luto pelo pecado. Ao receber as cinzas, expressamos, com humildade e sinceridade de coração, que desejamos nos converter e crer de verdade no Evangelho. As cinzas simbolizam o nosso nada diante do Criador. Fomos criados do pó da terra e ao pó voltaremos.
A Quarta-feira de Cinzas marca o início dos 40 dias da Quaresma. A Bíblia usa, com frequência, o período de 40 dias ou 40 anos para indicar períodos especiais, que criam um clima adequado para algo que vai acontecer:
– O Dilúvio durou 40 dias e 40 noites para purificar a humanidade corrompida, foi a preparação para uma nova humanidade.
– Durante 40 anos passou Israel no deserto a caminho da Terra Prometida. Foi uma experiência de purificação dos falsos deuses, de adesão aos mandamentos (Aliança) e de solidariedade.
– Durante 40 dias fizeram penitência os habitantes de Nínive antes de receber o perdão de Deus.
– Durante 40 dias e 40 noites, caminhou Elias até chegar à Montanha de Deus.
– Durante 40 dias e 40 noites, Moisés e Jesus jejuaram no início da Missão.
Assim, os 40 dias da Quaresma são também um tempo especial de conversão e renovação interior, em preparação da nossa Páscoa.
A Liturgia nos aponta o espírito que deve animar esse tempo
Na Liturgia desta Quarta-feira de Cinzas, veremos, na 1a Leitura (Jl 2,12-18), que o profeta Joel exorta todo o povo à conversão, ele diz que não basta só o rito externo de penitência, mas é necessário que a pessoa inteira, do mais íntimo de seu ser, se volte para Deus. Somente confiando em sua misericórdia, pode, o pecador, estar certo do perdão. A conversão do próprio coração deve ser o primeiro passo para uma mudança de vida. A Quaresma é esse tempo oportuno de retomar o caminho de se abrir à graça de Deus, que nos ama e nos socorre, não obstante nossas infidelidades, nossas fraquezas, nossas indecisões.
Na 2ª Leitura (2Cor 5,20-6,2), o Apóstolo Paulo nos convida a reconciliar-nos com Deus, com os irmãos e conosco mesmos, pois é este o momento favorável em que a salvação nos é oferecida.
No Evangelho (Mt 6,1-6.16-18), Jesus nos convida à conversão e à prática da justiça e nos apresenta três atitudes importantes que os cristãos são chamados a viver durante a Quaresma: a caridade, a oração e o jejum. Estas três práticas religiosas e sociais devem visar ao agrado de Deus e não, necessariamente, aos aplausos humanos; devem ser realizadas com autenticidade, sem exibicionismo, este é o conselho de Jesus aos seus discípulos e a todos nós: que, se possível, só o Pai veja e saiba o bem que é realizado.
Jesus não nega o valor dessas práticas em relação ao próximo (caridade), a Deus (oração) e a si mesmo (jejum), mas ele mostra como devem ser feitas para que se tornem autênticas.
– A Caridade: deve expressar o compromisso com a vida do outro. Qualquer outra motivação transforma esse gesto em promoção de quem oferece, desvirtuando seu sentido. Deve ser em segredo e não uma ocasião para se exibir, para ser elogiado ou tirar vantagens publicamente. Ela não se reduz à oferta de dinheiro, alimentos, roupas e outros objetos: “Misericórdia, eu quero e não sacrifícios”. Deus espera que tiremos algo de nós mesmos para Lhe oferecer. A oferta exterior precisa simbolizar e significar essa doação interior: tiramos algo de nós, um pedaço mesmo, para oferecer a Deus que vive em nossos irmãos. A caridade deve nos levar a um gesto de doação aos nossos irmãos, no serviço fraterno, na solidariedade e na partilha.
Para a Quaresma, o Papa Francisco propõe 15 simples atos de caridade que ele mencionou como manifestações concretas de amor:
- Sorrir, um cristão é sempre alegre!
- Agradecer (embora não precise fazê-lo).
- Lembrar ao outro o quanto o amamos.
- Cumprimentar com alegria as pessoas que você vê todos os dias.
- Ouvir a história do outro, sem julgamento, com amor.
- Parar para ajudar. Estar atento a quem precisa de você.
- Animar a alguém.
- Reconhecer os sucessos e qualidades dos outros.
- Separar o que você não usa e dar a quem precisa.
- Ajudar a alguém para que ele possa descansar.
- Corrigir com amor; não calar por medo.
- Ter delicadezas com os que estão perto de você.
- Limpar o que sujou, em casa.
- Ajudar os outros a superar os obstáculos.
- Telefonar ou visitar mais seus familiares, parentes e amigos.
– A Oração: deve nos levar a uma experiência pessoal com Deus, não deve ser uma repetição monótona de fórmulas, nem mesmo uma lista de petições. Deve ser um diálogo com Deus para entender e aceitar o seu projeto. Essa oração é escuta e abertura do coração para nos dispor a acolher os planos de Deus em nós. Requer tempo e ambientes adequados.
– O Jejum: vai muito além da abstenção de alimentos, deve nos levar a um gesto concreto de conversão: privar-se de algo para uma maior liberdade interior. Não é expressão de luto e de dor, mas sim expressão de alegria pela presença do Reino de Deus no mundo. Jejuar é criar espaço em nós para que a graça de Deus nos refaça e nos preencha.
Qual é, então, o melhor jejum? Algumas dicas:
- Jejum de palavras negativas; dizer palavras bondosas.
- Jejum de descontentamento; encher-se de gratidão.
- Jejum de raiva; encher-se com mansidão e paciência.
- Jejum de pessimismo; encher-se de esperança e otimismo.
- Jejum de preocupações; encher-se de confiança em Deus.
- Jejum de queixas; encher-se com as coisas simples da vida.
- Jejum de tensões; encher-se com orações.
- Jejum de amargura e tristeza; encher o coração de alegria.
- Jejum de egoísmo; encher-se com compaixão pelos outros.
- Jejum de falta de perdão; encher-se de reconciliação.
- Jejum de palavras; encher-se de silêncio para ouvir os outros.
Boa reflexão e que possamos produzir muitos frutos para o Reino de Deus.
Padre Leomar Antonio Montagna é presbítero da Arquidiocese de Maringá, Paraná. Doutorando em Teologia e mestrado em Filosofia, ambos pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR – Câmpus de Curitiba. Foi professor de Teologia na Faculdade Missioneira do Paraná – FAMIPAR – Cascavel, do Curso de Filosofia da PUCPR – Câmpus Maringá. Atualmente é Pároco da Paróquia Nossa Senhora das Graças em Sarandi PR.