As faces do amor

Quinto domingo da Páscoa. Mais três domingos e já estaremos vivenciando Pentecostes. 15 de maio, um domingo especial para todas as famílias. No dia de hoje celebramos as nossas famílias. Dia Internacional da Família. Esse foi um dia estabelecido em 20 de setembro de 1993, pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Oportunidade que temos de reverenciar as nossas famílias, o berço nascedouro de todos nós, projetando-nos para a vida e contribuindo diretamente na formação de nosso caráter. O que seriamos nós sem as nossas famílias? O laço familiar é a primeira experiência que fazemos de Deus que marcará toda a nossa existência.

Família é espaço de amor profundo. Nascemos de uma relação de amorosidade entre dois seres, transfigurando em si a presença amorosa do próprio Deus. O sermos acolhidos no ventre materno, sentimos o conforto de estar no colo de Deus. O aconchego do útero materno nos faz perceber que a vida é Dom maior de Deus. Somos a imagem e semelhança do Criador: “Então disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança”. (Gn 1,26-28). Deus nos plasmou no seio do Cosmo para viver com absoluta intensidade e plenitude. Em todo o nosso ser, somos a imagem e semelhança de Deus, de tal forma que a nossa constituição, material e imaterial (corpo e alma/espírito), representa a Deus.

Assim, em família vamos vivenciando a experiência de Deus. Uma experiência que nos coloca em sintonia com o próprio Jesus, que na liturgia de hoje está preparando os seus seguidores para o dia da partida do Jesus histórico. A “família de Jesus” vai passar por um processo traumático, dentro daquele momento histórico. Todos e todas precisam estar preparados e preparadas para o aparente esfacelamento daquela célula familiar. Com o seu discurso de despedida, Jesus lhes dá os últimos detalhes da ruptura que se efetivará no seu caminho rumo ao calvário.

Jesus sabe que o momento é delicado. O desânimo, a dor e o sofrimento são palpáveis no semblante de seus seguidores assustados. Tanto que Ele usa, estrategicamente, uma palavra carregada de afeto: “Filhinhos, por pouco tempo estou ainda convosco. Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros. (Jo 13, 33-34) Somente através da vivência concreta de um amor incondicional há a possibilidade de superação de momento tão traumático e doloroso. Só por amor mesmo. O esperançar se faz no gesto de amar.

Amor que se faz novo. Amor que se faz através de um novo mandamento. Novo que tem uma conotação diferente. Novo no sentido das terminologias gregas “néos” e “Kainós”. “Néos” com o significado de rejuvenescido no tempo, recente. Já o “Kainós” é o novo na espécie, no caráter, no modelo, renovado, melhorado, de maior excelência, não novo no tempo, mas novo na forma, na qualidade, na atitude. Um novo que renova toda a nossa estrutura pessoal para melhor acolher o verdadeiro significado do amor que Jesus quer transmitir aos seus. Um novo mandamento cuja essência maior é a prática do amor incondicional. Amor sem medidas e desinteressado de outras formas de recompensa. Amor “Ágape”, terminologia grega bastante utilizada no Novo Testamento que quer significar amor que se doa por inteiro, amor incondicional, amor de quem se entrega ao ser amado. Amor, via de mão dupla que contempla quem ama e a quem é amado. Este termo também foi muito utilizado, na Grécia antiga pelos filósofos, como Platão, significando por exemplo, o amor a uma esposa, ou esposo ou amor às crianças, aos filhos, a sua família e ao trabalho.

Amar como Jesus amou. Ele está nos dizendo que quem verdadeiramente ama, dá a vida pelo ser amado. Ele tanto nos amou que deu a sua vida por nós. Em Jesus sentimos que Deus nos ama apaixonadamente. Amor incondicional e gratuito. Ele nos ama não porque somos quem somos, mas simplesmente pela sua gratuidade em querer nos amar primeiro. Nos ama com amorosidade, nos diria Paulo Freire. Já o nosso amar a Deus pressupõe, intrinsecamente, o amor aos nossos irmãos e irmãs. Neste sentido, João, em uma de suas cartas, chama de “mentiroso” a quem trafega apenas num dos sentidos desta via: “Se alguém diz: Eu amo a Deus, e no entanto odeia o seu irmão, esse tal é mentiroso; pois quem não ama o seu irmão, a quem vê, não poderá amar a Deus, a quem não vê”. (1Jo 4,20). O critério para o discernimento do amor verdadeiro está no Projeto de Deus revelado por Jesus, que livremente deu a sua vida por amor aos seus.

 


Francisco Carlos Machado Alves conhecido como Chico Machado, foi da Congregação do Santíssimo Redentor, os Redentorista, da província de São Paulo. Reside em São Felix do Araguaia no Mato Grosso e é agente de Pastoral na Prelazia de São Felix desde 1992. Sua atividade pastoral é junto aos povos indígenas da região: Xavante, Kayabi, Karajá, dentre outros. Mestre em Educação atua na formação continuada de professores Indígenas, nas escolas das respectivas aldeias.