Chegamos finalmente a mais uma sexta-feira (26). Geralmente, nestes dias da semana que antecedem à páscoa, dedicamos um pouco mais à oração, com jejum e penitência. Também neste dia, fazemos comumente a via-sacra, percorrendo o caminho com Jesus, contemplando os mistérios que envolveram o itinerário de nosso Salvador, na sua via crucis rumo ao calvário. Assim como a sua Mãe, uma espada de dor transpassa a nossa alma, de tanta angústia e sofrimento, caminhando na pandemia (Lc 2, 35).
Vivemos um dos piores momentos desta pandemia. Nunca estivemos tão ameaçados como agora. Não se trata apenas de pessoas do grupo de risco. Todos e todas estamos ameaçados pela agressividade do vírus, que se propaga numa velocidade assustadora. Se num espaço territorial tão pequeno como São Félix do Araguaia, estamos vivendo dias de terror, fico imaginado num grande centro urbano. Nesta manhã, perdemos mais uma vida para o vírus. O nosso Tadeu Escame, ex-agente de pastoral da prelazia, veio a óbito nesta manhã. Até quando Senhor? Até quando ficaremos nas mãos de um vírus que insiste em nos tirar a vida?
Levantei disposto a buscar ajuda. Tão logo clareou o dia, estava eu diante do túmulo do profeta dos pobres do Araguaia. Fui buscar refúgio e acalanto. Ali, naquele silêncio profundo de uma paz dos cemitérios, dialoguei com Deus, tendo Pedro por testemunha. Em outros momentos de nossa vida, ele sempre nos trazia uma palavra de esperança. Por mais que estivéssemos à beira do precipício, ele nos confortava afirmando que por mais que a noite fosse escura, haveria sempre o despertar de um novo dia, um novo amanhecer. Sem nos esquecermos que somos discípulos e discípulas do Ressuscitado, a testemunha fiel, concluía ele.
Estamos carentes de palavras de conforto que nos animem a continuar lutando e esperançando. A impressão que dá é que as nossas forças não nos acompanham mais. Rezamos! Imploramos a Deus! Mas as mortes se sucedem a nossa volta. Famílias inteiras chorando a morte dos seus entes. O nosso coração está em pedaços. A única força que ainda nos resta é a presença inefável de um Deus sempre presente em nós. Deus nunca falha se a nossa fé não falhar! Ele é ainda a esperança que nos faz acreditar que novos dias haverão de vir, rompendo este horizonte de morte dos inocentes. Pelo menos foi sempre assim que Ele esteve presente na vida do povo semita.
A liturgia de hoje nos mostra Jesus mais uma vez tendo problemas com os judeus (fariseus). Desta vez eles querem apedrejá-lo, pelo fato dele se passar por Filho de Deus enviado. A identidade de Jesus revelada a eles causa-lhes um sentimento de raiva incontida, ao ponto de quererem matá-lo via apedrejamento, como ordenava a lei: “Não queremos te apedrejar por causa das obras boas, mas por causa de blasfêmia, porque sendo apenas um homem, tu te fazes Deus!” (Jo 10,33) Ao definir a sua condição de Messias, apresentando-se como o Filho de Deus, gera a discórdia daqueles homens conhecedores da Lei (Lev 20). Mesmo que as provas de seu messianismo não fossem teorias jurídicas, mas fatos concretos, suas ações comprovam que é Deus mesmo que age através dele.
De nada adiantou os judeus verem os sinais e ações concretas que Jesus realizava no meio dos pobres. Tais ações nada mais eram que a realização do Projeto de Deus acontecendo ali naquele contexto histórico. Nestas horas, o fechamento em si mesmo e a ira falaram mais alto e aquelas lideranças não aceitaram que os seus privilégios de dominação sobre o povo, fossem ameaçados, por um pobre nazareno de origem duvidosa, se passando por Deus e falando em nome d’Ele.
Estes judeus farisaicos intolerantes foram um entrave na vida de Jesus. Homens terríveis! Eles sempre encontraram um jeito de atravessar o caminho messiânico de Jesus. Nos dias atuais eles continuam querendo impedir a erupção do Reino entre nós. Basta ver o que as pessoas de dentro da própria Igreja, estão fazendo com o Papa Francisco, no exercício de seu pontificado. Um homem considerado uma das principais lideranças a nível mundial, pelo seu dialogo com a sociedade, na tentativa de gestar uma igreja mais próxima do sofrimento, que responda aos anseios das pessoas em meio a uma pandemia. Estes fariseus de hoje desferem toda a sua ira contra o pontífice, qualificando-o com os impropérios mais absurdos possíveis.
Sem falar da Campanha da Fraternidade Ecumênica (CFE) de 2021, que se transformou da bola da vez. Ela segue gerando a discórdia pelas críticas infundadas feitas por alguns “católicos de comunhão diária”. Provavelmente de pessoas que nem sequer tenham lido o texto base, para ver o que de denúncia está presente no texto. Mas a crítica segue acirrada, por se tratar- segundo eles, de um texto esquerdista vermelho, próprio da Teologia da Libertação. É somente o que sabem dizer, sem nenhuma fundamentação crítica pertinente. Uma intolerância que se manifesta numa total falta de empatia. Para estes arautos da ira, resta-nos lembrar uma das frases ditas pelo poeta italiano Giacomo Leopardi (1798-1837): “Nenhuma qualidade humana é mais intolerável que a intolerância”.