É chegada a hora. Hora mais triste para todos nós, que com ele convivemos. Sabíamos que esta hora, um dia chegaria. Entretanto, a gente nunca se sente preparado para ela. A morte sempre nos surpreende, muito embora saibamos que este é o fim de todos os viventes. Queríamos, o quanto possível, adiar a hora da partida de Pedro. Todavia, ela chegou e está bem aí. Queríamos, ao menos, que fosse distante desta triste pandemia, para que assim pudéssemos dar-lhe as despedidas merecidas, a este grande guerreiro. Só nos esquecemos de combinar com Deus, que tem lá os seus planos.
Norman Cousins, um jornalista político americano, autor, professor e defensor da paz mundial, que nos deixou em 1990, têm uma frase sobre a morte que nos faz pensar. Dizia ele: “A morte não é a maior perda da vida. A maior perda da vida é o que morre dentro de nós enquanto vivemos.” Faz sentido, pois muitos de nós já deixamos morrer dentro de cada um, alguns valores que nos faz serem pessoas diferenciadas como Pedro. E ao deixar morrer estes valores, nos apequenamos, passando a viver uma vida medíocre, como estão fazendo agora, aqueles que estão se vangloriando com a partida do bispo Pedro.
Para os que acreditamos, a morte não é o fim, mas a passagem para a vida plena. Pedro anunciou e viveu esta dimensão. Como testemunha fiel do prisioneiro político, assassinado pelo poderio Romano, Pedro sempre nos assegurou que somos discípulos e discípulas do Ressuscitado. Ele vive e todos os que o seguirmos viveremos nele. Para um homem de fé como ele, não é difícil entender porque tinha tanta confiança, como nesta frase que disse em uma de suas muitas entrevistas: “Eu acredito no Deus da vida e acredito que a humanidade é filha de Deus. Espero que a humanidade não se suicide. Por que tem genética divina.”
Pedro um homem simples de vestes também muito simples. Incontáveis vezes o flagramos em sua casa, lavando as suas poucas camisas que possuía. Um bispo que preferia ser chamado simplesmente de Pedro. Nada de “Dom”. Lembro-me, certa, feita, quando um dos jornalistas que chegou em São Félix, para entrevistá-lo e insistia em chamá-lo de dom. Num dado momento Pedro vira-se para ele e pergunta: qual dos dois Pedro? O primeiro ou o segundo?
Um bispo nada muito preocupado com as suas vestes de bispo. Os “arreios”, como nos diria Sebastião Gameleira, bispo da Diocese Anglicana do Recife. Pedro nos mostrava, através de seu testemunho vivo, de que se pode ser bispo sem aquele aparato todo, fazendo da pessoa um ser distante da realidade simples do povo. Situação bem diferente de grande parte dos padres desta nova geração. Outro dia, ouvi de um jovem sacerdote que, segundo ele, precisava usar o clégima para que as pessoas vissem que ele era um padre. Ou seja, a roupa é mais importante que o sacerdócio que carregava em si. Nesta sua pobre perspectiva, estando sem clégima, deixava de ser a autoridade sacerdotal que queria ser.
Sempre no mês de fevereiro de cada ano, Pedro fazia questão de tirar as suas merecidas férias. Nestes momentos, saía por aí, visitando os amigos de caminhada. Ora era na Nicarágua. Ora era em El Salvador. Ora era em Cuba, visitando o seu grande amigo Fidel Castro. Nestas horas, os militares que o perseguiam, ficavam espumando de ódio. E diziam: “Está lá o bispo comunista visitando o outro ditador comunista.” Pergunta se Pedro alguma vez ficou preocupado com isso.
Sua casa está recheada de lembranças que ganhava nestas suas andanças pela América Latina. Nada de ir à Roma ou ao seu país de origem. Preferia passar os seus dias de férias com os muitos amigos que teve pela “Nostra América”. Até do médico/guerrilheiro Argentino, Ernesto Che Guevara, ganhou um quadro, que Pedro sempre fez questão de mantê-lo vistosamente numa das paredes da sua casa. Assim era Pedro. Assim será Pedro em todos aqueles e aquelas que o admiraram em vida e terão a missão de dar continuidade aos sonhos defendidos por este grande homem de Deus. Pedro Casaldáliga, Presente na caminhada! Pedro, pedra viva!